O voo da família Mirpuri
Tudo começou há 14 anos com um avião de família e o desejo de gastar menos dinheiro ao pai. A partir de Lisboa, os irmãos Mirpuri conquistaram, passo a passo, a liderança da aviação executiva na Europa. Brilharam noutras carreiras, a aviação era só um "hobby", primeiro, depois um "part-time". Os resultados estão à vista: a Air Luxor conta transportar um milhão de passageiros em 2002 e facturar 100 milhões de euros. História de um sucesso português com nome egípcio e ascendência indiana.
Há momentos que parecem mágicos e, por volta de 1990, Paulo Mirpuri convenceu-se que vivia um deles. Estava prestes a licenciar-se na Faculdade de Ciências Médicas de Lisboa com média de 18 valores. Porte atlético (foi vice-campeão regional de luta greco-romana), deslocava-se num Porsche 944, prenda do pai aos 18 anos por ter entrado em Medicina com média de 19. Presidia e era sócio, juntamente com os irmãos Carlos e Luís, de uma empresa de aviação que, se por um lado era pequena - tinha só um avião -, por outro lado era próspera: fazia por semana dois ou três voos para executivos; e, de segunda a sábado, transportava entre Lisboa e Saragoça as encomendas que a multinacional de correio expresso TNT recebia e expedia para Portugal. Aos 23 anos, Paulo ganhava muito acima da média para a idade. Segundo ele próprio, sentia-se "radiante".Pouco depois o jovem médico iniciava no Hospital de S. José os dois anos de internato. Mas nunca pensou fazer carreira: "Escolhi aquele curso por interesse científico, pelo desejo de conhecer o corpo humano". Nos hospitais, apesar de se sentir mais próximo da medicina interna, que junta todas as outras disciplinas, ou da emergência médica, que tem o lado romântico da luta contra a morte, não se realizava "completamente". Talvez porque, ao mesmo tempo, "estava sempre a pensar 'naquilo'". "Aquilo", era a empresa de aviação, a Air Luxor, e já se verá adiante como lhe nasceu o nome. Não era ainda a companhia que é hoje e que os portugueses viram surgir quase sorrateiramente com voos regulares para a Madeira e para Paris, anunciada nos autocarros de todo o país, nas revistas e nos jornais, com dez aviões de médio e longo curso (um dos quais o maior a operar em Portugal) e a liderança europeia do mercado dos jactos executivos, a voar para 42 destinos em todo o mundo. Estava-se longe ainda do milhão de passageiros que espera transportar em 2002, prevendo-se uma facturação recorde de 100 milhões de euros. A irmã Marianela, que em 1992 veio dar um impulso decisivo à vocação comercial do projecto, ainda nem sequer estava ligada à empresa. Sílvia, a mais nova, era uma liceal de 13 anos.Até 1990, recorde-se, a Air Luxor tinha apenas um avião. Era pequena, portanto, mas era rentável. Aliás, foi sempre rentável. Durante os seus 14 anos de vida, não houve um único que não concluísse com resultados positivos. Atravessou as várias crises que em Portugal e no mundo levaram à falência muitas companhias, tanto grandes como pequenas, e fê-lo - embora às vezes com dificuldades - sempre a dar lucro. Melhor: a servir-se de todas as crises para crescer, a transformar as dificuldades em oportunidades, a criar forças próprias com as fraquezas alheias.Talvez 1990 seja o ano decisivo deste trajecto. Em primeiro lugar, porque quando esse ano começou a empresa estava bem. Tinha o avião pago e não devia nada a ninguém. A facturação até então sempre excedera largamente os custos fixos: um gabinete no nº 62 da Avenida da República, duas funcionárias administrativas, quatro pilotos, duas pessoas (uma das quais a meio-tempo) nas operações de voo, a manutenção subcontratada.Em segundo lugar, porque, com a invasão do Kuweit pelo Iraque e a consequente resposta da coligação internacional liderada pelos Estados Unidos, uma terrível crise devastou a aviação civil em todo o mundo. Houve companhias a falir por toda a parte. Em Portugal a Air Sul, a Air Atlantis ou a Air Colombo - só para dar três exemplos - finaram-se para sempre.A Air Luxor sofreu também com este vendaval - e muito. Perdeu imediatamente o contrato de carga com a TNT e, com este, foi-se a parte mais substancial da sua receita. Para piorar a situação o nível de procura dos voos executivos baixou. Mas as despesas fixas, essas, mantiveram-se inalteradas. "Eu, que estava com um nível de vida elevado para a idade, perdi receitas de repente - e fiquei com os encargos", recorda Paulo Mirpuri. "Foi a primeira lição de controlo de custos, a primeira lição da necessidade de planeamento, a primeira lição de abnegação".Um período difícil, em resumo. Como foi ultrapassado? Responde Paulo Mirpuri: "Eu tive uma reacção muito forte perante aquilo!"A história da Air Luxor começou uns anos antes do dia do seu nascimento, a 14 de Dezembro de 1988. E não estamos a falar da vinda do primeiro avião dos Estados Unidos, um belíssimo Aerocomander 500 S, modelo com uma fama de segurança inigualável, o único aparelho a hélice em que o presidente dos EUA Dwight Eisenhower estava "autorizado" a voar. Falamos agora do nome: Luxor.Não, não é um apelido egípcio, apesar de ter um egípcio na sua origem. Estamos em 1980 em Vilamoura, no Algarve, onde o pai dos cinco Mirpuri que hoje lideram a companhia aérea (e de outras duas irmãs), Arjar Mirpuri, negociava com o senhor Midaht Farid, vindo do Egipto, a venda do apartamento 14 de um empreendimento que acabara de construir. O negócio ia-se fazendo, mas faltava um nome para a urbanização. Os Mirpuri desejavam algo que traduzisse o conceito de qualidade, de "status", de luxo, que queriam associar àquelas lojas e habitações. E como na entrada o arquitecto tinha desenhado uma espécie de pequenas pirâmides, e talvez pela presença do senhor Farid, do "luxo" se chegou a "Luxor", a fantástica cidade dos faraós. A partir daí, os negócios que os Mirpuri encetaram passaram a chamar-se quase todos "Luxor": Marina Luxor, Golfe Luxor, etc.O trajecto que levou Arjar Mirpuri ao Algarve nos anos 70 iniciou-se em Hyderabat, cidade actualmente integrada nos territórios norte da Índia. Contudo, à época do nascimento de Arjar, em 1932, ainda fazia parte do estado paquistanês - isto apesar dos primeiros Mirpuri (nome que designa uma região e uma língua) serem provenientes da Índia e de religião hindu. Era uma família de comerciantes, nessa época já com negócios espalhados um pouco por todo o mundo, nomeadamente nas antigas colónias de Portugal em África.Foi nesses países que Arjar começou a acompanhar alguns negócios do pai. Passou uma temporada em S. Tomé e Príncipe, onde os Mirpuri tinham negócios ligados ao abastecimento de navios, e foi lá que se lhe colou à pele a paixão dos aviões. Nas horas vagas tinha o vício de se dirigir para o aeródromo e, depois, passava horas esquecidas num biplano monomotor a voar muito baixo, a rasar as águas do Atlântico Sul.Angola era o destino mais frequente das suas viagens de trabalho e foi durante uma delas, em 1952, que conheceu a mulher com quem veio a casar. Maria de Lurdes era filha de uma senhora de Trás-os-Montes e de um médico, natural de Aveiro, que mantinha vários negócios no Sul de Angola. Foi, aliás, por causa desses negócios que Arjar se relacionou com o médico e, mais tarde, se apaixonou pela filha. Era um rapaz bem parecido, elegante, "muito daimoso" segundo o julgamento da futura sogra.Casaram-se. E iniciaram uma vida feliz no doce e tépido mundo português das ex-colónias, dividindo os anos entre temporadas em Lisboa, geralmente no Verão, e semestres inteiros em Luanda, nos meses de Inverno. Compraram uma ilhota perto do Mussulo, tinham barcos de recreio, passeavam nos jardins. Os negócios prosperavam na área do "trading", do abastecimento de companhias petrolíferas, na construção civil. Os filhos foram nascendo, digamos, por séries: primeiro a das raparigas - Filomena, Marianela, Ivone Carla; depois, a dos rapazes - Carlos, Luís, Paulo; por fim, dez anos depois, em 1976, o benjamim da família - Sílvia.A partir de 1975, após a descolonização, a família estabeleceu-se definitivamente em Lisboa. A necessidade de modernizar os negócios não concedia a Arjar Mirpuri muita disponibilidade para passatempos - e, a verdade é esta, desde o nascimento da primeira filha que a mulher o proibira de praticar o seu "hobby" preferido, a aviação. Maria de Lurdes achava - e continua a achar - que jactos e hélices são diversões perigosas. A proibição foi acatada; mas o vírus aeronáutico transmitiu-se para os filhos.Atacou, sobretudo, o mais velho. Carlos nem para brincar quis alguma vez outra coisa que não fossem aviões. No início a mãe ainda tinha esperança que ele fosse estudar engenharia. Levou-o a fazer testes psicotécnicos, tentou convencê-lo. Mas qual quê? Logo aos 16 anos começou a tirar o "brevet". "Estava para ali virado, não havia hipótese", diz o irmão Paulo. "É um piloto puro", sintetiza o irmão Luís. Em 1981 o seu destino consumou-se. Carlos partiu para os Estados Unidos e foi estudar o que queria no Airline Pilot's Center, em Miami.Esteve lá quatro anos. Mas em Lisboa a família não deixou de sonhar com aviões. O pai ainda digeria a proibição de pilotar imposta pela mulher - e fazia contas de cabeça ao precioso tempo que perdia nas estradas do Portugal daquela época, sobretudo nas viagens para o Algarve; Paulo preparava-se para tirar o "brevet" logo aos 17 anos, antes mesmo de ter a carta de condução; e na mãe crescia o medo de ver os filhos a voar.Esta mistura de sentimentos exigiu delicados movimentos de diplomacia familiar para ser resolvida. Por um lado, diziam uns, era a vida profissional de Arjar Mirpuri que estava em causa. Por outro, acrescentava-se a seguir, era a facilidade das deslocações da família para o Algarve nas férias, nos fins-de-semana. E - argumento usado com sábia precisão - sempre era mais uma razão para convencer Carlos a voltar ao país... Ah, e havia uma questão fun-da-men-tal: estava "fora de questão" comprar um avião que não fosse "absolutamente" seguro. Perante isto a mãe, Maria de Lurdes, cedeu: e pôde-se mandar vir o Aerocomander 500 S da América.Como em quase todas as histórias há felizes coincidências. E a desta talvez seja a publicação nos jornais, em Setembro de 1984, de um anúncio do concurso para a contratação de pilotos para uma nova companhia de aviação, a LAR - Ligações Aéreas Regionais, uma participada da TAP. Carlos Mirpuri, que entretanto já era instrutor nos EUA e estava muito bem lançado naquela terra de oportunidades, passava por esses exactos dias férias em Portugal. E decidiu concorrer. Foi admitido, fez parte do núcleo fundador da LAR em Janeiro de 1985. Só quase dois anos mais tarde, em Outubro de 1986, concorreu aos quadros da TAP - e, com as suas qualificações, entrou com facilidade. Foi nessa empresa, de resto, que trabalhou em permanência até Maio de 2001, altura em que a Air Luxor passou a concorrer directamente com a TAP na rota regular Lisboa-Funchal. Mas não nos adiantemos na história.Luís Mirpuri, o terceiro dos fundadores da Air Luxor, concluiu a licenciatura em gestão no ano lectivo de 1986/87. Sempre próximo dos irmãos - "Nós somos todos muito próximos uns dos outros", explica Sílvia, a irmã mais nova. "Os nossos pais ensinaram-nos sempre a ser muito unidos, a pôr a família em primeiro lugar, a ter imenso orgulho uns dos outros" -, Luís apostou desde cedo na carreira universitária e nunca sentiu nos dedos os mesmos formigueiros que Carlos, as suas mãos nunca lhe reclamaram os comandos com veemência. As de Paulo, sim: e, como o menino era um aluno brilhante, como era o melhor em tudo o que se metia - e como o pai Arjar era realmente tão "daimoso [que gosta de dar, generoso]" como a avó materna prognosticara -, quando Paulo tirou o "brevet" de piloto, em 1986, logo recebeu de prenda um delicioso Cessna 206, com seis lugares, um dos monomotores mais potentes que havia no mercado, uma beleza.O que ele se divertiu a pilotá-lo nas viagens ao Algarve e arredores não tem explicação. Foram tempos de puro gozo. Porém - e agora é Paulo Mirpuri a falar - "à medida que se vai crescendo, vai-se ganhando responsabilidade". Dito de outra maneira: "Achei que estava a gastar muito dinheiro ao meu pai. Aviões são uma coisa cara".Ele próprio teve a ideia para resolver o problema: já que o pai tinha oferecido os aviões aos filhos e esse dinheiro já ninguém lho poupava, então, porque é que não se lhes dava uma utilização comercial? Paulo explicava aos irmãos Carlos e Luís: "Os aviões dão-nos imenso jeito; também deverão dar a outras famílias, não?".Havia um truque, claro. Como para vender voos é preciso fazer uma empresa e como para lançar uma empresa é necessário investimento, os próprios aviões "da casa" realizaram boa parte do capital social. Mesmo assim faltava dinheiro para as coisas mínimas: contratar pilotos, combustível, alguma publicidade , uma pequena margem para não sucumbir no primeiro obstáculo - quatro mil contos pelo menos (estamos a falar de 1986). Como os conseguir? Pedindo emprestado ao pai. O pai, "daimoso" como de costume, emprestou.O resto aconteceu de forma surpreendentemente rápida. Paulo entrou com os seus 17 anos na então Direcção-Geral da Aviação Civil e disse que queria fundar uma companhia aérea. Devem-lhe ter achado uma graça imensa, porque lhe deram todos as instruções, modelos e formulários necessários. Luís transformou então num estudo económico irrepreensível as ideias visionárias do irmão mais novo. E Carlos, para além de ter feito o primeiro Manual de Voo da companhia segundo os altos padrões aprendidos em Miami, tornou-se desde logo perante as autoridades reguladoras o decisivo interlocutor técnico da empresa que ainda hoje é. Em 14 de Dezembro de 1988 foi concedida à Air Luxor a licença de transporte aéreo. Nos dois primeiros anos tudo correu bem. O primeiro cliente foi o presidente das Seleções do Reader's Digest nos EUA, quando precisou de viajar de Lisboa para o aeródromo de Portimão. Os pilotos escolhidos por Carlos revelaram-se muito bons (ainda hoje trabalham com a Air Luxor). Surgiram bons clientes - como Américo Amorim - que gostaram dos serviços desde o início e que ainda hoje recorrem a eles. Os problemas, esses, só apareceram com a Crise do Golfo em 1990, com a invasão do Koweit pelo Iraque e com a guerra que se lhe seguiu.Tinha chegado a hora de fazer sacrifícios. Sacrifícios relativos, bem entendido, porque não estamos a falar de nenhum sócio que dependesse da Air Luxor para ganhar a vida: Carlos era um dos mais jovens comandantes da TAP, Luís ensinava na universidade e ganhava muito dinheiro na sua empresa de consultadoria, Paulo fazia o internato médico hospitalar.Mas os Mirpuri foram à luta. Primeiro passo: tinham de procurar mais mercado. E Paulo, que sempre tinha reservado o seu monomotor para voos privados, foi "obrigado" a pô-lo a trabalhar no aeródromo de Vilamoura: voltas panorâmicas sobre as praias algarvias, viagenzinhas com estrangeiros a Fez e a Tânger, um transporte aqui, um passeio acolá. Nada de exaltante, mas um acréscimo de facturação decisivo.Segundo passo: aprofundar os três princípios da empresa - segurança, satisfação do cliente, pontualidade. Sempre que havia um passageiro regular, Paulo ia ao aeroporto da Portela. Saudava-o, perguntava se tudo estava a correr bem, ajudava-o a transportar as malas se fosse caso disso. Foi talvez nesta altura que a forma como a empresa estava organizada desde o princípio se revelou mais importante. Quem pilotava eram os pilotos contratados, quem fazia o dia-a-dia eram os empregados, os Mirpuri só dirigiam a estratégia e participavam no tratamento VIP.Aguentaram-se na fase pior. E saíram dela em grande estilo. Por uma razão decisiva: em 1992 trouxeram para Portugal o primeiro jacto a prestar serviço de transporte executivo. Um sucesso comercial."Foi com o avião a jacto que demos o 'grande salto'", afirma Carlos Mirpuri. E recorda que a Air Luxor soube gerir bem esse Cessna Citation I, comprado a um particular sul-africano com menos de 5000 horas de voo, praticamente novo: "Ocultávamos sempre o nome 'Cessna' por causa do 'síndrome Sá Carneiro', evitámos o aeródromo de Tires, apostamos em associar a nossa imagem a um aeroporto internacional, a Portela".O mercado reagiu muito bem e, para o explorar, a Air Luxor já contava com um reforço de peso: Marianela, uma das três irmãs mais velhas, que em 1992, se afastou da sua empresa (a Luxor, Congressos & Promoções) para vir trabalhar com os irmãos nos negócios dos aviões. Logo em Novembro desse ano ela organizou no World Trade Center de Londres um encontro entre as melhores empresas congéneres na Europa. Ela e Paulo explicaram aos convidados a sua proposta: criar uma rede de companhias independentes, com um nome, logotipo e padrão de serviço comum, em que todos mandassem clientes para todos recebendo uma pequena comissão. Os custos seriam baixíssimos, pouco mais do que os de um "markting" comum. A proposta foi aceite. E assim nasceu a United Air Taxis (UAT), uma marca que segundo Marianela Mirpuri "trouxe alguns negócios interessantes, permitiu fazer muitos contactos e deu projecção à Air Luxor". Foi essa projecção que, pouco depois, moldou o passo seguinte da empresa: em 1995 os americanos da Executive Jet - a companhia pioneira no lançamento do sistema de "propriedade fracionada", ou "co-propriedade", de jactos executivos - entraram em contacto com os Mirpuri e com a empresa de aviação suíça Zimex para, em conjunto, introduzirem o sistema na Europa. O princípio era simples: as pessoas, ou as empresas, compram em cada jacto a parcela de propriedade correspondente ao número de horas de voo anuais que pretendem utilizar.Desses contactos nasceu a Net Jets Europe, que sediou em Lisboa o centro de operações dos seus jactos de sete passageiros com autonomia para voar na Europa inteira. Em 17 de Junho de 1996 arrancou o primeiro "Road Show" para apresentar o produto nas principais capitais e, logo aí, começaram as inovações: onde quer que se apresentassem, tinham no aeroporto mais próximo um jacto para que qualquer cliente interessado o pudesse experimentar logo a seguir. "Foi uma estratégia que resultou em cheio", conta Paulo Mirpuri. Hoje, os 40 jactos que estão no activo já não são directamente operados pela Air Luxor, mas sim por uma sua participada, a Net Jets Europe, Transportes Aéreos.Enquanto se aliava a americanos e a suíços a Air Luxor preparava o seu primeiro centro de aviação fora do país. Avança para França justamente na altura em que a Elf, acossada pelos escândalos que envolveram altos dirigentes políticos franceses e africanos, está desejosa de se desfazer de uns excelentes escritórios que acabara de construir no aeroporto de Paris-Le Bourget. Os Mirpuri aproveitam a oportunidade e instalam lá a Air Luxor France. O negócio foi tão bem sucedido que, passado pouco tempo, construiram uma nova placa para estacionar aviões.Estamos em 1997 e Paulo Mirpuri não pára. É o grande estratega da família e a dedicação crescente do irmão Luís à empresa dá-lhe espaço para experimentar novos horizontes. Avança para a Ásia - e, em sociedade com a STDM de Stanley Ho, ganha a concessão exclusiva de todos os serviços de aviação privada do aeroporto de Macau. "Foi muito interessante a nossa passagem pelo Oriente, mas a distância de 18 mil quilómetros revelou-se inultrapassável", relata hoje, após ter vendido em 2000 a sua participação na Air Luxor Macau a Stanley Ho, com quem continua a manter uma relação muito próxima. É quando já lidera a aviação civil na Europa que surge à Air Luxor o horizonte que faltava: a aviação comercial de longo curso. Vale a pena ouvir Luís, o economista: "Quando se passa da aviação executiva para a civil, o negócio aumenta exponencialmente". Começaram por operar o Lockheed que a Air Madeira, do Grupo Pestana, tinha comprado para transportar clientes para os seus hotéis e para algumas rotas das Caraíbas e do Canadá. Trabalho não faltava (em 1998 aquele aparelho foi o Lockheed que mais horas voou no mundo inteiro) e consta que após um ano e meio o Grupo Pestana já tinha o avião pago. Como os madeirenses criaram a sua própria companhia, a Air Zarco, a Air Luxor sentiu-se então com fôlego para adquirir os seus próprios aparelhos. E (veja-se como mundo é pequeno) decidiu comprar os dois Lockheed que a TAP vendera à Apolo, um grande operador turístico sueco. Eram aviões com uma manutenção cara, mas fortes... e baratos. Foram um excelente negócio, sobretudo porque a Apolo se constituiu como o grande cliente desses aparelhos. "Com eles voamos para todo o lado", conta Paulo Mirpuri, "não há sítio nenhum onde não tenhamos estado, ganhámos imensa experiência". Um dos aviões está actualmente alugado à Yes, uma companhia de "charters" da TAP, e estão ambos à venda, uma vez que os Mirpuri estão apostados em substituir toda a frota de médio e longo curso por aparelhos Airbus.O Verão de 2000 foi óptimo para todos os aviões grandes. A Air Luxor acumulou algum "cash-flow" e preparou-se para voos mais altos, as ligações regulares. Estrearam-se em Abril de 2001 com a ligação Lisboa-Funchal e, em Janeiro, deste ano, com os voos Lisboa-Paris, nos quais, de início, tiveram fortes prejuízos. Hoje, em cada semana, operam a partir de Lisboa e Porto 56 voos para a Madeira e 28 para Paris.Em 2001 aprenderam também algumas lições no mercado dos "charters". Um destino caro como as Seychelles - uma aposta da Air Luxor - não pegou no mercado português e fez-lhes perder muito dinheiro. A Tailândia equilibrou o investimento. E o Brasil foi um sucesso. Se juntarmos a isto o investimento feito em Cabo Verde, no aeroporto do Sal, na construção de um terminal privado de assistência e abastecimento a voos intercontinentais (bem como o voo regular, às segundas-feiras, Lisboa-Sal-Nova Iorque), reúnem-se os elementos para compor o retrato actual da Air Luxor: "Estamos a trabalhar sem desafogo de tesouraria", admite Luís Mirpuri, "mas temos uma enorme vantagem: o único passivo financeiro da empresa é o "leasing" dos aviões".Hoje, já com uma operadora turística própria - a Air Luxor Tours, especializada na criação e venda de pacotes turísticos para os destinos voados pela Air Luxor - , os Mirpuri deixam entender que estão a preparar novos negócios. "Temos todos o mesmo espírito de fazer evoluir a empresa que criámos", anuncia Marianela Mirpuri. "A nossa administração é jovem, eu sou a mais velha". Abre um largo sorriso: "Temos o tempo a nosso favor".Fotografia Miguel Silva