Torne-se perito

Um congresso para evitar os erros do cavaquismo

O PSD, de novo no poder, regressa hoje ao Coliseu dos Recreios, tal como o PSD de Cavaco Silva em 1986. Mas, 16 anos depois, os sociais-democratas estão apostados em não repetir os erros do cavaquismo e em mobilizar o partido.Realizado apenas três meses depois do regresso dos sociais-democratas ao Governo, o XXIV congresso do PSD poderia ser apenas a sagração de Durão Barroso como o líder que reconciliou o partido com os portugueses. Mas o PSD não é um partido de congressos calmos e previsíveis, como este ameaça ser. Por enquanto, a discussão centra-se quase só em saber quem vai mandar no partido e se os membros do governo devem ou não estar na direcção do PSD. Com Cavaco estavam, e hoje há quem pense que esse foi um dos erros do cavaquismo. Com Durão, as opiniões dividem-se e o líder ainda não disse o que pensa.A separação rigorosa entre cargos no Governo e no partido, defendida por várias pessoas - Santana Lopes e Marcelo Rebelo de Sousa - e algumas moções, não deverá ser cumprida. O caso de José Luis Arnaut, ministro-adjunto e secretário-geral do partido, está encerrado: é para manter tal como está. No entanto, este é um tema que deverá suscitar discussão em pleno congresso. De um lado, estão os argumentos de que a separação fragiliza o partido e afasta-o da realidade, do outro, que a acumulação retirará energias que deverão ser canalizadas para o Governo.Durão deverá procurar um equilíbrio, tentando evitar a identificação entre partido e Governo, e só entre ontem e hoje deverá fazer os convites para a sua direcção.O PSD deverá manter Dias Loureiro na presidência da mesa do congresso, Rui Rio, Santana Lopes e Tavares Moreira nas vice-presidências e José Luís Arnaut como secretário-geral, apesar da contestação interna a esta acumulação. De saída, estará Isaltino Morais, actual ministro das Cidades. Resta saber se também Morais Sarmento, ministro da Presidência, sairá. Para um dos lugares de vice deverá ir Assunção Esteves, deputada do PSD, presidente da comissão parlamentar dos Assuntos Constitucionais. Duas moções defendem que todos os ministros em cargos de coordenação política devem fazer parte da direcção, ou seja, Marques Mendes, Ferreira Leite e Morais Sarmento. Ex-adversário de Durão, Mendes tem dados sinais de que não quer ir para a direcção do PSD, preferindo manter um espaço de liberdade. Na comissão política, Durão pode premiar algumas pessoas que lhe são próximas como Diogo Vasconcelos, ou então fazer o equilíbrio das distritais. O que é garantido pelo núcleo barrosista é que Durão está a preparar algumas surpresas para introduzir novos protagonistas na batalha conjunta que PSD e Governo vão travar nos próximos dois anos.Entre o que hoje os próprios dirigentes consideram ter sido os erros do cavaquismo está a ocupação do aparelho do Estado. O actual Governo quer evitar mais acusações de "jobs for the boys". Mas, este fim-de-semana, são de esperar vários discursos inflamados sobre a ocupação de lugares no aparelho do Estado com que os sociais-democratas, seis anos longe do poder, agora voltam a sonhar.Outro assunto que divide os sociais-democratas é a coligação com o CDS para as europeias de 2004. A moção de Durão é prudente e remete este assunto para decisão em tempo oportuno pelo Conselho Nacional. A moção do líder da distrital de Santarém e eurodeputado, Carlos Coelho, diz claramente que o PSD e o CDS não devem coligar-se para as europeias. Por outro lado, entre as hostes sociais-democratas, o anúncio desta coligação em pleno congresso poderia ser um sinal de confiança entre os parceiros do actual Governo. Aliás, Paulo Portas, líder do CDS-PP e ministro de Estado e da Defesa, vai ao Coliseu no domingo, para o encerramento do congresso.O que vai marcar este congresso? Os barrosistas garantem que servirá para o reforço e a unidade do PSD, mostrar a sua solidariedade com o Governo e de compromisso para o futuro. É pelo menos isso que a actual direcção pretende receber dos congressistas. Neutralizados os habituais críticos de Durão, o confronto de personalidades não constará da agenda. Marques Mendes e Pedro Santana Lopes estão agora ao lado do líder. Resta Luís Filipe Menezes que mantém a incógnita sobre se virá até Lisboa ou não.As bases - incomodadas como é habitual com a reserva absoluta em relação às figuras que o presidente do PSD vai eleger para a nova direcção - podem manifestar o seu desagrado sobre a política de Governo, tal como fizeram nas reuniões preparatórias. Contudo, o primeiro discurso de Durão, hoje às 19 horas, a abrir o congresso, poderá neutralizar parte das críticas. A Durão Barroso, é-lhe exigido que mobilize o partido e explique aos portugueses o que quer para o país. Antes de todos irem de férias, o líder do PSD insiste nesta tecla. Depois de ser criticado por o Governo ter deficiências na passagem da mensagem, Durão foi ontem à SIC dar a primeira entrevista desde que foi eleito e o PSD exibiu ontem um tempo de antena em que garantia que "não há tempo a perder" e este fim-de-semana abrir-se-à ao país a partir do Coliseu dos Recreios. Terá sido esta estratégia que se sobrepôs perante os argumentos de quem na direcção do PSD defendia que o congresso fosse adiado para Setembro, funcionando como uma rentrée política.Na SIC, o líder do PSD e primeiro-ministro insistiu na necessidade do país recuperar a confiança e a esperança perdidas, o discurso que tem vindo a fazer nos últimos tempos e que deverá repetir no Coliseu dos Recreios. E aproveitou para manifestar a confiança em Paulo Portas no caso Moderna.Deste congresso, o primeiro sem inerências, deverá sair também um sinal para a reforma estatutária do PSD. Santana garantiu que tem o compromisso de Durão que será anunciada no Coliseu uma comissão para estudar e apresentar os novos estatutos partidários que incluirão as directas, ou seja, a eleição do líder por todos os militantes e não em congresso.São vários os notáveis do PSD que estarão ausentes do congresso. Os ex-líderes do partido Pinto Balsemão e Cavaco Silva não garantiram se vão ou não ao Coliseu dos Recreios. Fernando Nogueira, mantendo a tradição, não deverá aparecer. Marcelo Rebelo de Sousa já disse publicamente que não iria. Domingo passado na TVI explicou que não tenciona comparecer como protesto pela forma como o partido trata os seus antigos líderes, retirando-lhes o direito de voto no congresso. Este é o primeiro conclave em que todos os militantes têm que ser eleitos como delegados para poder votar. É isso o fim das inerências, a luta pela qual Pedro Santana Lopes se bateu no último congresso de Viseu. "Levamos esse agradecimento pelos anos que demos ao partido", disse Marcelo, para quem a reunião do fim-de-semana falha na oportunidade política e arrisca-se a ser "a mesma coisa", o mesmo que "dar um tiro para nada" se não mostrar "caras novas" e não falar "dos problemas do país".O presidente da Câmara de Gaia, Luís Filipe Menezes - um eterno crítico de Durão Barroso, tendo classificado a sua liderança de "frouxa" antes do PSD ganhar as eleições, recusou-se ontem a dizer se estará ou não presente no congresso. "Enquanto presidente da câmara, não falo sobre questões partidárias, pois sou presidente de todos os gaienses, do PSD, do PS, do PCP ou do CDS", frisou Luís Filipe Menezes durante uma sessão de entrega de habitações sociais. "Nem falarei, nos próximos tempos, numa lógica estritamente partidária pelo facto de cada vez me interessar mais falar para os portugueses em geral e menos para aqueles que são fanáticos deste ou daquele partido", sublinhou, em declarações à Lusa.

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