qual é a história, belle & sebastian?
"Storytelling" é a banda sonora que os escoceses Belle & Sebastian escreveram para o filme de Todd Solondz. A afirmação não é inteiramente verdadeira. Também não é totalmente falsa. Mick Cooke, o trompetista-baixista, explica porquê.
A primeira tentativa de contacto telefónico falhou. Quando, do outro lado, alguém atendeu, não era possível distinguir o que dizia. Calmamente pedimos para falar com um tal Mick Cooke, dos Belle & Sebastian. Depois de uma pausa, a resposta, num inglês cerrado e só levemente perceptível: ligáramos para uma garagem de táxis. À segunda tudo correu bem, não acabámos a falar para uma padaria ou farmácia de Glasgow. Um simpático e falador Mick atendeu o telefone. Como as oportunidades de entrevistar os Belle & Sebastian não são muitas, aproveitámos para fazer perguntas relacionadas com o universo da banda antes de entrar nas questões à volta de "Storytelling", o disco. Por exemplo, que tipo de livro é "Belle & Sebastian", a obra de Cécile Aubrey de onde a banda tirou o nome. "Nunca li o livro", respondeu Mick, acrescentando: "Vi o programa de TV que fizeram baseado na história de Cécile Aubrey. Era sobre um miudinho e o seu cão. O cão vagueava pela montanha e as pessoas da aldeia queriam matar o cão, mas o miúdo estava decidido a encontrar e proteger o animal". Os cães são, com os carros, um dos fétiches do grupo. Basta ver a quantidade de fotografias em que ambas as coisas aparecem. Mas nem todos os elementos dos Belle & Sebastian apreciam essas coisas. "Gosto de cães, mas não gosto de carros. O Stevie [Jackson, guitarra-voz] é que gosta de carros. As ideias das fotografias são dele". Mick também não é capaz de dar grande ajuda quando fala sobre as bonitas mas peculiares capas dos discos dos Belle & Sebastian. "Na generalidade, são ideia do Stuart [Murdock, voz-guitarra] e não sei de onde lhe vem a inspiração. Ele aparece sempre com coisas fortes que não têm nada que ver com a música ou com o contexto do disco." Esse desfasamento entre capa e conteúdo repetiu-se em "Storytelling". "Ele trouxe a imagem das duas raparigas chinesas e decidiu que isso ia ser a capa do disco. Mas a fotografia não tem relação nenhuma com a acção do filme [de Todd Solondz, de que o grupo fez a banda sonora]. As nossas capas são tão misteriosas para mim como para as outras pessoas", diz Mick. Ficções. E pronto, somos chegados à parte sobre "Storytelling", a banda-sonora do filme de Solondz. Ou melhor, à música que os Belle & Sebastian escreveram para ser a banda sonora do filme "Storytelling". Todo o processo de contacto e de criação entre os Belle & Sebastian e Solondz foi estranho. "O Todd era um fã da banda e entrou em contacto connosco antes de fazer o filme, pois achou que a nossa música dava uma boa imagem da ideia que tinha". Assim sendo, os Belle & Sebastian, depois de terem visto parte do filme, começaram a escrever as canções. Mas rapidamente Todd sugeriu que se deveriam mudar de Glasgow para Nova Iorque. "Fomos para Nova Iorque porque estávamos a mandar as nossas ideias ao Todd e ele achava difícil explicar-nos por telefone porque é que o que fazíamos estava, segundo ele, errado". Originalmente o filme teria três partes distintas, "Fiction", "Non-Fiction" e "Autobiography". A versão final ficou reduzido às duas primeiras. Solondz acabou por optar por Nathan Larson (que já escrevera música para "Os Rapazes Não Choram" de Kimberly Peirce) para compor a música de "Fiction" (onde Nina Persson, dos Cardignas, canta o tema principal) e pelos Belle & Sebastain para "Non-Fiction". Mas mesmo o que os Belle & Sebastian escreveram, e que se pode, em parte, encontrar no disco chamado "Storytelling", ficou de fora do filme que está em exibição. Mick Cooke explica pacientemente. "Muito do que escrevemos não está no filme. Do que foi feito em Glasgow, por exemplo, não resta nada. Na verdade, do que se ouve no disco quase nada está no filme. No filme estão pouco mais de seis minutos do disco. Está 'Storytelling', numa versão anterior à do filme; está 'Scooby Driver', e também uma versão de 'Fuck this Shit', mas com a Isobel (Campbell violoncelo-voz) a cantar. No fundo, o disco não é a banda sonora do disco, pois nós apenas temos música na segunda parte do filme."Um dos problemas que os Belle & Sebastian tiveram que enfrentar foi o facto de Solondz não ser capaz de lhes dizer concretamente o que pretendia. "Ele sabia o que queria, mas não conseguia dizer-nos. Não tinha o vocabulário certo para comunicar isso e demorou muito tempo até conseguirmos escrever algo que ele aprovasse." Para provar que Solondz é um cineasta idiossincrático, Mick conta que o realizador tinha encomendado a banda sonora de "Happiness", o filme anterior, a Michael Nyman, mas acabou por rejeitar a partitura do compositor britânico. Musicalmente, o que está no álbum dos Belle & Sebastian é uma elegante mistura de géneros e influências. De "Black & White Unite", misto de música de igreja e canção de protesto temperada com toques de lounge e "exotica", a "Consuelo", doce e triste mistura de música clássica e ritmos latinos, é o mais diverso dos álbuns do grupo. Mick concorda. "As canções têm muitas ideias diferentes. São uma espécie de desenvolvimento daquilo que nos foi surgindo. Como 'Black & White Unite', que partiu de um pequeno nada e tornou-se numa estranha canção, vagamente aparentada com o country. Trabalhámos com muitos tipos de música que pensávamos que nunca conseguiríamos tocar e isso foi bom". No entanto, Mick sente-se desapontado com o pouco que se ouve no filme. "Gostávamos que tivesse sido uma verdadeira banda sonora. Quando penso em bandas sonoras modernas, penso em 'Virgin Suicides', que acho excelente e que é, do princípio ao fim, parte integrante do filme. Mas actualmente as bandas sonoras não são envolvidas no processo de criação com no passado". Para terminar, e como brincadeira, perguntamos a Mick o que pensa dos islandeses Múm, que acabam de editar "Finally We Are No One". Afinal as duas bandas têm vindo a cruzar-de desde que, em 1999, os Belle & Sebastian foram responsáveis pela primeira edição do festival All Tomorrows Parties (na altura chamado The Bowlie Weekender). A resposta é rápida: "Gosto muito da música deles. É esotérica, mas ao mesmo tempo divertida. É música electrónica engraçada. Conhecemo-los no Bowlie Weekender e acabei por tocar num concerto deles em Glasgow. Ainda não ouvi o novo álbum, que acabou de sair, mas estou ansioso por o fazer". Nós ouvimos, está no texto do lado.