Uma vida dedicada a ajudar toxicodependentes
Chama-se Joaquim Sá, tem 39 anos e há 19 que ajuda os toxicodependentes das Caldas da Rainha. Todos os dias, cerca das 11 da noite, carrega até junto da estação dos comboios um saco com sandes e garrafões com café e leite, que angaria junto de cafés da cidade, além de dar parte do seu ordenado numa taberna que colabora com ele nesta cruzada, e lá os adictos podem, gratuitamente, comer uma refeição quente - para muitos a única. Os seus dias dividem-se entre o trabalho como auxiliar de acção educativa numa escola das Caldas, a recolha de alimentos para dar os toxicodependentes e a preparação e entrega das sandes e refeições. Além disso, em sua casa ainda lava a roupa de alguns que vivem na rua. O "Quim" (nome por que é conhecido entre os adictos) não bebe, não fuma, não toma drogas nem sai à noite, e diz que a sua maior preocupação é conseguir um local que sirva de abrigo para os toxicodependentes que fazem das ruas das Caldas a sua casa. "Tenho ido a muitos sítios mas ainda não consegui arranjar nada, e penso nisso 24 horas por dia", confessa.Tudo começou há 19 anos na Praça da Fruta, um dois locais do centro histórico da cidade, quando passava e via "um grupo de pessoas com um semblante triste solicitando ajuda às pessoas. Comecei por lhes dar cartas que escrevia, com mensagens de esperança. Ao princípio não era muito bem recebido, mas a pouco e pouco fui ganhando a confiança deles", recorda. Depois, alguns toxicodependentes começaram por lhe pedir uma sandes, um bolo ou roupa. Joaquim cedia e muitas vezes acabava por acompanhá-los ao restaurante pagando-lhes uma refeição quente. Este gesto foi-se tonando um hábito, até que começou, regularmente, a levar sandes, leite e batatas com ovos cozidos para junto da estação dos comboios. Os dias de Joaquim Sá estão programados "ao minuto". Começa a trabalhar às 9h00 e às 12h30 sai para almoçar, chegando a casa dez minutos depois. "A seguir vou à taberna levar o pão que consegui no dia anterior e às 13h30 vou a uma fábrica buscar os bolos, à praça buscar fruta e volto à taberna para entregar tudo", conta. Volta ao emprego às 14h00 e quando larga o serviço, às 17h30, o frenesim recomeça. Vai à taberna buscar a comida já confeccionada, leva-a serve-a em pratos no parque da cidade, cerca das 18h30 e às 20h00 volta a uma pastelaria buscar os bolos que não foram vendidos. A seguir vai jantar a casa, aquece três litros de leite e dois de café, prepara as sandes e à noite carrega tudo o até junto da estação, para dar aos toxicodependentes. "Às vezes antes de me deitar ainda lavo umas roupas deles". Sempre que pode, Joaquim Sá tenta encaminhar os viciados em drogas para a recuperação."Já consegui que largas dezenas se tratassem e deixassem a droga", diz, com orgulho.Mas o que levou um jovem (na altura que tudo começou tinha 20 anos) a dedicar a sua vida a ajudar os toxicodependentes? "Sinto-me bem ao ajudá-los e também sinto que me estou a ajudar a mim". Apesar de se confessar católico, as suas iniciativas não contêm mensagens religiosas, apenas palavras de conforto e apoio.A sua atitude causa alguma estranheza, mas garante que não o preocupa, apesar de ter sido tomado, várias vezes, por toxicodependente. "O importante é o que eu penso de mim e não o que os outros pensam". Joaquim afirma que se pudesse não mudava nada da sua vida, porque se sente realizado. Pensa, inclusivamente, em criar uma associação, para "institucionalizar" o seu modo de vida. Já se reuniu com a autarquia local, mas o único apoio vem da paróquia e de uma ordem religiosa estabelecida na cidade. Pensa que a toxicodependência é uma doença e que as pessoas "já nascem com pré-disposição para ela, além de que muitos factores como a educação e o meio social contribuem para se enveredar por esse caminho".