Valentim de Carvalho em sérias dificuldades
A megaloja da Valentim de Carvalho ao Chiado, em Lisboa, pode estar em risco de encerrar devido à sua não rentabilidade. Os administradores do grupo, que além de lojas de discos possui uma produtora de televisão e estúdios de gravação, estão a tentar renegociar o contrato de arrendamento do espaço com o proprietário do imóvel, o Montepio Geral, e a empresa encarregue da sua gestão, a Sonae. Mas tudo indica que, passada a quadra natalícia - a época forte da venda de discos -, a loja bandeira da Valentim de Carvalho possa mesmo vir a fechar as suas portas.A acontecer, essa decisão enquadra-se na vontade da Valentim de Carvalho em reorientar as suas actividades, que passarão a estar mais centradas na edição de discos do que na sua venda. Nas palavras de Francisco Vasconcellos, administrador do grupo, as perdas deste ano cifram-se em cerca de 450 mil contos (2,25 milhões de euros), devido a "termos sido obrigados a praticar margens de lucro de 19 por cento, ao invés dos habituais 31 por cento", o que tornou insustentável a manutenção de algumas lojas.A Valentim de Carvalho é, actualmente, a maior e mais antiga cadeia de lojas de discos a operar em Portugal, sendo proprietária de 24 lojas espalhadas um pouco por todo o país. Porém, nos últimos tempos, viu-se obrigada a encerrar alguns dos seus pontos de venda, nomeadamente os do NorteShopping, no Porto, MaiaShopping, na Maia, e Gare do Oriente, em Lisboa, devido aos prejuízos elevados que essas lojas estavam a causar.Retalho fonográfico em criseLuís Castaño, responsável directo pela administração da cadeia de lojas da Valentim de Carvalho, indica duas causas fundamentais para que o retalho fonográfico esteja em crise: em primeiro lugar, o surgimento do CD-R e a sua difusão maciça, nomeadamente nos circuitos estudantis, que terá provocado uma séria baixa das vendas de discos - um dado atestado pelo levantamento de mercado da Associação Fonográfica Portuguesa (AFP) que, relativamente ao 3º trimestre deste ano, aponta para uma quebra de 27 por cento nas vendas; por outro lado, as políticas de preços dos hipermercados, que utilizam os discos como uma forma de atrair clientes e não como um negócio, o que terá levado as lojas especializadas a baixar os preços de tal maneira que o negócio se tornou pouco rentável.A Valentim de Carvalho terá mesmo feito algumas diligências junto da Inspecção Geral das Actividades Económicas no sentido de impedir a prática de "dumping" por parte das grandes superfícies, mas a legislação portuguesa apenas considera existir "dumping" nos casos em que os produtos são colocados à venda abaixo do seu preço de custo, o que não é o caso. Se os hipermercados podem praticar margens muito pequenas nos discos, por vezes próximas do zero, o mesmo não acontece com as lojas especializadas que, então, se vêem obrigadas a encerrar actividade.Outras cadeias em riscoEsta crise por que actualmente estão a passar as lojas de discos não afecta apenas a Valentim de Carvalho, mas também as outras cadeias portuguesas como a Strauss, Discoteca Roma e Loja da Música. Esta última, que chegou a possuir 11 lojas abertas, só possui neste momento sete pontos de venda, tendo encerrado, nos últimos meses, as suas lojas em Oeiras e em Faro. O proprietário da cadeia, José Miguel, afirma mesmo que, nos tempos mais próximos, se verá obrigado a fechar mais duas ou três lojas, alertando para a necessidade dos retalhistas portugueses formarem uma associação que defenda os seus interesses. A crise do retalho discográfico em Portugal começou por se manifestar quando a multinacional Virgin se viu obrigada a fechar as suas duas megalojas em Lisboa e no Porto, incapaz de fazer frente à concorrência então movida pela Valentim de Carvalho, Fnac e pelas outras cadeias portuguesas. Hoje, apenas a Fnac parece permanecer incólume face à crise, saindo vencedora de uma batalha que a levou a abrir uma megaloja ao lado da da Valentim de Carvalho no Chiado.A Valentim de Carvalho há muito que está instalada no mercado português, sendo a primeira empresa a dedicar-se ao comércio de música, há mais de 175 anos. A sua actividade vê-se agora em risco, pelo que, nos próximo meses, o grupo será alvo de uma injecção de capital na ordem dos milhões de contos. Apesar dos seus accionistas permanecerem os mesmos - o aumento de capital será levado a cabo por Rui Valentim de Carvalho e Maria da Graça -, foi igualmente considerada a entrada de novos accionistas como o empresário madeirense Joe Berardo.