Habitantes de Diego Garcia exigem regresso à sua ilha

A base militar de Diego Garcia, no Oceano Índico, tem-se revelado decisiva na actual operação militar contra o Afeganistão liderada pelos Estados Unidos, com o objectivo anunciado de derrubar o regime taliban e destruir as estruturas da rede terrorista Al-Qaeda de Osama bin Laden.Um estratégico complexo militar com consequências directas, e neste caso dramáticas, para as gentes que aí habitavam. Na possessão britânica de Diego Garcia - integrado no Império de Sua Majestade em conjunto com o arquipélago das Maurícias no rescaldo das guerras napoleónicas - e numa atitude de "arrogância colonial tardia", como refere um texto da BBC, a população foi literalmente expulsa da sua terra no final da década de 60. O arquipélago das Maurícias, que os acolheu e onde forma reinstalados, remeteu-os para o discriminatório estatuto de "cidadãos de segunda".Agora, cerca de cinco mil pessoas, entre os antigos habitantes e seus descendentes, tentam regressar à sua terra, que se tornou num feudo privado do poderio militar norte-americano e britânico. No passado dia 7 de Novembro, centenas de manifestantes concentraram-se frente ao Alto Comissariado britânico nas Maurícias, para exigir o direito de regressar à sua ilha de origem, e prometeram prosseguir o protesto. Uma tentativa de regresso ao "paraíso perdido", onde o acesso aos civis é interdito há 30 anos. Exilados nas Maurícias, os seus pensamentos permanecem a cerca de dois mil quilómetros, na maior ilha do aquipélago de Chagos. A história esquecida destes habitantes foi ressuscitada pelo Supremo Tribunal de Londres no início deste ano, quando os ilhéus desencadearam um processo legal inédito contra o Governo britânico para obterem o direito de regressar à terra de onde foram expulsos. Em Novembro passado o Supremo Tribunal londrino tinha já considerado que o Governo britânico agiu ilegalmente ao expatriar os residentes, mas não alterou o destino dos refugiados que continuam a viver em condições de enorme degradação e pobreza. O ministério dos Negócios Estrangeiros garante que está analisar o problema, mas ainda não anunciou qualquer decisão. As prioridades estratégicas de Washington e Londres continuam a prevalecer sobre os anseios destas populações. As origens desta situação, como têm recordado recentemente diversos "media" britânicos, remontam ao período da política da Guerra Fria, onde as relações entre os dois blocos oscilavam entre as ameaças de confronto e a "coexistência pacífica". Em 1965, quando a colónia britânica das Maurícias negociava com o Reino Unido a sua independência, o então primeiro-ministro trabalhista Harold Wilson impôs a separação das ilhas Chaos das Maurícias e manteve-as sob a tutela de Londres. Estas ilhas já possuíam uma enorme importância estratégica - situam-se mesmo no centro do Oceano Índico -, numa região então também cobiçada pela extinta União Soviética e a China. Mas o que os principais interessados desconheciam era o acordo que tinha sido já previamente firmado entre o Reino Unido e os Estados Unidos, e no qual a principal ilha do arquipélago, Diego Gracia, era "arrendada" aos norte-americanos para a utilizarem como base aérea e centro de abastecimento para as suas esquadras. Durante as negociações, Washington colocou literalmente o "problema de população", numa referência às cerca de duas mil pessoas que viviam nas ilhas e trabalhavam sobretudo em plantações de coqueiros. Descendentes de escravos africanos e de trabalhadores indianos, os habitantes de Chandos povoavam região há três gerações. Mas o Governo de Londres iniciou então um sistemático, mas altamente secreto, "programa de reinstalação". Em compensação, o Governo britânico terá garantido um desconto de 11 milhões de dólares (2,5 milhões de contos) no sistema de armas nucleares "Polaris", de origem norte-americana. E também terá pago cerca de 700 mil contos às Maurícias, que acolheu as populações. Este negócio apenas foi revelado em 1995, quando o Congresso dos EUA promoveu um inquérito na base militar de Diego Garcia. Mas mesmo nesta ocasião o Governo britânico tentou ocultar a situação, enquanto insistia as populações "não deviam ser encaradas como habitantes permanentes das ilhas".Esta "política" prolongou-se por vários anos, até à concretização do programa que implicou o esvaziamento dos habitantes da ilha. As plantações foram encerradas, os abastecimentos alimentares interrompidos, e em 1970 a população de Diego Garcia foi informada que tinha de partir em definitivo. É de Diego Garcia que têm descolado as "fortalezas voadoras" B-52, agora apontadas ao Afeganistão, e antes dirigidas para o Vietname e depois para o Iraque, durante a Guerra do Golfo.

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