Primeiros dias no jardim de infância
Não adianta negar que custa muito deixar a criança com desconhecidos num sítio estranho. Se a idade de ir para o jardim de infância já chegou, conheça previamente as pessoas que cuidarão do miúdo e visite com ele o espaço onde passará os próximos (muitos) dias. Depois, dê-lhe tempo para se adaptar. Vai correr tudo bem.
Ao terceiro ano de existência, entra-se no jardim de infância. Para trás ficaram os dias ao cuidado da avó, da ama ou da creche. O grupo de amiguinhos aumenta, diversificam-se as actividades, ampliam-se as aptidões e conquista-se a autonomia. Mas nada disto se consegue sem um tempo de adaptação. Por isso, Setembro e parte do mês de Outubro é o período mais desgastante para as educadoras, para as crianças e para os pais - conta Paula Ramos, directora pedagógica do Atelier Infantil, no Pinhal Novo.Para suavizar a ansiedade dos miúdos e dos adultos (que existe sempre, não adianta negar), a educadora sugere uma visita prévia ao espaço onde a criança vai ficar durante o ano. Este reconhecimento do local, que faz preferencialmente em Julho - quando os miúdos estão descontraídos e certos de que é apenas uma visita -, permite que em Setembro não sintam o primeiro dia como um "total mergulho no desconhecido".Paula Ramos contraria uma certa ideia feita de que é benéfico pôr a criança no jardim de infância só um bocadinho em cada dia e, progressivamente, ir aumentando o período de permanência. E justifica essa posição com o facto de a rotina e repetição serem os principais factores de segurança dos miúdos. Se a criança está a contar ficar apenas um pouco e, afinal, os pais nunca mais chegam, a desconfiança instala-se. No dias que se seguem, o miúdo não saberá "o que lhe vai acontecer" e terá maior dificuldade em confiar nas educadoras. Por conseguinte, o tempo de adaptação tenderá a dilatar-se. A educadora defende que logo à partida a criança deve passar por toda a rotina diária do infantário, ou seja: participar nas actividades da manhã, almoçar com o grupo e dormir a sesta. Significa isto que, por exemplo, dentro do período normal de funcionamento destes jardins de infância, que é sensivelmente das 7h30 às 19h30, o pequeno deve permanecer no mínimo entre as 10h e as 15h30. Os momentos críticos e que apelam mais à casa são as refeições e a sesta. Brincar, brinca-se em qualquer lugar, mas a alimentação e o sono são práticas muito ligadas ao espaço familiar. Daí que Paula Ramos insista que se deve ir conversando com os miúdos durante as férias sobre o que há-de vir, sem omitir o que quer que seja. Assim, as crianças não são apanhadas de surpresa.Fundamental é também uma conversa inicial da educadora com os adultos que têm o miúdo a cargo, sejam ou não os pais. Aí deve ser dado a conhecer as vivências prévias da criança e os seus hábitos, só assim a educadora poderá respeitá-los - porque os conhece - e entender melhor os seus comportamentos. Exemplificando: se a educadora tiver conhecimento de que a criança esteve até aos três anos ao cuidado dos avós e pouco privou com outros miúdos, ser-lhe-á mais fácil entender que ela se isole e assim poderá trabalhar no sentido de a aproximar das restantes crianças. Sempre respeitando o seu próprio ritmo e eventual timidez. Informação sobre hábitos como uso da chucha ou da fralda para dormir também deve ser transmitida às educadoras. E é de evitar nesta fase atitudes do tipo: "Agora já és grande, já não podes ter chucha." Como há uma adaptação à escola que é preciso ultrapassar, não a complique retirando-lhe elementos que lhe conferem segurança e a compensem da ausência da família, como a chucha por exemplo.Também a vontade de levar de casa um brinquedo ou um "boneco amigo" não deve constituir problema, pois ajuda a criança a sentir que leva um pouco do seu mundo para o infantário. Muitas vezes é um bom caminho para a integração, criando-se a saudável prática de trocar brinquedos com os novos companheiros. Querer levar brinquedos da "escola" para casa é igualmente comum e, ao habituar-se a devolvê-los no dia seguinte, incute-se alguma responsabilidade sobre os bens colectivos. Criar uma base sólida de relações com todo o pessoal do jardim de infância é imprescindível para que a criança tenha vontade de voltar para lá todos os dias. No caso do Atelier Infantil, essa é a principal preocupação nos primeiros momentos. Daí que, sendo um projecto de educação pela arte, os professores de música e movimento (exteriores ao jardim de infância) só comecem as suas actividades em Outubro, quando as crianças já se sentem "em casa" e mais confiantes para acolher novidades.Paula Ramos acredita que grande parte da ansiedade das crianças é-lhes transmitida pelos adultos ("eu também fui assim relativamente ao meu filho", confessa) e por isso pensa que faz parte do seu papel dar toda a atenção aos pais, desdramatizando a situação. Sempre que possível, quando estão muito desesperados e se querem certificar de que os miúdos ficam bem, deixa-os "espreitar" os filhos nas suas brincadeiras ou enquanto comem. Salvaguardando sempre que vêem sem ser vistos, para não estragar tudo.