Um dos maiores assassinos portugueses
Até há cinco dias, Luís Miguel Militão Guerreiro, de 31 anos, não era ninguém. Distinguia-se de muitos milhões de anónimos apenas por uma pequena nódoa no registo criminal, uma vez que, em tempos idos, teve a tentação de roubar um carro e, por conta disso, foi punido com um ano de cadeia em presídio militar. Agora, depois de confessar ter ordenado a chacina de Fortaleza, ganhou um triste protagonismo entre os maiores criminosos portugueses. Ombreia com homens violentos como Faustino Cavaco, Vítor Jorge ou Manuel "Alentejano".Se se quantificarem os crimes mortais de cada um deles, o destaque vai para Vítor Jorge, o homem que em Março de 1987, na praia do Osso da Baleia, e na sua casa na Amieira, Marinha Grande, matou sete pessoas, entre elas mulher e uma filha. Todos estes crimes foram cometidos num curto período de tempo. Matou, talvez por um acesso de loucura - "Queriam fazer sexo em grupo e atiraram-se a mim... tive de me defender" -, e não se lhe conhecem quaisquer outros antecedentes criminais.Vítor Jorge, condenado a 20 anos e que ainda este ano deve abandonar o Estabelecimento Prisional de Coimbra, onde tem sido um recluso com comportamento quase irrepreensível, destacando-se como dinamizador de actividades culturais, é um caso. Outro, bem diferente, é Faustino Cavaco.Se o primeiro era um pacato contínuo de uma agência bancária, que também tinha a fotografia como passatempo, o segundo foi, desde a infância, uma pessoa marcada por alguma miséria e infortúnio. Primeiro foi o pai que fugiu a salto para França. Depois foi a mãe que, nos Pirenéus, durante uma paragem da camioneta onde fazia uma viagem de Paris para Portugal, foi atropelada mortalmente por um condutor que se pôs em fuga. Faustino, na altura com sete anos, presenciou todo este drama.Mais tarde, de novo em França, o pai junta-se a uma prostituta portuguesa, que tinha um filho mais velho que "Zezinho" - assim o tratavam naquela altura - e que lhe infernizou a vida, ao ponto de lhe roubar a cama e a bicicleta (Faustino aprendeu a dar as primeiras pedaladas com Pascal Simon, que mais tarde foi figura de topo no ciclismo mundial). Foi também o filho da prostituta que terá levado Faustino a associar-se, então já em Portugal, a diversos criminosos. Acrescente-se ao rol de desgraças da vida deste homem a morte do seu filho quase recém-nascido, que demorou, de ambulância, quase 24 horas a fazer o trajecto entre o Algarve e Lisboa.Faustino, então já baptizado com a alcunha de "Americano", por causa de uma camisa florida com que um dia se apresentou, tornou-se um dos maiores assaltantes de bancos em Portugal. Durante três anos o bando onde assumia a figura de operacional (o homem da caçadeira) semeou o terror do Algarve a Leiria. Desse bando, embora esporadicamente, fazia parte António Laginha, um agente da PSP que perdera a tramontana.Com o aperto da polícia, Laginha quis entregar-se. O grupo arranjou-lhe, por duas vezes, dinheiro e documentos falsos, para ir para França. Laginha foi e voltou sempre. Sempre a falar em entregar-se. Resolveram matá-lo. Faustino foi um dos que lhe esborracharam a cabeça e ajudou a ocultar o cadáver numa fisga rochosa.Foi ainda o "Americano", num assalto nocturno a um restaurante de praia, no Algarve, que efectuou os disparos que ceifaram a vida a dois incautos guardas fiscais que apareceram na zona.Por fim, em 1986, dá-se o caso que havia de alertar a opinião pública para a "ferocidade" de José Faustino Cavaco. Durante a fuga do Estabelecimento Prisional de Pinheiro da Cruz, depois de vários recuos de alguns dos seus cinco companheiros de evasão, o "Americano", que entretanto se apoderara de armas, matou três guardas prisionais.Faustino saiu da cadeia de Coimbra há cerca de dois anos. Vive no Algarve e, antes de ser devolvido à liberdade, terá solicitado verbas comunitárias para subsidiar um projecto pessoal: criação de caracóis.Mais complexo, mas igualmente violento, é o trajecto de Manuel Pedro Ramalho Dias, conhecido como Manuel "Alentejano". É autor de algumas frases, proferidas na cadeia de Coimbra, durante uma entrevista, que chocaram a opinião pública: "Depois de matar um homem fico sempre um pouco deprimido" e "O que mais me aborrece é lembrar-me dos filhos pequenos dessas pessoas [as que matou]".Ao certo ninguém sabe quantos homens matou Manuel "Alentejano". As suas condenações, entre roubos, furtos, etc., incluem quatro homicídios. Dizem os polícias que "é um psicopata" e "muito inteligente". Já cumpriu pena e vive agora no Alentejo, já não na companhia da avó e dos companheiros de reformatório e, aparentemente, desligado de qualquer actividade criminosa.Luís Miguel Guerreiro nunca evidenciou o destemor de Faustino Cavaco, a loucura de Vítor Jorge ou a psicose sanguinária de Manuel "Alentejano". Mostrou, ao que tudo indica, uma dose de sangue-frio impensável, ao conceber, com um mês de antecedência, a execução cruel de seis compatriotas. E que dizer dos três brasileiros que serviram de executores?