José Eduardo dos Santos promete não se recandidatar
O Presidente de Angola José Eduardo dos Santos anunciou ontem em Luanda que não deseja ser o candidato do seu partido, o MPLA, às próximas eleições - um escrutínio que ainda ninguém tem a certeza de quando poderá ter lugar, num país que continua a ter na variável guerra a sua principal incógnita.Esta incerteza foi assumida pelo próprio José Eduardo dos Santos aquando da abertura de uma reunião do Comité Central do MPLA, em que manifestou o desejo de não se recandidatar - e que para já ainda está longe de convencer analistas, apoiantes e adversários em relação ao seu carácter irreversível."Quer [as eleições] se realizem em 2002 ou 2003, teremos um ano e meio ou dois anos e meio para que o partido possa preparar o seu candidato para a batalha eleitoral e é claro que esse candidato desta vez não se chamará José Eduardo dos Santos."Esta declaração acabou por surpreender tudo e todos, incluindo os membros do Comité Central, com a excepção dos dirigentes do Bureau Político do MPLA, que, segundo o seu porta-voz Norberto dos Santos (também conhecido por "Kwata-Kanawa"), já tinham sido postos ao corrente há cerca de um mês desta intenção por José Eduardo dos Santos.O porta-voz do MPLA revelou que o Bureau Político decidiu criar um grupo de trabalho que já está a reflectir sobre as consequências do facto de José Eduardo dos Santos ter tomado a decisão de vir a abandonar a vida política, onde já se encontra há 22 anos como Presidente da República.A declaração de José Eduardo dos Santos não vai provocar de imediato qualquer alteração na actual estrutura do poder em Angola, pois o Presidente apenas se limitou a emitir um desejo futuro que está a ser considerado por alguns dos seus companheiros de partido como sendo para já ainda do foro pessoal. E a sua saída ainda poderá demorar uns três anos, mesmo que a guerra conhecesse o seu fim definitivo neste ano.Ontem, Eduardo dos Santos admitiu ser possível realizar as próximas eleições mesmo mantendo-se a actual situação de guerra, que o Governo considera ser já de baixa intensidade, tendo como pano de fundo um controlo quase total do território por parte das Forças Armadas governamentais."Realizar as eleições em paz será melhor para todos. Mas se a UNITA do sr. Savimbi continuar a não respeitar o protocolo de Lusaca e as resoluções das Nações Unidas e a manter a guerra, as Forças Armadas Angolanas e a Polícia Nacional terão de redobrar os seus esforços para garantir a estabilidade e a segurança que permitam realizar as eleições", prometeu Eduardo dos Santos.Aguarda-se agora pela reacção do próprio Comité Central do MPLA, que está reunido em Luanda em torno de uma agenda que inicialmente não incluía qualquer ponto relacionado com as próximas eleições e muito menos com a sucessão de José Eduardo dos Santos.Vários observadores contactados pelo PÚBLICO em Luanda aventam que o Comité Central vai certamente apelar ao Presidente Eduardo dos Santos para que reveja a sua posição, traduzindo a realidade de um partido onde o Presidente angolano continua a granjear o apoio da massa dirigente e militante, que nesta altura muito dificilmente está em condições de arriscar numa outra alternativa.Com todas as reticências que o anúncio feito por José Eduardo dos Santos está a suscitar em relação à sua sinceridade, desta vez mesmo alguns dos seus adversários reconheceram-lhe o mérito de ter para já conseguido quebrar a imagem de marca que o Presidente arrastava - de ser um homem desesperadamente agarrado ao poder absoluto, sem nunca ter admitido a possibilidade de vir a terminar os seus dias como um pacato cidadão comum.A esta ruptura positiva acrescenta-se o facto de o anúncio ter quebrado com um dos grandes tabus do MPLA, que era exactamente a discussão da sucessão de José Eduardo dos Santos.A intenção de José Eduardo dos Santos está a ser vista também em Luanda como uma clara mensagem dirigida ao seu arqui-rival, Jonas Savimbi, no sentido de pressionar o líder rebelde a pronunciar-se igualmente sobre o seu futuro político. Isto numa altura em que já algumas vozes têm defendido abertamente a necessidade de as duas personalidades abandonarem definitivamente a vida política activa após a pacificação do país. "Seria um grande favor que os dois líderes prestariam ao país", comentou ontem ao PÚBLICO um dos defensores deste abandono simultâneo.