Monumento pré-histórico da Praia das Maçãs vai ser musealizado
A Câmara de Sintra vai comprar o terreno onde está situada a "tholos" da Praia das Maçãs, um importante complexo sepulcral pré-histórico que, nos últimos anos, tem vindo a ser ameaçado pelo abandono e pela pressão imobiliária. O projecto de valorização da necrópole, a desenvolver em colaboração com o Instituto Português do Património Arquitectónico (Ippar), incluirá réplicas do espólio e dos esqueletos descobertos nas várias campanhas arqueológicas.A "tholos" da Praia das Maçãs - cuja construção remonta até 3800 a. C. - encontra-se classificada como monumento nacional. Estatuto de que pouco lhe tem servido de protecção: ainda em 1999, um arqueólogo detectou que a necrópole estava a ser usada como pista para bicicletas. No local, situado no Outeiro dos Mós, no meio da abundante vegetação, foi encontrada uma rampa em madeira que se presume ter sido usada para saltos de velocípedes.Após a denúncia desta agressão à "tholos", e do Ippar ter admitido o interesse em apoiar a aquisição do terreno, o advogado da proprietária escreveu à autarquia "no sentido de encontrar uma saída para a salvação do que resta do monumento paleolítico". Na carta, a viúva do comendador Manuel Nunes Corrêa propunha-se vender o terreno por 30 mil contos, considerando que este montante "equivale a cerca de um terço do respectivo valor".Segundo uma informação dos serviços municipais de património, o terreno, com uma área de 3317 metros quadrados, foi avaliado em 22.600 contos, mas, perante a verba exigida pela proprietária, "após negociações chegou-se a um valor de 25 mil contos". Foi este o montante proposto pelos serviços - até porque o projecto para a valorização do monumento "está em vias de ser financiado pelo III Quadro Comunitário (de Apoio), através do Ippar, mas o mesmo não financia a aquisição de terrenos" -, e que a presidente da autarquia submeteu esta semana ao executivo municipal. A aquisição foi aprovada pelo PS e PSD, com a abstenção da CDU."Abstivemo-nos porque consideramos que é um valor elevado", justificou o vereador Lino Paulo, da CDU, que embora não pretendendo inviabilizar a preservação do monumento considerou que, por aquele preço, "está-se a comprar por um valor de solo urbanizável". Isto partindo do pressuposto de que, naquela zona, a construção se encontra condicionada pela proximidade ao monumento. Mas, na prática, abundam exemplos de prédios ali construídos que vão deitando por terra o estabelecimento de uma Zona Especial de Protecção (alargando os 50 metros delimitados em redor da necrópole decorrentes da classificação), proposta em inícios dos anos 90, mas ainda por aprovar no Ippar."Foi a avaliação que foi feita e não conseguimos comprar por menos porque a proprietária não aceitou", respondeu, por seu lado, a presidente da autarquia, Edite Estrela, para quem a expropriação demoraria muito tempo e atrasaria o projecto de valorização a ser preparado pelo Ippar. A compra do terreno, reforçou a autarca, "é uma forma de preservar o monumento".A este terreno será associado uma outra parcela já propriedade do município. E não está ainda excluída a hipótese da autarquia vir a expropriar um outro terreno nas proximidades, dada a dificuldade em chegar a acordo com os proprietários. O projecto em preparação pelo Ippar para preservar a "tholos" -onde foram encontrados vestígios de enterramentos durante um longo período, entre o Neolítico e o Calcolítico Final -, ascenderá a um investimento superior a cem mil contos.Segundo adiantou ao PÚBLICO o director do Museu Arqueológico de São Miguel de Odrinhas, José Cardim Ribeiro, que colabora no projecto de valorização do sítio arqueológico, será feita "a vedação do terreno e a limpeza e recuperação das zonas degradadas", bem como o "restauro de toda a estrutura tumular pré-histórica". O projecto contempla ainda a cobertura da "tholos" com "uma estrutura leve e própria para monumentos, com iluminação adequada". No local serão também "repostos 'in situ', no próprio túmulo, reproduções do espólio e dos esqueletos encontrados em várias escavações arqueológicas", conservados no museu de Odrinhas e nos Serviços Geológicos de Portugal.Nas proximidades do monumento será construído um pequeno centro de interpretação, pois, conforme notou Cardim Ribeiro, o objectivo do projecto visa "conciliar uma vertente didáctica e turística". Além de adquirir os terrenos, a autarquia dará apoio técnico ao novo espaço museológico através do museu, numa iniciativa que Cardim Ribeiro qualificou como exemplar por "revelar uma óptima colaboração entre o Ippar e o município de Sintra".