Offspring a brincar no Atlântico
Directora demissionária do IPAE permanecerá no instituto, considerando que não houve ruptura, mas sim quebra de confiança e de encanto com José Sasportes. Uma entrevista de Joana Gorjão Henriques
A melhor parte dos Offspring é que eles próprios não se levam a muito sério - nem a eles nem ao seu público. O vocalista, Charles "Dexter" Holland, disse recentemente ao "New Musical Express" que a sua ideia de paraíso era "um sítio sem florestas tropicais e com um McDonald's em cada esquina" e acrescentou que a canção que melhor o define é "Just a gigolo", de David Lee Roth.É bom que seja assim, senão eventos como o de segunda-feira, em que os Offspring encerraram a sua "tournée" europeia perante uns oito mil portugueses no Pavilhão Atlântico, em Lisboa, seriam monstruosamente aborrecidos. Mas os Offspring não foram sempre um grupo pop que canta "Freud, Freud/ é tudo verdade" (do último single, "Original prankster") com uma ironia pós-moderna. Há meia-dúzia de anos, os Offspring tornaram-se conhecidos com "Smash", um álbum que servia de banda sonora para programas de televisão do tipo "Portugal Radical". Chamavam-lhes "skate punk", embora nenhum deles saiba andar de skate. A avaliar pela avalanche de "mosh" que recebeu temas mais antigos como "Come out and play", "Self esteem" ou "Gotta get away", muitos dos adolescentes que compunham a maioria da plateia do Atlântico ainda preferem essa fase.Mas isso era 1994; nessa altura, os Offspring eram, com os Green Day, os pontas de lança de uma espécie de renascença do punk americano, e incorporavam a "ética punk". Lançavam os seus discos numa editora independente, tinham "slogans" anarquistas e comportamentos altruístas, do género oferecer bilhetes de concertos aos seus fãs mais pobres; eram, em suma, o tipo de banda que tocaria em manifestações antiglobalização. No concerto de segunda-feira, estes tempos só são recordados brevemente numa pequena cerimónia de exéquias ao punk americano, composta por "One fine day" e "What in the world happened to you".Entretanto, os Offspring venderam a alma ao grande capital e tornaram-se mais interessantes - assinaram por uma multinacional e descobriram o sarcasmo. O seu penúltimo álbum, "Americana", faz algo que muito poucas bandas teriam coragem de fazer - troçar do seu público-alvo, o adolescente inconsciente americano.Em palco, os Offspring reflectem isso. Têm uma atitude despreocupada e parecem divertir-se, mas pouco comunicam com o público. Dexter e o estranhamente baptizado guitarrista Noodles (o nome, em inglês, quer dizer "massa chinesa") trocam sorrisos. Os Offspring entraram em palco com "Bad habit", um tema de "Smash" sobre violência na estrada. A primeira música que tocam do novo álbum ("Conspiracy of One") é "Special delivery", um tema sobre violência psicopata. O assunto seria retomado mais adiante com "The kids aren't alright", sobre a violência juvenil, mas antes Dexter resolveu apresentar a banda. O sistema de som não permitiu perceber quase nada do que ele disse, mas houve uma parte em que ele disse que Noodles é o guitarrista principal da banda, e que é preciso muito talento para se ser guitarrista principal. Noodles responde tocando o "riff" de "Sweet child of mine" (Guns'n'Roses). Dexter: "Oh não, isso é uma porcaria, isso não. Vá lá, todos, digam 'fuck you Noodles'!" Público: "'Fuck you Noodles'!" Ao fim de uma hora, os Offspring saem por uns instantes e regressam para o previsível "encore", que inclui o épico "Pretty fly (for a white guy)". Anunciam "Want you bad" como a última música do último concerto da sua digressão europeia; ao fim de uma hora e vinte minutos de concerto (não é lá muito), vão-se embora, ainda a rir.O MELHOR "Pretty fly (for a white guy)" - o grande "single" de 1999 resulta igualmente bem ao vivo.O PIOR O som - pelo menos em certas zonas do Atlântico, o barulho vindo do palco era amarfanhado pelo sistema sonoro.