"Avante!", jornal do PCP, chega aos 70 anos...
<EM><FONT FACE="Times New Roman" SIZE="4">Recorde mundial de clandestinidade</FONT></EM><STRONG><EM>Histórias do "Avante!", jornal fundado em 1931, e que chegou a cair das oliveiras</EM></STRONG>Por altura da apanha da azeitona chegaram a cair jornais "Avante!" das oliveiras em terras alentejanas, uma das muitas formas encontradas para distribuir clandestinamente o órgão central do PCP, que comemora 70 anos na próxima quinta-feira.A proeza de esconder as folhas de papel de arroz nos ramos das oliveiras aconteceu no Baixo Alentejo nos finais da década de 50, e foi obra do filho mais velho de um proprietário rico, que a certa altura resolveu trocar as vestes de cavaleiro pelo fato macaco de operário, aderindo aos ideais do PCP.No final de 1930, um grupo de funcionários do partido decidiu publicar um órgão clandestino com o nome de Avante!, que hoje se orgulha de ter sido o jornal publicado clandestinamente durante mais tempo em todo o mundo. Chegou a sair semanalmente em 1937 e 1938, mas no final dessa década esteve interrompido por mais de dois anos.Em 1941, com a reorganização do PCP que deu ao partido a dimensão nacional, e até ao derrube da ditadura, o jornal seria publicado todos os meses e durante alguns períodos quinzenalmente.Só o primeiro número foi impresso numa tipografia legal, próxima do Largo de São Paulo, em Lisboa, graças a um estudante do liceu Gil Vicente que convenceu o tipógrafo a imprimir, além de um boletim estudantil, mais umas quantas folhas - o "Avante!".A partir daí e até ao 25 de Abril, o jornal foi sempre impresso em tipografias clandestinas. O trabalho era todo feito manualmente, por funcionários que pareciam ter uma vida normal.Algumas vezes a perseguição da PIDE (Polícia Internacional de Defesa do Estado) resultou na morte dos tipógrafos. No dia 24 de Janeiro de 1950, o corpo do funcionário José Moreira deu entrada na morgue com a indicação de que caíra de uma janela. Mas a verdade era outra, a PIDE sabia que ele era o responsável da ligação às tipografias do "Avante!". Interrogou-o e espancou-o até à morte, acabando por o atirar da janela.As regras para quem trabalhava na clandestinidade eram rigorosas ao ponto de ter que se fazer as malas à mínima suspeita de se ter dado nas vistas.Um casal de tipógrafos em fuga para o Porto, transportando material comprometedor, não ganhou para o susto quando viu a estação dos comboios cheia de polícias, pensando que a PIDE os tinha apanhado. Mas era apenas a escolta policial do presidente Américo Tomás, que acabou até por ajudar o casal.Um dos polícias que desimpedia o caminho à passagem do almirante pegou-lhes na bagagem e queixou-se do peso da mala comentando que "até parece chumbo", sem saber que a mala continha de facto o chumbo dos tipos de impressão do jornal.Distribuído nas caixas do correio, passado entre outros papéis e livros entre estudantes, as folhas de papel de arroz impresso chegaram a ser comidas em desespero de causa, ou seja, quando a PIDE estava na iminência de lhes deitar a mão.O jornal oficial do partido comunista, assumido pelo seu actual director, José Casanova, como "não isento" e "agitador", foi durante os tempos da ditadura um símbolo para os que se identificavam com os ideais comunistas."A voz dos que não têm voz" ou "o jornal que luta pelos explorados contra os exploradores" continuam a ser as expressões preferidas de Casanova para definir o jornal, que, como órgão central do PCP, deixa de fora da praça pública as vozes discordantes da opinião oficial do partido.Os trabalhadores, a juventude, a análise da política nacional e internacional e, desde a remodelação do ano passado, secções dedicadas a livros, música e espectáculos, constituem os temas dos artigos do jornal, cuja tiragem ronda os 17 mil exemplares, distribuídos nos centros de trabalho e nas bancas dos jornais.O recorde de tiragem foi atingido com a primeira edição depois da Revolução. Quinhentos mil exemplares saídos a 17 de Maio de 1974 pela primeira vez das máquinas da Sociedade Nacional de Tipografia.A participação dos comunistas no Governo Provisório, a situação dos trabalhadores e da intersindical eram os destaques do jornal, que publicava uma resolução do Comité Central sobre o 25 Abril.A história das tipografias clandestinas em Portugal, que acaba por ser a história do "Avante!", vai ser compilada em livro por José Casanova.Com publicação prevista para Setembro, na Festa do Avante!, o autor pretende recuperar "alguns nomes hoje desconhecidos, mas que fizeram parte da história da imprensa clandestina portuguesa, crianças que nasceram nas tipografias e que aprenderam a ler a compor os tipos de impressão do jornal".Criar uma página na Internet autónoma do "site" do PCP com actualizações diárias será outro desafio do "Avante!", que se orgulha de ter sido o primeiro dos jornais portugueses a aderir à rede, de acordo com José Casanova.Houvesse a Internet nos anos da ditadura, e o operário alentejano que guardou os "Avante!" nas oliveiras também não teria tido necessidade de os esconder na "Station Mercedes" em que semanalmente dava boleia a um grupo de freiras. Debaixo dos bancos das religiosas, pensou o operário, nem a PIDE se atreveria a procurar.