"Caminhos Perigosos" é a enésima adaptação, nos últimos anos, de uma história de John Grisham, autor que parece ter-se tornado numa espécie de pronto-socorro para cineastas em "panne" de inspiração. Com Coppola operou maravilhas (o óptimo "O Poder da Justiça"), com Altman não tanto, embora "Caminhos Perigosos" não seja de menosprezar completamente. A novidade, pensando na matriz Grisham, é que "Caminhos Perigosos" não seja um "court room drama" e que se limite a uma curta sequência o tempo passado dentro de uma sala de tribunal. Mas, mesmo dentro de uma lógica de "thriller" mais ortodoxa, continuam a ser os advogados (num olhar em que o glamour o e amoralismo cúmplice se fundem) a estar na berlinda. A história passa-se em Savannah, onde a personagem de Kenneth Branagh, um advogado famoso (quer dizer, com mais inimigos do que amigos), se envolve com uma rapariga (Embeth Davidtz) que conhecera numa festa e acaba por se tornar seu representante num processo contra o pai dela, um velho "freak" semi-louco (Robert Duvall) que lidera uma seita composta por outros velhos "freaks" semi-loucos. Depois as coisas complicam-se, numa série de volte-faces narrativos (mais ou menos plausíveis, melhor ou pior engendrados) que cumprem o papel de "marca de Grisham" e fazem com que, no fim, nada seja aquilo que aparentava no princípio. Enquanto filme de género "Caminhos Perigosos" funciona de modo tão banal quanto eficaz, bem apoiado numa sólida galeria de personagens secundárias (para lá das citadas, as de Daryl Hannah, Robert Downey Jr., Tom Berenger, Famke Janssen), numa atmosfera cuidada (a que não falta a iminente chegada de uma tempestade tropical, o furacão "Geraldo") e no recurso (caro a Altman mas nem sempre pertinente) à montagem paralela. O mais interessante ? será por aí que se insinua um "olhar de autor" ? será o modo como Altman vê as suas personagens, em especial a do protagonista Branagh. "Caminhos Perigosos" é um filme sobre um complot, e portanto sobre o tema que melhor se associa a ele, a paranóia. A história que parece interessar a Altman é essa: a de um homem que tem tudo para ser poderoso e inabalável mas que se deixa envolver num mecanismo que não controla e que acaba por amplificar, em grande parte graças à sua própria paranóia ? acabando, involuntariamente, por jogar um papel fundamental no próprio complot que pretende deslindar. No plano das intenções, não estamos portanto muito longe de um filme como "O Jogador": trata-se de filmar, de maneira ácida, o momento em que o "beautiful people" entra em perda e arrisca, de uma só vez, poder, estatuto e fortuna. Mas também é aí que "Caminhos Perigosos", às voltas com o espartilho de uma narrativa cheia de nós que é preciso desatar, menos cumpre o que parece prometer.
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