O vulcão moribundo

Invulgar pela forma como se manifestou, o vulcão da Serreta, nos Açores, tem fascinado os cientistas que agora prevêem que não vomite materiais das entranhas da Terra por muito mais tempo. O vulcão da Serreta, que parece estar no fim da vida, recebe hoje a visita de mais uma equipa de cientistas.

Ao cabo de quase dois anos de actividade, o vulcão submarino da Serreta, ao largo da ilha Terceira, nos Açores, está na fase terminal da sua vida. Por isso, uma equipa de investigadores portugueses e franceses vai lá hoje de manhã deitar os olhos, com a ajuda de um submarino comandado à distância, para ver a fase moribunda deste vulcão inédito na história da vulcanologia. Nunca antes de 18 de Dezembro de 1998 - dia em que pescadores açorianos avisaram as autoridades da existência de colunas de fumo a cerca de dez quilómetros da Ponta da Serreta, no canal entre as ilhas Terceira e São Jorge - o modelo eruptivo deste vulcão havia sido observado nem descrito na literatura científica. Manifestou-se por blocos escuros de lava fumegante que irrompiam à superfície: eram como balões de lava, pois encontravam-se cheios de gases no interior, graças aos quais ascendiam até à superfície. Depois de flutuarem uns minutos e libertarem o gás que está lá dentro, iam estalando e, quando arrefeciam, acabavam por se quebrar e afundar. O vulcão submarino da Serreta apresentou outra particularidade: não era propriamente um vulcão, ainda que na linguagem corrente o fenómeno seja assim identificado. Ou seja, não era uma montanha que cospia lava, mas, antes, um sistema vulcânico composto por diversas fracturas na crosta terrestre, ao longo das quais a lava era expelida por vários focos. O facto de o magma ser bastante fluido determinou que a erupção se desenvolvesse num estilo menos explosivo, e a lava acabasse por sair do fundo do mar ao longo dos acidentes tectónicos que caracterizam aquela zona. O que saía por estas fracturas eram, precisamente, os tais balões de lava. Porque esta manifestação vulcânica foi invulgar, o vulcanólogo Victor Hugo Forjaz, que coordena a missão de hoje ao vulcão da Serreta, já propôs que essa actividade submarina se passe a designar de tipo serretiano. Desde o início da erupção, houve algumas missões científicas ao vulcão, umas coordenadas por João Luís Gaspar, director do Centro de Vulcanologia da Universidade dos Açores, outras por Victor Hugo Forjaz, da mesma universidade e que também preside à comissão instaladora do Observatório de Vulcanologia dos Açores, uma entidade privada. A missão de hoje conta com um submarino operado remotamente (ROV) da Sociedade de Vulcanologia Europeia, com sede na Suíça, para ver tudo o que se passa debaixo da água. Acompanham-na ainda investigadores franceses, incluindo o presidente da Sociedade de Vulcanologia Europeia, o francês Henri Gaugru. O ROV, ligado por um cabo a uma embarcação, numa espécie de cordão umbilical, atinge 400 metros de profundidade, tem holofotes potentíssimos e envia mensagens vídeo para a superfície. Vários objectivos estão na mente dos cientistas, diz Victor Hugo Forjaz: ver como estão depositados no fundo do mar os materiais expelidos antes da invernia que aí vem e que movimentará tudo e se ainda há saídas de fluidos do interior da Terra. Além disso, pretende-se observar se já há convivência entre os animais e a paisagem. Far-se-ão ainda estudos através de ultra-sons, continua Victor Hugo Forjaz, para conhecer a movimentação do magma e fluidos."São observações da fase terminal de um vulcão", diz o vulcanólogo, evidenciada pela redução, desde Maio, da chegada de produtos à superfície e do cheiro a enxofre. Os últimos relatos (embora não confirmados) de manifestações à tona da água são de Julho. "Agora queremos ver se há colunas de água quente lá em baixo, se há bolhas que não chegam à superfície... Pode haver actividade que não chega cá acima."O Banco D. João de Castro - situado entre as ilhas de São Miguel e a Terceira e que já foi ilha em 1720 para desaparecer nesse mesmo ano - não ficará fora das câmaras do ROV, pois é lá que mergulhará depois da Serreta. Também aqui o uso de ultra-sons servirá para conhecer melhor as fracturas na crosta terrestre. Tudo porque, a apenas dez a 8 metros de profundidade, o Banco D. João de Castro é bastante sísmico. "Julga-se que aquela zona vai ser teatro de futuras erupções."

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