O colosso da Asprela
Um dos maiores edifícios públicos vai nascer no Porto. Será a nova Faculdade de Engenharia da UP, um complexo de nove blocos iniciado em 1996 e que deve abrir no início do próximo ano lectivo. A obra custou cerca de dez milhões de contos.
Um gigante está prestes a eclodir na zona da Asprela, no Porto. E, embora o seu aspecto não seja tão assustador como o daquele que costumava assombrar o cabo das Tormentas, o seu impacte na zona irá ser forçosamente retumbante. Não poderia ser, aliás, de outra maneira, dado tratar-se de um dos maiores edifícios públicos do país, com um total de utentes que poderá ascender a um número máximo de 7500. Em bom rigor, não está em causa apenas um imóvel, mas um autêntico complexo arquitectónico formado por nada menos do que nove blocos, cada qual constituído por um número apreciável de pisos. Será assim a nova Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP), integrada no chamado pólo 2 da Universidade do Porto, situada a norte da Faculdade de Economia e que vem substituir o velho e sobrecarregado edifício da Rua dos Bragas, onde a faculdade tem vindo a funcionar desde 1937. A construção da nova faculdade está praticamente terminada, sendo já possível a quem passar pela zona avaliar a grandiosidade do empreendimento. E é já amanhã, na presença do ministro da Educação, Guilherme Oliveira Martins, que a Universidade do Porto toma oficialmente posse do novo edifício, para, pouco tempo depois, se iniciar o delicado processo de mudança das instalações. Tudo está programado para que os professores e alunos dos vários cursos de Engenharia possam utilizar o complexo da Asprela a partir do próximo dia 18 de Setembro, data da abertura oficial do ano lectivo 2000/2001. A faculdade ficará operacional na sua totalidade, devendo, em princípio, faltar apenas a realização de alguns pequenos acabamentos. Até lá, serão efectuados alguns testes relativos a equipamentos e à rede de informática para que a nova faculdade possa arrancar em pleno; como referiu ao PÚBLICO o presidente do Conselho Directivo da FEUP, Marques dos Santos, o constrangimento provocado pelas mudanças obrigou até a administração a solicitar aos funcionários da casa que não marcassem férias para depois do dia 20 de Agosto. Com o arranque do novo complexo do pólo 2, ficarão, no dizer dos seus responsáveis, finalmente reunidas as condições para que a FEUP possa cumprir os seus "objectivos estratégicos". Na verdade, a criação de um novo e moderno edifício para albergar os cursos de Engenharia é um desiderato já antigo e que ninguém sabe, ao certo, quando terá sido assumido pela primeira vez. Marques dos Santos está desde 1990 à frente dos destinos da FEUP e praticamente logo a abrir o seu mandato fixou a mudança de instalações como uma meta fulcral. Já em 1986 fora elaborado um programa preliminar com vista a esse objectivo (foi, aliás, nessa altura que o projectista da faculdade, o arquitecto Pedro Ramalho, ganhou um primeiro concurso para a sua concepção) e, mesmo pouco depois do 25 de Abril, quando a faculdade iniciou o seu processo de expansão para as instalações do antigo Colégio Almeida Garrett, se chegou a aventar a possibilidade de criar um edifício de raiz, ideia essa que só não avançou porque entretanto se encontraram algumas soluções paliativas.No fundo, há uma ideia que persiste, e desde há pelo menos duas décadas: o edifício da Rua dos Bragas rebenta pelas costuras - o corpo discente aumentou substancialmente nos últimos anos - e deixou de dar vazão às necessidades dos vários departamentos da faculdade, quer quanto à parte lectiva quer quanto às exigências de investigação laboratorial. Raimundo Delgado, membro do conselho directivo da FEUP, afirmou que, a este nível, se vive já uma situação "praticamente insustentável"; segundo contou este responsável, há até trabalhos de investigação com algum potencial de mérito e inovação que não são sequer iniciados por falta de condições e espaço para os levar a cabo. O que compromete, sem dúvida, a missão afirmada no plano estratégico da FEUP: "Formar profissionais de Engenharia de nível internacional, sustentada em Investigação e Desenvolvimento de excelência". O número de laboratórios aumentará cinco vezes; doravante, já não poderá haver desculpas para que as coisas corram mal. Delgado mostra-se satisfeito com o progresso que poderá ser alcançado por via destas novas instalações, que atingem uma área de construção de 85 mil metros quadrados, ou seja, sensivelmente o triplo da actual. Haverá, pelo menos, um bloco para cada um dos seis departamentos de Engenharia: Civil, Electrotécnica e de Computadores, Mecânica e Gestão Industrial, Metalúrgica e de Materiais, Minas e Química. Cada departamento terá o seu conjunto de laboratórios, sendo certo que, no caso de Engenharia Civil, estarão disponíveis duas naves (uma delas com 2000 metros quadrados), onde poderão ser feitas experiências com máquinas de maiores dimensões, havendo ainda uma outra para os testes de Engenharia Mecânica. As salas de aula vão igualmente sofrer um importante incremento. Dos oito anfiteatros existentes no edifício velho, passa-se para um total de 36 auditórios, com capacidades que oscilam entre os 50 e os 500 lugares. Além da normal actividade pedagógica, prevê-se que as salas possam acolher congressos e conferências, bem como eventos de carácter cultural. Onde a melhoria poderá ser mais notória é nas instalações da biblioteca. Se na casa da Rua dos Bragas, ela não passava de duas salas que o tempo tornou exíguas, no novo complexo da Asprela passará a dispor de um bloco de oito pisos só para esse efeito, junto ao acesso nascente, com um total de 550 lugares sentados. Como referiu Raimundo Delgado, a ideia é fazer com que aquele equipamento se torne não só numa referência incontornável da própria faculdade mas também na grande biblioteca técnica do Norte do país. O uso das tecnologias informáticas será uma constante, de tal modo que, segundo Marques dos Santos, haverá seis mil postos de acesso por esta via. A primeira pedra do complexo da Asprela foi lançada em Agosto de 1996. Ao longo destes quatro anos, o processo não foi isento de incidentes, se bem que, na opinião de Raimundo Delgado, a empreitada tenha ficado concluída num "belíssimo prazo", dentro daquilo que é normal em obras desta natureza. Chegou a apontar-se uma meta de dois anos para concluir o edifício, previsão essa que cedo se viria a revelar irrealista, devido à enorme complexidade do projecto. Por outro lado, foi necessário proceder ao despejo e posterior realojamento de uma comunidade que vivia em habitações degradadas no terreno futuramente ocupado pela faculdade, tendo-se as negociações prolongado por mais de meio ano. Em números redondos, a empreitada ascendeu aos dez milhões de contos, o que corresponde basicamente, segundo Delgado, à estimativa que inicialmente fora feita. Das inúmeras valências previstas para o complexo de Engenharia, só a cantina poderá não estar pronta a tempo da entrada em funcionamento da faculdade, embora o atraso não deva ultrapassar alguns dias. A cantina ficará situada do outro lado da futura via estruturante da Faculdade de Engenharia, acedendo-se ao recinto através de um viaduto pedonal sobre a referida via. Também a associação de estudantes, que há-de ficar instalada no futuro edifício de actividades juvenis da faculdade (que incluirá ainda as sedes de tunas e comissões de curso, entre outras), terá de se contentar, para já, com instalações provisórias. Se, quanto à faculdade em si, o essencial ficará garantido para Setembro, já algumas dúvidas se colocam em relação à chamada via estruturante, um eixo considerado indispensável para a fluidez do tráfego acrescido gerado pelo advento da nova FEUP. A nova via terá uma direcção nascente-poente e estender-se-á da Rua de Roberto Frias até às imediações da A3 (numa primeira fase), prevendo-se que numa fase posterior possa prolongar-se até à Areosa através de uma passagem desnivelada por baixo da auto-estrada. Já se sabe qual a entidade que irá executar a obra, faltando apenas celebrar o contrato. Segundo uma fonte da câmara, não haverá razões para pensar que a futura avenida não fique pronta até Setembro, dado que já está reservado um corredor, a obra é fácil e não implica grandes movimentos de terras. Seja como for, os primeiros cem metros da nova via poderão ser suficientes para escoar algum do grande tráfego de acesso ao complexo. Para o estacionamento é que, a uma primeira análise, as oportunidades não abundam. Para uma população que poderá ascender, para já, aos seis mil utentes, não haverá mais do que mil lugares para automóveis. Marques dos Santos está convencido de que este número é suficiente, até porque nem todos os estudantes se deslocam de carro para a faculdade. No mesmo sentido se pronuncia Raimundo Delgado, para quem, todavia, a dissuasão do uso do automóvel não está ainda nos seus melhores dias. E sustenta: "Só com o metro a funcionar é que as coisas poderão melhorar".