A abertura da Rua de Mouzinho da Silveira
Até às eleições autárquicas, Braga vai assistir a um "boom" de inaugurações de novas vias rápidas, que vão revolucionar o trânsito na cidade. Mas os projectos da câmara são mais ambiciosos e incluem a criação de três circulares externas, que se juntam ao anel interno já concluído. A autarquia garante que nos próximos 20 anos não haverá problemas para os automobilistas.
Completaram-se ontem 125 anos sobre a data em que na sessão da Câmara Municipal do Porto foi tomada a decisão de abertura daquela que se veio a designar Rua de Mouzinho da Silveira. Se bem que a referida deliberação, e correspondente aprovação do traçado da nova artéria, tenha sido definitivamente aprovada naquela reunião, importa referir que, cerca de três anos antes, a autarquia já tinha dado a sua anuência a um anterior projecto, datado de 15 de Março de 1872, de abertura de uma rua "paralela à Rua das Flores, para ligar o Largo da Feira de S. Bento com a Rua de S. João".O estabelecimento de uma adequada ligação entre a zona ribeirinha e o centro da cidade era algo que se impunha de uma forma evidente no início do último quartel do século XIX. O intenso tráfego comercial que então marcava a zona de beira-rio - "não nos esqueçamos que nessa época, e até quase à primeira metade do século XX, grande parte da vida comercial da cidade se encontrava virada para o rio" -, particularmente quando se procurava dirigir para o centro da cidade, deparava com um sério obstáculo, representado por uma miríade de pequenas e estreitas artérias que compunham a sua herança medieval. Era, por conseguinte, imperioso e urgente o estabelecimento de uma nova ligação, neste caso com o centro da cidade, que desde o século XVIII vinha reforçando a sua importância económica e social, culminando com o estabelecimento dos paços do concelho na então Praça Nova (1819), última medida para a sua plena afirmação administrativa e cívica. A abertura da Rua de Mouzinho da Silveira era, assim, uma consequência natural do desenvolvimento económico registado principalmente a partir da segunda metade do século XIX, "exigindo a correspondente transformação da estrutura urbana da Cidade Invicta, nomeadamente na zona ribeirinha, através da abertura de novas ruas, da realização de inúmeras obras de alargamento e de alinhamento, no intuito de contrariar a tortuosa herança medieval que o seu traçado constituía".O crescente tráfego, que se processava em duas direcções fundamentais "para o centro e parte alta da cidade, e para as áreas portuárias, comerciais e industriais da Ribeira, Miragaia e Massarelos", obrigara já à elaboração de sucessivos projectos de arranjo daquelas zonas, como hoje em dia podemos comprovar pelos inúmeros planos, cartogramas e outra abundante documentação da época existente no Arquivo Histórico Municipal. Aliás, este reordenamento urbanístico iniciou-se de uma forma muito clara logo após a vitória do liberalismo, com a realização de uma obra emblemática, a construção da ponte pênsil, inaugurada em 1843.A abertura da Rua de Mouzinho da Silveira foi realizada em duas fases: a primeira, cujo traçado foi projectado por Luís António Nogueira em 1872, e aprovado definitivamente pela autarquia em 17 de Junho de 1875, com ligeiras alterações, "entre as quais a ampliação da sua largura de dezasseis para dezanove metros", iniciava-se no Convento de S. Bento de Avé-Maria e terminava no alto da Rua de S. João; a segunda fase, igualmente proposta em 1872 e aprovada sem alterações, correspondia ao seu prolongamento até à Rua Nova dos Ingleses.Este importante melhoramento urbano exigiu, inevitavelmente, a expropriação de mais de 80 parcelas de habitações que se localizavam na área correspondente ao seu traçado, para além da demolição de alguns edifícios notáveis, como a Capela de S. Crispim e a graciosa Capelinha de S. Roque. Foi igualmente sacrificado um dos últimos vestígios da antiga muralha fernandina, localizado próximo do Largo da Porta de Carros, em frente à Igreja dos Congregados. Em contrapartida, constituiu um significativo avanço na igualmente indispensável higienização daquela área da cidade, com a eliminação da zona dos malcheirosos curtumes, assim como o integral encanamento do rio da Vila ou da Cividade, que então corria parcialmente a céu aberto, e desaguava no Douro junto ao Postigo e Ponte das Tábuas.Inicialmente, estava previsto denominar a nova via com a designação de uma pequena artéria situada nas proximidades - "a Rua da Biquinha" -, a qual iria desaparecer no contexto do novo arranjo urbanístico, mas a autarquia decidiu abandonar essa prosaica denominação e crismar o novo arruamento com o nome de uma das personalidades que tinham sofrido as vicissitudes do Cerco do Porto, e à qual não tinha sido prestada a devida homenagem, o notável e dinâmico reformador liberal José Xavier Mouzinho da Silveira, o qual era, porventura, o único dos heróis do desembarque de Pampelido cujo nome não tinha sido ainda consagrado na toponímia portuense.