João Grosso no D. Maria, Giorgio Corsetti no S. João
As direcções dos teatros nacionais de Lisboa e Porto vão mudar, anunciou ontem, de surpresa, o ministro da Cultura. No D. Maria II, o actor João Grosso substitui o encenador Carlos Avillez, já a partir de Setembro. No S. João, o encenador italiano Giorgio Corsetti sucede a Ricardo Pais, que continuará no cargo até ao final do Porto Capital da Cultura 2001.
Era para ser uma visita às obras que estão a decorrer desde Novembro no Teatro Nacional D. Maria II, em Lisboa, e que estarão totalmente concluídas no final do mês. Mas, inesperadamente, num encontro designado como "informal", o ministro da Cultura, Manuel Maria Carrilho, anunciou ontem que o actor João Grosso vai ser o novo director do Teatro Nacional D. Maria II, em Lisboa, e que o encenador italiano Giorgio Barberio Corsetti vai assumir a direcção do Teatro Nacional de S. João no Porto. Se a saída de Carlos Avillez do D. Maria, após o término do seu mandato, em Setembro, era previsível - o encenador já tinha manifestado o desejo de abandonar o cargo para se dedicar à sua actividade no Teatro Experimental de Cascais, que terá uma nova sede na Quinta da Alagoa - a sua substituição por João Grosso não o era. Nem tão pouco a entrada de Corsetti, para a direcção do S. João, que Carrilho justifica apenas com a "aposta de internacionalização cada vez mais forte" naquele teatro nacional portuense, à frente do qual Ricardo Pais (que já esteve na direcção do D. Maria) permanecerá até terminar o Porto Capital da Cultura 2001. Sublinhando a importância dos teatros nacionais, tanto nas direcções artísticas, como nos programas plurianuais, o ministro falou da necessidade de aproximação aos padrões europeus. Quanto à composição das novas direcções, nada adiantou, afirmando que ainda não estava definido quem seriam os novos membros que iram integrar as equipas.Momentos antes, Carrilho havia agradecido a Carlos Avillez e a Antonino Solmer, director técnico e de produção do D. Maria, "o trabalho" ao longo daqueles sete anos. Solmer, que também sairá em Setembro, mostrou-se satisfeito com a solução para o Teatro Nacional já que chega ao fim a missão para a qual se tinha comprometido: "Criar as condições para mudança". Sobre a escolha do actor João Grosso, Antonino Solmer disse ao PÚBLICO: "O meu objectivo sempre foi o teatro nacional e esta escolha representa uma coisa muito positiva. Ela anuncia uma ruptura que quanto a mim já devia ter sido produzida no teatro português. Ou seja, a ascensão das gerações mais novas". Nome anteriormente sondado para a direcção do D. Maria foi o de Luís Miguel Cintra. Ao saber ontem, pelo PÚBLICO, das nomeações de João Grosso e Corsetti, a primeira reacção deste actor e encenador foi perguntar: "E o Ricardo Pais não fica em parte nenhuma?" É, de facto, a questão que estava e está por responder - o ainda director do S. João manteve-se ontem incontactável, no Brasil. Instado a comentar as escolhas feitas, Cintra referiu ainda que "João Grosso é um bom actor e Corsetti é um encenador interessante", mas que, mais que os nomes, o que importaria conhecer era "qual a política, qual a programação para os teatros nacionais."Por seu turno Jorge Silva Melo, dos Artistas Unidos - que também resume Corsetti como um encenador "interessante" - reagiu à nomeação do D. Maria sublinhando a importância da escolha de um actor: "Fico muito contente pela substituição feita violar a própria lei orgânica do D. Maria, que obriga a que o director seja um encenador. Os encenadores têm dominado. Congratulo-me com uma mudança que só honra os actores."Levantada a questão da "violação da lei", o assessor do ministro da Cultura respondeu ao PÚBLICO que João Grosso fora considerado também como encenador (ver perfis), e referiu que as alterações que Carrilho ontem admitiu virem a ser feitas seriam apenas "pontuais", não incluindo essa em particular.No Café do Teatro, perante o ministro da Cultura e dos jornalistas, Carlos Avillez falou da "experiência incrível e muitas saudades" que irá levar do D. Maria, considerando positiva a renovação na direcção do teatro, cargo que ocupava desde 1993. Também presente, o seu sucessor anunciado João Grosso manifestou-se satisfeito com a notícia que soubera apenas "há poucos dias" e afirmou ainda não ter um projecto artístico definido. Afirmou no entanto que como actor da companhia conhece de perto os problemas da instituição - em finais de 1998 entrou para os quadros da instituição pública, juntamente com Canto e Castro, Rui Mendes ou Fernando Luís. O PÚBLICO tentou ouvir Giorgio Corsetti, mas até à hora de fecho desta edição não foi possível encontrar o encenador italiano, que com Ricardo Pais tem colaborado (ver perfis).Carrilho aproveitou também para anunciar algumas das conclusões de um relatório "reservado" sobre o D. Maria, pedido há mais de um mês, em sequência de vários problemas detectados num teatro onde os trabalhadores chegaram, em 1998, a fazer greve, reivindicando aumentos salariais, estruturação de carreiras e regulamento interno. Problemas que, sublinhou o ministro, já "não são financeiros", uma vez que este instituto público com autonomia financeira em relação ao Ministério da Cultura, teve um orçamento de 1215 milhões de contos para este ano (o D. Maria, em 1998, encerrou para fazer face a um buraco finaceiro superior a 200 mil contos). Segundo o anúncio de onte, será então criada uma comissão de reestruturação para sistematizar problemas como a existência de 155 trabalhadores, sendo que 30 são actores e o elenco tem uma média de idades de 48 anos, 103 estão em regime de contracto individual de trabalho e os restantes são técnicos administrativos; haver uma grelha salarial com 50 níveis e 15 horários diferentes de trabalho; ou a qualificação profissional (50 por cento dos trabalhadores têm o 6º ano de escolaridade). O ministro sublinhou ainda a necessidade de reformulação da lei orgânica, do regulamento interno e dos quadros. A Sala Garrett do Teatro D. Maria reabrirá em Setembro com uma nova cara. A plateia, com capacidade para 251 lugares, tem novas cadeiras forradas a veludo vermelho (a mesma cor das cortinas que ainda estão por colocar) num estilo que passará a ser designado de D. Maria, uma nova alcatifa amarela, e futuramente será ali instalada uma regie. O primeiro e segundo balcões têm 68 lugares cada e o terceiro será utilizado posteriormente como piso técnico. As obras no telhado e na cobertura permitiram melhorar as condições acústicas do palco, que será inaugurado com a peça "A Real Caçada ao Sol", de Peter Shaffer, ainda encenada por Carlos Avillez.*com Alexandra Lucas Coelho e Rui Ferreira e Sousa