UNITA quer mediação do Governo português
Portugal vai ter um papel importante na resolução da guerra em Angola por meios pacíficos. Quem o diz é Adalberto Costa Júnior, uma das mas mais destacadas figuras da UNITA na Europa, reagindo ao relatório da comissão de sanções da ONU. Depois de muitas vezes ter acusado o Governo de Lisboa de não ser isento na sua missão de observador do processo de paz, o Galo Negro parece tentar agora apagar a animosidade do passado.
Adalberto Costa Júnior, presidente da Comissão de Justiça, Paz e Reconciliação em Angola, recentemente mandatada pela direcção da UNITA para tentar ultrapassar o impasse no processo de paz, exprimiu ontem ao PÚBLICO a esperança de que, em breve, o Governo português "esteja em melhores condições" de aproximar os dois beligerantes do conflito angolano. Numa conversa telefónica a partir de Roma, onde representa o seu partido, o antigo delegado do Galo Negro em Portugal declarou "não esperar outra coisa" de Lisboa que o reatar de um papel de observador isento do processo de paz angolano: "A inteligência e o bom senso apontam para isso."Inquirido a propósito do relatório das Nações Unidas sobre a aplicação de sanções à UNITA, Adalberto Costa Júnior considerou que o documento "peca fundamentalmente por uma questão" - a de ter sido elaborado sem que tivesse sido ouvido o próprio partido de Jonas Malheiro Savimbi. O relatório, que considera a UNITA o principal responsável pela actual guerra em Angola e lhe atribuiu a responsabilidade total pelo não cumprimento do Protocolo de Lusaca, de 1994, não teve em conta, segundo Adalberto Júnior, factos como a intervenção das Forças Armadas Angolanas (FAA) nos dois Congos. No entender do dirigente do Galo Negro, todo o documento redigido pela equipa do embaixador canadiano na ONU, Robert Fowler, "enferma da lógica de que em Angola existem reservas estratégicas de petróleo" e que tudo deve ser sacrificado ao aproveitamento desse mesmo petróleo, em vez de se buscarem espaços de abertura e de diálogo entre as duas partes em conflito.O presidente da Comissão de Justiça, Paz e Reconciliação afirmou "não ter nenhuma dúvida de que se regressará ao diálogo", pois fracassaram nos últimos cinco meses as perspectivas do Governo angolano de que tudo poderia ser resolvido pela força das armas. "Constata-se que a guerra está cada vez mais intensa", disse, acrescentando que "a todos conviria melhor uma Angola de estabilidade".Foi na tentativa de ultrapassar a fase bélica que Adalberto Costa Júnior manifestou a esperança de Portugal voltar a ter, como em outras ocasiões no passado, um papel destacado no diálogo entre as autoridades angolanas e a UNITA.Há cinco dias, o Comité Permanente do partido de Savimbi afirmara que as sanções que lhe são impostas pela ONU "reflectem a arrogância e o racismo dos que pretendem escravizar os angolanos". E perguntava se o Conselho de Segurança estaria "à procura de bodes expiatórios da sua catastrófica actuação em Angola, acusando países e personalidades impolutas".Ontem, uma das personalidades mencionadas no "relatório Fowler", a economista Fátima Roque, consultada pelo PÚBLICO, considerou "inconcebível" que as Nações Unidas, sem a ouvirem, tenham dito que ela é, "alegadamente", quem controla os fundos da UNITA em Portugal. Recordou que desde 1997 se encontra expulsa do principal partido da oposição angolana e que, mesmo antes disso, as suas funções eram dar seminários e desenvolver uma actividade de "lobby" político, sem ter de mexer em dinheiro. Fátima Roque considerou ainda que, se a referência a si não é correcta, também o resto do relatório não lhe dá garantias de credibilidade: "Como é que uma organização como as Nações Unidas pode proceder de tal modo?", perguntou. O Estado angolano e a UNITA, acrescentou, vão ter de negociar, pois não há forma de o conflito ser resolvido pela força das armas. De outros países também surgiram fortes contestações ao relatório apresentado na segunda-feira no Conselho de Segurança. A França afirmou que ele é impreciso, vago em datas e carente de fontes quanto a algumas das suas alegações. O embaixador togolês nas Nações Unidas declarou que o grupo de peritos liderado por Fowler se baseou em "rumores" e em testemunhos de pessoas que desertaram da UNITA. E o Burkina Faso também desmentiu que o seu Presidente, Blaise Campaoré, esteja a dar cobertura a Savimbi, ajudando-o a vender diamantes para conseguir armas e combustível.A Bulgária, por seu turno, considerou infundadas e inaceitáveis as sugestões de que seria uma grande fonte de armamento para a UNITA, como se alega no trabalho, que, ao longo de toda a semana, tem vindo a ser alvo de todas as conversas na sede da ONU, em Nova Iorque.Apenas o Reino Unido apoiou abertamente as recomendações de Fowler no sentido de os países acusados de violarem as sanções à UNITA serem eles próprios castigados, de modo a acabar mais rapidamente com a guerra em Angola.