Portugal na família espacial
Só falta o Parlamento ratificar o contrato que, desde ontem, liga formalmente Portugal à Agência Espacial Europeia. Com esta adesão, está quase concluído o ciclo da ligação de Portugal às grandes organizações científicas europeias. As empresas portuguesas podem daqui tirar bastantes lucros, e não apenas monetários. Afinal, não é preciso lançar satélites para estar no negócio do aerospacial.
Quase ninguém passava ontem de manhã na rua parisiense Mario Nikis, uma via secundária onde fica a sede da Agência Espacial Europeia (ESA), excepto quem chegava para a cerimónia de adesão formal de Portugal como membro de pleno direito da agência. Dentro do edifício forrado a mosaicos brancos, José Mariano Gago, o ministro da Ciência e da Tecnologia português, e Antonio Rodotà, director-geral da ESA, rabiscaram as respectivas assinaturas nos documentos às 10h00 em ponto (hora de Lisboa).E pronto: ficou quase concluído um processo que levou anos. Agora falta apenas que a Assembleia da República ratifique o documento assinado pelo Governo português, o que deverá acontecer até Julho de 2000. Esta delonga foi sublinhada pelo próprio Rodotà, no discurso de boas vindas ao décimo quinto país da ESA, ao referir a cronologia de contactos entre os dois parceiros. "Os contactos entre a ESA e Portugal datam dos anos 70, quando a Agência foi criada." Finalmente, em Julho de 1996, foi assinado um acordo de cooperação - mais de dez anos depois do pedido formal de adesão do Governo português -, o que tem permitido a participação de Portugal em programas opcionais da agência. É o caso do Global Navigation Satellite System (GNSS) - um projecto que pretende desenvolver um serviço europeu de navegação por satélite (aeronáutica, marítima e terrestre). Onze empresas e laboratórios portugueses foram já pré-seleccionados para o GNSS. O pedido formal de entrada de Portugal neste clube do espaço chegou à ESA em Outubro de 1998. "A partir de agora, a bandeira portuguesa irá voar ao lado das dos outros 14 membros da agência", declarou Rodotà, que referiu duas razões por que a entrada na ESA é importante. A primeira é que os cientistas e as empresas portugueses passam a poder concorrer e participar nos programas da agência. Além disso, adiantou, "a participação em projectos espaciais aumenta a competitividade das indústrias". Pela sua parte, Mariano Gago pôs a tónica na entrada da ciência portuguesa em grandes instituições de investigação internacionais. "Consideramos que o desenvolvimento científico e tecnológico de Portugal deve ter uma forte tendência de internacionalização. Isso é importante para qualquer país, pequeno ou grande, porque os desafios, em termos de ciência e tecnologia, são tremendos. Ao enfrentar estes desafios, todos os países são pequenos." No caso concreto da ESA, o ministro diz que as prioridades nacionais para o espaço se centram nas áreas das tecnologias de informação, telecomunicações, navegação e observação da Terra. Como exemplo dessas prioridades, Portugal quer entrar no programa Galileu,uma constelação de pelo menos 21 satélites europeus de posicionamento geográfico. "Este programa está a atrair tanto interesse que, neste momento, até já está sobrefinanciado."Mas por que razão demorou tanto a entrada de Portugal na ESA? Mariano Gago contornou assim a questão de um jornalista estrangeiro: "É uma boa pergunta para os historiadores". De facto, o ministro esteve neste mesmo edifício na Rua Mario Nikis em 1985, na altura como presidente da Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica, na companhia de Jaime Gama, então, tal como agora, ministro dos Negócios Estrangeiros.Alain Bensoussan, presidente do Conselho da ESA, fez questão de dizer que contará a partir de agora com o apoio de Portugal para a definição de uma política espacial comum, que será proposta ao Conselho da Agência no ano 2000. No caso do futuro programa espacial português, um grupo de trabalho com representantes de vários ministérios elaborou um livro branco sobre as ciências e tecnologias do espaço, que está em consulta pública até Janeiro de 2000. A partir dessa data, o Governo deverá definir e aprovar um plano de acção para as ciências e tecnologias do espaço - onde se incluirá uma estrutura de gestão desse programa, que será uma espécie de agência espacial portuguesa. Antes de Portugal, o último país a juntar-se à família da ESA, como lhe chama Rodotà, foi a Finlândia, há quase cinco anos.Na lista de espera encontram-se agora pelo menos quatro outros países: Polónia, Hungria, República Checa e Roménia. Mas tanto Rodotà como Bensoussan concluíram os seus discursos esforçando-se para dizer uma graça em português: "Benvindô à Agência Espacial Eurropeia". Na assistência,uma sala sem cadeiras e apenas uma pequena mesa com as bandeirinhas de Portugal e da ESA, encontravam-se pelo menos quatro dos sete jovens engenheiros portugueses que estagiam em centros da ESA. Um deles, António Araújo, estagia no European Space Research and Technology Center (Estec) na Holanda, e testa materiais não-metálicos que serão utilizados na futura Estação Espacial Internacional, para saber como se comportarão no espaço. Clóvis de Matos, que também está na Holanda, é coordenador de um programa de divulgação científica na área da física, ciências espaciais e astronomia, chamado "Physics on stage" (Física no Palco). A ideia é realizar, em Novembro do ano 2000, uma grande conferência que reúna 300 professores de física de 22 países, ministros da Educação e laureados com o Prémio Nobel. O objectivo é elaborar materiais para o ensino da física de uma forma atraente e simples.