O medo invade Moscovo
A psicose de atentados em larga escala apoderou-de de Moscovo. Mais uma bomba de grande potência colocada num bloco de apartamentos voltou a semear a destruição e provocou mais de 50 mortos. A "pista islâmica" continua a ser privilegiada pelas autoridades. Mas não se excluem outros cenários, a poucas semanas das legislativas.
Cinco dias após o mortífero atentado contra um edifício dos subúrbios de Moscovo, a capital da Rússia foi de novo abalada na madrugada de ontem por outra violenta explosão num bloco de apartamentos que voltou a deixar um rasto de morte e destruição. No final da tarde de ontem os bombeiros avançavam com o último balanço provisório deste novo ataque bombista que destruiu totalmente um prédio de oito pisos: pelo menos 55 mortos, incluindo seis crianças, num total de 142 pessoas que o habitavam. Perto de 30 inquilinos não se encontravam no local na altura da explosão. Um porta-voz do ministério das Situações de Urgência indicou ainda que quatro a seis pessoas sobreviveram à deflagração e foram hospitalizadas. Este novo ataque, que contribuiu para aumentar a verdadeira psicose de atentados na capital da Rússia, foi muito semelhante ao registado na passada quinta-feira num edifício de nove andares nos subúrbios de Moscovo e que provocou 92 mortos. A bomba explodiu ao início da manhã, quando a maioria das pessoas ainda se encontrava a dormir, e as equipas de socorro mantinham muito poucas esperanças de encontrar mais sobreviventes entre os escombros. Partes do edifício foram projectadas a mais de cem metros de distância, árvores foram arrancadas, e responsáveis pelas forças de segurança evacuaram durante a manhã uma escola próxima após um segundo alerta de bomba. Confrontados com uma vaga de atentados sem precedentes, as autoridades do Kremlin apressaram-se a reagir. O Presidente Boris Ieltsin convocou de imediato uma reunião de emergência com os seus principais ministros, onde também compareceu o chefe da edilidade de Moscovo, Iuri Lujkov, e ordenou o reforço das actuais medidas de segurança em toda a Federação. Ao dirigir-se ao país através da televisão, o líder do Kremlin apelou à calma e prometeu que os responsáveis por estes ataques não ficarão impunes. A Igreja ortodoxa também pediu aos moscovitas para "reforçarem as fileiras e impedirem novas acções do mal". Muito pressionadas, os responsáveis do Kremlin acabaram por anunciar no início da noite de ontem a "identificação e detenção" de diversos suspeitos, que poderão estar relacionados com a recente vaga de atentados. A nível externo, o Governo francês condenou "firmemente" o atentado e exprimiu a sua solidariedade "no combate contra o terrorismo". O secretário da Defesa dos Estados Unidos, William Cohen, que se encontra em Moscovo para discutir a questão do controlo de armamentos e outras questões, também exortou para o reforço da cooperação conjunta entre os dois países no combate ao terrorismo. Este atentado fez aumentar as suspeitas sobre o início de uma campanha terrorista planificada e em larga escala, que terá por alvo a grande metrópole de mais de 10 milhões de habitantes, onde as condições para garantir a segurança total constituem uma tarefa quase impossível para a polícia. Na tarde de ontem, em diversos círculos políticos admitia-se a hipótese de declarar o estado de emergência, mas obstruções legais e uma forte oposição de diversos líderes políticos podem comprometer a iniciativa. Em Auckland, o primeiro-ministro russo Vladimir Putin, visivelmente agastado, condenou veementemente o ataque, enquanto o ministro do Interior, Vladimir Ruchailo, acusava directamente os chefes da rebelião islamista no Daguestão pelos atentados que em cinco dias provocaram pelo menos 147 mortos civis. Ao citar fontes policiais, a agência Interfax revelou a descoberta de 43 sacos com uma substância explosiva na cave de um prédio não longe do bairro onde ocorreu o atentado de ontem. Para além da "pista islâmica", relacionada segundo as autoridades com a actual situação de guerra na república caucaseana do Daguestão, diversos analistas também apontam noutras direcções. A começar pelos bandos mafiosos na Rússia, cada vez mais sofisticados e que nos últimos anos não têm hesitado em aniquilar os seus inimigos através de inúmeros atentados com carros armadilhados. Grupos extremistas russos também são considerados suspeitos de fomentar uma série de actos de terror, incluindo a recente destruição à bomba de uma estátua de Nicolau II, o último czar, e o ainda não esclarecido assassínio em São Petersburgo da popular política liberal Galina Starovoitova. Uma tese ainda mais ousada sugere que esta vaga de actos criminosos se destina a desacreditar Lujkov - o poderoso presidente da câmara municipal da capital, rival político de Ieltsin e cujo partido surge em posição de destaques nas sondagens para as legislativas de Dezembro -, e fornecer um pretexto para o adiamento das eleições. Diversos sectores da oposição intensificaram ontem as suas críticas face à "ausência de estratégia" do Governo, com destaque para o chefe do Partido Comunista, Geenadi Ziuganov, e para o também popular ex-primeiro-ministro Evgueni Primakov, ambos contrários à declaração do estado de emergência. Primakov não deixou mesmo de insinuar que a eventual aplicação desta medida "poderá ser utilizada por diversos poderes com objectivos políticos". Contudo, a "pista islâmica" proveniente da república independentista caucasiana da Tchetchénia - considerada em Moscovo o epicentro da desestabilização da Rússia - permanece a principal hipótese. Alguns milhares de combatentes islâmicos provenientes da Tchetchénia prosseguiram ontem os combates com as forças russas no Daguestão, enquanto a aviação russa continua a flagelar diversas povoações fronteiriças em território tchetcheno, onde os rebeldes possuem as suas bases recuadas. Um porta-voz do Presidente da Tchechénia garantia ontem em Grozni que a sua república não está implicada em qualquer dos atentados que abalaram Moscovo, enquanto um responsável dos islamistas da vizinha república do Daguestão e "chefe de Governo" da autoproclamada "República islâmica do Daguestão" também condenava as mortíferas explosões em Moscovo. No entanto, o chefe de guerra tchetcneho Chamil Bassaiev ameaçou há uma semana desencadear represálias devido aos ataques aéreos russos contra povoações da Tchetchénia.