Pedro Bacelar reafirma acusação de "racismo e xenofobia"
O governador civil de Braga, Pedro Bacelar de Vasconcelos, reafirmou ontem que a atitude dos 17 habitantes de Cervães que o tentaram agredir quando, em Agosto de 1996, pretendeu alojar a família do líder cigano João Garcia naquela freguesia do concelho de Vila Verde, teve um cariz "racista e xenófobo". Em declarações prestadas durante a primeira sessão do julgamento - que decorre no Tribunal de Círculo de Braga, reunido para o efeito em Vila Verde -, Bacelar deixou claro, no entanto, que este rótulo é válido apenas para a referida atitude e não para a população em geral, que considera ordeira como tantas outras.Os arguidos - que entretanto foram reduzidos para 16, pois um deles foi declarado inimputável - estão acusados dos crimes de coacção, injúrias e tentativa de agressão agravada. Os acontecimentos que deram origem à acção do governador civil tiveram lugar durante as três horas e meia em que Bacelar esteve na sede da Junta de Freguesia a tentar negociar o realojamento da família de Garcia no patronato do Frei Gil, uma quinta desactivada que serviria, assim, de primeiro abrigo ao clã depois de a Câmara de Vila Verde lhe ter demolido o acampamento. O governador, como ontem referiu, sentiu-se, durante esse período de tempo, vítima de coacção por parte dos manifestantes. Pedro Bacelar disse também que, quando se encontrava na sede da junta, tentou deslocar-se ao automóvel para recolher o seu telemóvel, mas foi aconselhado pela GNR a não o fazer, alegadamente porque a população que se encontrava no exterior, e que integrava os arguidos, "estava enfurecida". O governador considerou ainda que fora coagido, pela atitude dos populares, a decidir-se pela não instalação da família cigana na freguesia.Recordou também uma tentativa de assalto à varanda da junta e o lançamento de pedras enquanto se encontrava no edifício, mas os factos mais graves ocorreram, segundo disse, quando abandonou a junta. Tê-lo-á feito sob "ameaças, arremesso de pedras, garrafas de plástico com água e tentativas de agressão", disse Bacelar ao tribunal. "Só por grande sorte minha nada me aconteceu", acrescentou.Um momento importante da primeira sessão do julgamento foi quando o juiz pediu a Bacelar para tentar identificar os arguidos. O governador disse que se recordava de "algumas faces", mas não quis apontar o dedo por entender que não o devia fazer. O magistrado recordou-lhe que estava num tribunal e ele acabou por identificar dois dos arguidos que integraram o grupo de quatro que, recentemente, lhe foram pedir desculpa a Braga. Aliás, os únicos a quem retirou o pedido de indemnização cível. Aos restantes, mantém-no, por não terem tido a mesma atitude.Ainda na opinião de Pedro Bacelar, a sua estada forçada dentro da sede da junta foi "um acto organizado". Reconheceu que nenhum dos alegados organizadores estava sentado no banco dos réus, mas pensa que "houve de facto uma mobilização", porque tal era perceptível pelas palavras de ordem que proferiam em conjunto e pela forma como reagiam em comum. Uma mobilização que, em sua opinião, foi um apelo à coacção, para que não saísse do edifício sem que se comprometesse a não realojar a comunidade cigana de Oleiros na aldeia.João Lobo, o advogado de defesa, fez um requerimento prévio para protestar contra a comunicação social, à qual atribuiu a responsabilidade de ter feito um julgamento antecipado da população. E também para questionar Bacelar sobre o porquê de não ter colocado mais forças de segurança no terreno para evitar o conflito. O governador respondeu-lhe que nunca lhe passara pela cabeça que os habitantes de Cervães iriam ter tal reacção, já que se tratava apenas de dar alojamento, provisoriamente, a uma família com muitas crianças. Os arguidos recusaram-se a falar na sessão de ontem.