O fim das cauções de electricidade, gás e água
A exigência de caução nos serviços públicos essenciais tem os dias contados. Os fornecedores de electricidade, gás e água, vão deixar de poder exigi-la nos novos contratos. Além disso, têm de devolver aos consumidores individuais todos os montantes cobrados ao longo dos anos. Números redondos, são mais de 25 de milhões de contos.
Os fornecedores de serviços públicos essenciais ficam proibidos de exigir caução aos consumidores, estabelece um diploma aprovado esta semana pelo Conselho de Ministros, que o PÚBLICO divulga em primeira mão.A iniciativa partiu de José Sócrates, ministro Adjunto do primeiro ministro e responsável pela defesa do consumidor, inserida num "pacote" de medidas que serão apresentadas hoje publicamente no âmbito das comemorações do Dia Mundial dos Direitos do Consumidor, que se celebra na próxima segunda-feira.Graças a esta medida, põe-se fim a uma tradição de décadas que consistia na exigência de caução na assinatura de cada contrato fornecimento de electricidade, gás ou água. Como essa verba nunca era utilizada pelas empresas quando os consumidores deixavam de pagar as facturas, o dinheiro acabava por ser uma forma de financiamento indirecto das empresas. É com essa situação que Sócrates decidiu acabar, reforçando ainda mais os direitos dos consumidores dos serviços públicos essenciais.A lei estabelece, por outro lado, que os fornecedores só podem exigir a prestação de caução quando o serviço for restabelecido na sequência de um corte por não pagamento. O valor e a forma de cálculo serão fixados pelas entidades reguladoras dos diferentes serviços públicos essenciais no prazo de 60 dias após a entrada em vigor da lei. Não existindo essa entidade - é o caso, hoje, da água - aquela competência passa para as "entidades públicas responsáveis pela supervisão ou controlo dos respectivos sectores de actividade".A caução passa a ter uma finalidade precisa: satisfazer apenas os valores em dívida pelo consumidor. No entanto, se ela for usada, o serviço já não pode ser interrompido pelo fornecedor, mesmo se o montante da caução for insuficiente para pagar a dívida. Uma vez utilizada, o fornecedor pode exigir a reconstituição ou reforço daquela verba num prazo não inferior a 10 dias úteis.Quando o contrato chega ao fim, a caução é restituída ao consumidor, deduzida dos montantes eventualmente em dívida. Esta quantia varia consoante a potência do contador e pode oscilar entre 5300$00 (15 amperes, monofásico) e 32600$00 (contador de 30 amperes, trifásico). Será "actualizada em relação à data da sua última alteração, com base no índice anual de preços ao consumidor".O diploma, que entra em vigor 90 dias após a publicação em "Diário da República", soluciona também o problema das cauções anteriores. Assim, estabelece que elas terão de ser devolvidas aos consumidores ou seus descendentes - esta disposição visa, em especial, as situações de contratos que passam de pais para filhos numa mesma habitação -, de acordo com um plano a elaborar pelas entidades reguladoras de cada sector ou por quem tutele o serviço, nos 60 dias seguintes à entrada em vigor da lei. Quanto às empresas fornecedoras dos serviços, terão um ano para proceder à devolução das cauções.Esta iniciativa legislativa acaba, na prática, por tornar extensivo a todos os serviços públicos essenciais o que já estava decidido para o sector eléctrico desde o Verão passado. Nessa altura, a Entidade Reguladora do Sector Eléctrico (ERSE) decidiu, contra o parecer do Conselho Tarifário mas apoiando a posição do Instituto do Consumidor e da Fenacoop, acabar com as cauções. O grupo EDP tem um ano, que termina em Julho próximo, para proceder à sua devolução aos quase cinco milhões de consumidores individuais existentes em Portugal.No que diz respeito ao gás, esta medida é sobretudo preventiva, visando impedir as empresas distribuidoras de cobrar cauções nos contratos a celebrar para o fornecimento de gás natural.Para o sector da água, não há números precisos, estimando-se que esta medida abranja à volta de um milhão e meio de consumidores em todo o país. O PÚBLICO conseguiu apurar, por outro lado, que as cauções antigas a devolver importam no pagamento de mais de 25 milhões de contos, dos quais 15 só com os contratos de electricidade.