Viver e morrer em Nova Iorque
É a primeira longa-metragem de um realizador português que vive em Manhattan: Bruno de Almeida, 34 anos. E Nova Iorque é o cenário para uma noite absurda, uma comédia negra fora de horas que começa com o telefonema de um amigo a outro. Louie fugiu da prisão e telefona a Albert. Quer ajuda. Pobre Albert!
Albert de Santis (Michael Imperioli) é um tímido e pouco sociável agente de viagens que um dia recebe um telefonema de um amigo de infância, Louie Salazar (John Ventimiglia). Louie fugiu da prisão e precisa de ajuda. O que se segue é uma noite intensa, uma Nova Iorque fora de horas e absurda."Em Fuga" é a primeira longa-metragem de Bruno de Almeida, um português em Nova Iorque. Não é por acaso que Albert vive na Rua 96, ou que há uma perseguição na Riverside Highway, ou que a casa de uma amiga de Louie é em "downtown". São pontos importantes da história de Bruno de Almeida na cidade. Mas "Em Fuga" não é um filme sobre Nova Iorque, diz ele nesta entrevista. É um filme sobre relações. A de dois amigos, no filme; e a dos actores e do realizador, fora do filme - uma coisa "quase filosófica. "Houve uma emoção", diz o realizador.Bruno de Almeida, 34 anos, vive em Manhattan desde 1985, para onde se mudou para ser músico. O cinema veio depois. Hoje já não compõe nem toca guitarra e são os filmes, uma colecção de mais de mil, que dominam a sua metade de um "loft" na zona de TriBeCa.BRUNO DE ALMEIDA - Em 1993, tive a ideia de fazer um filme sobre duas personagens, mas não tinha cidade nem história. Era sobre um introvertido e um extrovertido. Nessa altura, o Fernando Lopes [realizador] disse-me que havia um filme do Dino Risi exactamente com essa relação, o que acabou por me inspirar. Depois, convidaram-me para fazer um filme para Lx 94, um projecto com três histórias sobre Lisboa, sobre a manhã, a tarde, e eu faria a noite.Não aconteceu, mas cheguei a escrever a história de um homem de negócios americano que chegava a Lisboa para uma conferência, entrava num táxi, dava a morada do hotel mas nunca lá chegava. Era um homem deprimido e introvertido, que no fim ganhava um sentido de viver fortíssimo. Acabava com um desastre de automóvel.São solitários e precisam um do outro. Isso é o tema do filme.Podia ser Nova Iorque ou outra cidade, Lisboa, Paris. Nova Iorque é apenas um cenário. Se tivesse sido em Lisboa, teria sido filmado no Bairro Alto ou em Alfama. Não é tanto a cidade, é mais a ideia de cidade.Contei-lhe a história do filme, passado dois dias ele veio para Nova Iorque, deixou de dar aulas e ficou a escrever o argumento. Foi em 1994. Tem um humor negro que é único; para mim é o melhor escritor americano neste estilo. Os diálogos são muito bons, estão entre o realismo e o absurdo, coisa que não tenho visto e que gosto de fazer.Em 1996, quando tivemos dinheiro, o Tino Navarro disse-me para começar a fazer o "casting" e foi então que conheci o John [Ventimiglia]. Vi 150 actores e, no último dia, o John apareceu e gostei dele imediatamente. Ofereci-lhe o papel, ele ficou contente mas disse que gostava de saber quem é que ia fazer a outra personagem. Disse-lhe que tinha escrito o papel a pensar no Michael. "O Michael é o meu melhor amigo, conhecemo-nos desde crianças", disse o John. Eles encontraram-se nessa tarde, leram o argumento e o "casting" ficou feito.Para mim, o Michael é o melhor actor desta geração. Mas é mais uma referência física e de personalidade. Como o dinheiro não apareceu, começámos a ensaiar e a reescrever e desenvolveu-se uma amizade entre os três, uma relação de confiança. Eu disse: "Temos um ano, vamos abrir o argumento", e começámos a analisar pequenas coisas.O John perguntava: "Porque é que ele foge da prisão?" E eu respondia: "Tens que ser tu a perceber, mas eu não quero saber a razão, interessa-me filmar aquilo que tu achas que é a razão." Um dia telefonou-me às cinco da manhã a dizer: "Encontrei a razão."