Morreu o baterista Milford Graves, pioneiro do free jazz
O norte-americano foi fulcral para “libertar a percussão no jazz do seu papel metronómico de simplesmente manter o compasso” e ganhou notoriedade pelo seu estilo complexo, misturando várias linguagens musicais. Tinha 79 anos.
Colaborou com um sem-fim de nomes maiores do jazz — como o pianista Chick Corea, que morreu esta semana, os saxofonistas John Zorn, Anthony Braxton e Albert Ayler ou o lendário Sun Ra, para citar apenas alguns —, mas não se dedicou apenas à música ao longo das suas quase oito décadas de vida, tendo também sido acupuncturista, ervanário, perito em artes marciais, programador e professor. O percussionista Milford Graves, referência do free jazz norte-americano, morreu esta sexta-feira em Nova Iorque, aos 79 anos. O artista havia sido diagnosticado em 2018 com amiloidose cardíaca, uma doença cardiológica rara.
Milford notabilizou-se no New York Art Quartet, conjunto que formou em 1964 com o saxofonista John Tchicai, o trombonista Roswell Rudd e o contrabaixista Lewis Worrell. Ao longo da carreira, trabalharia também com o pianista Don Pullen, o baterista Andrew Cyrille, o saxofonista David Murray ou o guitarrista Sonny Sharrock, por exemplo. “Conhecido por misturar influências de todos os cantos do mundo, o baterista tornou-se um mestre dos polirritmos africanos e estudou ainda a tabla [instrumento de percussão da Índia] e os timbales do jazz latino”, lembra Matthew Ismael Ruiz, da Pitchfork, num obituário onde salienta ainda que Graves “ajudou a libertar a percussão no jazz do seu papel metronómico de simplesmente manter o compasso”.
A vida e os pensamentos deste pioneiro da música avant-garde seriam retratados no documentário Milford Graves Full Mantis, que o músico Jake Meginsky e o artista visual Neil Young (não confundir com o cantautor canadiano) lançaram em 2018 e que chegou a ser exibido no IndieLisboa. Também em 2018, foi alvo de um extenso perfil na revista The Wire, escrito pelo guitarrista e compositor americano Alan Licht. A peça acabava com “uma espécie de declaração de intenções”, recorda Rui Miguel Abreu, da revista digital Rimas & Batidas, sublinhando que “Milford Graves acreditava que podia mudar o papel do baterista na música, fazendo-o equivaler ao dos restantes músicos e colocando-o no mesmo patamar que qualquer outro solista”.