Cristina e Fernanda levam António para a cozinha e sai uma cataplana
O primeiro-ministro foi ao programa da apresentadora da SIC fazer o almoço e mostrar que tem “uma família normal”. Aproveitou para dizer que os donativos da polémica em Pedrógão não são responsabilidade do Governo.
Quando António Costa tocou à porta da casa d' O Programa da Cristina, da SIC, já toda a gente sabia quem lá vinha e o que o esperava. A apresentadora e a esposa, Fernanda Tadeu, já tinham anunciado que iam colocar o primeiro-ministro na cozinha, um dos lugares de eleição dos políticos neste programa. Depois do arroz de atum de Assunção Cristas, o que faria o chefe do executivo? O político “hábil”, como lhe chamou Cristina Ferreira, juntou peixes diferentes, além das batatas, do tomate e da cebola, do azeite, do alho e dos coentros, e fez uma cataplana. A sua especialidade actual, garantiu Fernanda. E a família veio toda para almoçar.
Cristina Ferreira justificou-se do princípio ao fim, mas sem problemas em reconhecer que ajudava à campanha eleitoral. Antes de Costa chegar, considerou que temos “o dever de conhecer quem nos dirige para podermos escolher depois em quem devemos votar” e agradeceu aos políticos por aceitarem que aquele “é um espaço de comunicação em que podem mostrar quem são”. No fim do programa, insistiu na importância de mostrar a condição humana dos políticos: “Achamos que estas pessoas não têm uma vida normal”.
O oráculo anunciava “o homem por detrás do primeiro-ministro” enquanto António Costa falava da sua “infância feliz”, do que significou para ele ser filho de pais separados, no “grande sentido de autoridade” da mãe e no “factor de libertação” que representou, mais tarde, a entrada do padrasto na sua vida. Lembrou também as muitas reguadas que apanhou na escola, grande parte delas por causa do “sorriso muito irritante” que reconhece ter. Cristina Ferreira foi solidária: “Dê cá mais cinco, porque eu também tenho um riso irritante que é mal compreendido”.
A campainha toca e aparece Fernanda Tadeu com um cesto de legumes para a caldeirada, mas desde logo avisa que não é ela que vai cozinhar, porque “ele cozinha melhor”. Já de avental posto, enquanto descasca a cebolas, António vai respondendo a perguntas pessoais, a meias com a mulher, sobre como a sua amizade de liceu só chegou a namoro na faculdade e acabou em casamento singelo, no registo civil com a família, seguido de um almoço de hambúrgueres, há 32 anos.
Não foi um pesadelo na cozinha, mas Costa reconheceu que falar de amor é um problema – “não quer antes falar do défice?” – e passou para artigo 221.º do Orçamento do Estado, no qual está previsto comparticipar os sucedâneos do leite para alérgicos e intolerantes à lactose. O primeiro-ministro é sensível ao tema, até porque a filha, Catarina, tem uma intolerância desde pequenina… Mas ao menos não é enfermeira, comenta Cristina, depois de constatar que o seu convidado devia ter uma vida difícil, com uma mulher professora. “Toda a gente se queixa, lá em casa”, reconheceu António Costa, com um sorriso conformado, enquanto acaba de colocar os legumes na cataplana.
Tocam à campainha e chega o resto da família – além de Catarina, o filho Pedro e a nora, Sara, também vieram para almoçar. O primeiro-ministro abre o frigorífico para tirar o peixe e Cristina Ferreira exalta o facto, ter um primeiro-ministro a fazer gestos tão quotidianos pode ser emocionante – embora não para a família, que está habituada a isto “desde sempre”, como dizem os filhos e a nora. Mas o problema de Costa era explicar à sua peixeira, a dona Teresa do Mercado de Alvalade, em Lisboa, que não a tinha traído na compra do peixe, pois não sabia antecipadamente do que o esperava…
A apresentadora quis então saber se o primeiro-ministro já tinha pensado na sua vida “para além disto”, mas Costa recusou falar do futuro político: “Isto não dá tempo de pensar noutras coisas”. Mas Cristina também pôs o dedo na ferida quando lhe perguntou sobre Pedrógão, “a mancha negra destes anos”. “Espero que não haja outros”, respondeu Costa, adjectivando como “coisa horrível” e “marcante” os incêndios de Junho e Outubro de 2017.
Mas em Pedrógão há mais a lamentar, e a apresentadora queria falar da polémica das ajudas por distribuir nas zonas afectadas pelos incêndios. Oportunidade de ouro para o primeiro-ministro se justificar, enquanto ia dispondo a raia e o cação na cataplana: “Os portugueses foram muito generosos e deram de forma muito espontânea, mas também muito desorganizada. Os donativos que foram para o Estado estão todos auditados e esclarecidos. O que não está esclarecido foram os donativos dados aos privados ou aos municípios, que têm outros mecanismos de controlo”. Mas a caldeirada precisa de algo mais e o assunto é atalhado: “Tem um bocadinho de vinho branco?”
No final, Cristina enaltece a “família normal” de António Costa e Fernanda Tadeu acrescenta: “Normal e unida”. Já só faltam netos.