Herman José: “Ter piada em 15 segundos é fascinante”

O humorista e apresentador esteve na Lisboa Games Week para se voltar a mostrar como apresentador de um concurso — num videojogo. Do Instagram às consolas, retira do público jovem um alívio da “tristeza de assistir à passagem do tempo”.

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Na Lisboa Games Week, durante a apresentação "jogável" do quiz DR

Herman José esteve a jogar PlayStation. Está bem-disposto mas ligeiramente frustrado. “Mais valia não ter nascido!”, brinca sobre os novos truques que não domina do jogo de quiz Saber É Poder: Gerações, do qual é anfitrião pela segunda vez para o gigante das consolas. Depois da sua apresentação na Lisboa Games Week, fala ao PÚBLICO de como o jogo o devolve ao passado dos concursos e de como o Instagram é parte importantíssima do seu presente — ambos criaram novos públicos. Acumula esses novos fãs com os que o vêem na RTP, e admite: “Isso alivia-me imenso a inevitável tristeza de assistir à passagem do tempo e de estar a viver o terceiro acto da minha vida.”

Para 2019 prepara “um grande espectáculo em Lisboa, acompanhado da regravação de algumas músicas e com algumas novas”. Herman José está num evento a transbordar de miúdos, mas tem sempre em pano de fundo o envelhecimento — de um humorista, do verdadeiro artista. Falamos de Madonna, do Instagram e do prazer de depurar piadas ao segundo.

Voltar a este papel, numa consola, é exercitar o músculo de apresentador de concursos de A Roda da Sorte (1990-94) ou Com a Verdade me Enganas (1994-95)?
Está a repetir na RTP Memória o Com a Verdade me Enganas e às vezes dou por mim a olhar para aquilo e a ter uma inveja daquele tempo, e daquele tipo que ali está. Com 40 anos, on top of the world, sem problemas de nenhuma espécie, felicíssimo, montado naquela dinâmica de sucesso, de felicidade, de juventude. Estes acontecimentos, neste mundo colorido dos videojogos, essa deliciosa inconsciência das pessoas novas, devolvem-me um bocadinho a esse tempo.

Tem saudades de ser mais feliz?
Não é uma saudade bacoca, é uma saudade saborosa porque ainda estamos vivos, de saúde. O que mais me espanta é ter dos miúdos e miúdas de 15, 16, 17, 18 anos o mesmo olhar de admiração incondicional — porque a juventude tem essa coisa, gostamos porque gostamos — e isso faz-me sentir tão útil. Hoje, também muito graças ao Instagram e ao YouTube, tenho os espectáculos cheios de pessoas novas. Que riem das coisas certas. As pessoas são muito mais informadas do que há 20 ou 30 anos. Isso alivia-me imenso a inevitável tristeza de assistir à passagem do tempo e de estar a viver o terceiro acto da minha vida.

No Com a Verdade me Enganas já tinha as suas “Porcazinhas”, um grupo de jovens no público que o acompanhava. Estar nas consolas, e no Instagram, como tem feito de forma militante, foi estratégico da sua parte para encontrar novos públicos?
Não tem verdadeiramente nada de estratégico. Há uma coisa que acontece muito, sobretudo com os humoristas: o processo interior de envelhecimento é muitas vezes retardado porque se está a lidar com material que não envelhece. Por dentro temos sempre a mesma idade. Quando estou a fazer disparates para fazer os outros rir, tenho a mesma idade quando na escola fazia disparates para fazer rir os professores. Essa criança interior estava sempre lá. Quando se tem essa característica, a parte intelectual e interior está sempre fresca. Em Portugal houve imensos exemplos desses, como o do locutor Fernando Pessa. Isso ajuda-nos a combater as inevitáveis chatices que a passagem do tempo traz.

Por que é que foi no Instagram, e não antes no Facebook, que começou esta nova faceta do seu humor?
O Facebook é uma coisa muito séria. As pessoas precisam de discutir coisas muito importantes, andam à procura do politicamente incorrecto. O Facebook é um bocadinho formal. O Instagram é de uma grande leveza. E é muito infantil. Os bonequinhos do SnapChat, os timings.

Isso obrigou-o a ajustar timings de comédia? Há décadas já fazia coisas curtas na rádio ou na TV.
Ter piada em 15 segundos é fascinante. Muito pouca gente sabe fazer. É um desafio giríssimo, mesmo estando a fazer televisão tenho de fazer o bypass do que estamos a fazer se quiser fazer uma instastory. Estivemos a gravar a [Maria] Rueff a fazer de Cinha Jardim e eu a fazer de Lili [Caneças]. Numa instastory só temos tempo para três frases. A Lili diz: “Estive noutro dia com o ministro das Finanças e disse-lhe que estar rico é o contrário de estar pobre.” Diz a Cinha: “Mas isso não é de La Palice?” “Não, querida, isto é João Rolo.” Em três frases o sketch está feito. A maior parte dos miúdos também não tem mais pachorra para além dos 15 segundos. É muito engraçado porque é quase como uma disciplina, uma escola.

Na verdade não tive de me adaptar muito. Sempre tive a mania dos timings. O Tal Canal é um programa com 35 anos e tem um timing mais rápido do que a maior parte dos programas de humor feitos hoje.

Tem uma equipa a trabalhar nas suas redes sociais?
Sou eu. Noutro dia, o Tony Carreira fez-me o maior elogio involuntário, queria convidar a minha equipa a trabalhar com ele. Tenho uma ajuda na página oficial do Face, que está muito ligada à contratação de espectáculos, mas o resto sou eu que faço a gestão. É o meu passatempo.

Quando se meteu com a Madonna e com as suas raízes do cabelo no Instagram, por exemplo, isso teve muito eco — alguma vez obtém respostas dos visados nas redes sociais?
A Madonna não dá confiança a ninguém. Acho que ela até faz gala em não comunicar com ninguém em Portugal, tirando as pessoas que a servem, ou porque vai alugar cavalos, ou músicos... É horrível de dizer, mas ela não sente Portugal como país verdadeiramente, é como um sítio muito giro onde está. Como os miúdos que vão para Lloret de Mar, Portugal está para a Madonna como Lloret de Mar está para os putos. Isso chateia-me imenso. Mas tenho tido reacções muito giras de outras figuras, como o grande cantor alemão Max Raabe ou uma ou outra figura que passou pelos meus programas, como a Joan Collins ou o Lionel Richie. Tenho tido umas surpresas agradáveis.

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