O que sabem os alunos sobre a greve dos professores? "Não faço a mínima"
Na Escola Secundária de Carcavelos há mais alunos nos recreios do que é habitual em tempo de aulas. Sabem que há professores em greve, mas desconhecem as razões que os levaram a esta acção.
"Não faço a mínima." A resposta de Francisca, aluna do 8.º ano da Escola Secundária de Carcavelos, concelho de Cascais, sai sem hesitações quando o PÚBLICO a questiona e às suas colegas sobre as razões pelas quais os professores estão nesta segunda-feira em greve.
Devido a isso, não tiveram a primeira aula da manhã e talvez não venham a ter outras. Cátia começa por dizer que é “por causa dos comboios de Portugal”, mas logo a seguir emenda: "Já sei! É a greve dos professores. Estive a ler uma cena sobre isso, tem a ver com qualquer coisa do passado."
Por não terem tido aulas, antes do intervalo grande da manhã, que começa às 10h20, são vários os grupos espalhados pelos recreios da secundária de Carcavelos, onde estudam alunos do 5.º ao 12.º ano de escolaridade. Os mais pequenos vão sendo encaminhados em grupos para a biblioteca.
“Não costuma ser assim porque os nossos horários são muito apertados”, esclarece o director, Adelino Calado, acrescentando que do total de 120 docentes, 15 estão em greve. Bem menos dos que aderiram no final do ano lectivo à greve às reuniões de avaliações dos alunos, que levou a que as notas de muitos anos de escolaridade só tivessem sido publicadas já quase no fim de Julho.
O primeiro balanço feito pela Federação Nacional de Professores (Fenprof) dava conta de que às 10h30 a adesão à greve rondava os 75%, segundo informou o líder desta estrutura sindical, Mário Nogueira.
Em declarações à Lusa no Largo Camões, em Lisboa, onde a Fenprof se concentrou para distribuir comunicados à população e aos turistas, Mário Nogueira afirmou que ainda pode haver alguma variação na percentagem da adesão à greve durante o turno da tarde. "Há muitas escolas fechadas, algumas delas secundárias, básicas e muitas escolas do 1.º ciclo e jardins-de-infância", disse o sindicalista. Nogueira explicou que estas escolas encerraram porque o número de professores que não fez greve era "muito residual" e não permitia o funcionamento dos estabelecimentos.
A secundária de Carcavelos é a escola sede do agrupamento de Carcavelos, que integra mais sete estabelecimentos de ensino: cinco do 1.º ciclo e dois jardins-de-infância. Ao contrário do que sucedeu de manhã em várias escolas de Lisboa, que fecharam portas, as do agrupamento de Carcavelos estão “todas abertas”, diz o director.
Adelino Calado não esconde que, como muitos dos seus professores, também está “zangado” com o modo como o Governo tem tratado os docentes a propósito da recuperação do tempo de serviço prestado durante o período de congelamento das carreiras. Os sindicatos de professores exigem que sejam contabilizados nove anos, quatro meses e dois dias, mas o Governo já anunciou que não irá além dos dois anos, nove meses e 18 dias.
O director de Carcavelos reparte, contudo, as culpas. “Tudo na vida se negoceia, mas neste processo têm existido dois teimosos: o Ministério da Educação e os sindicatos. E tudo isto perturba o estado de espírito dos professores."
Ana, que é professora há 40 anos, está a trabalhar. Participou na greve às avaliações do final do ano lectivo passado, mas desta vez optou por não parar. “É uma greve que está pré-agendada desde há meses [primeiro anúncio foi feito antes das férias de Verão], não faz qualquer sentido”, desabafa, para acrescentar que esta paralisação não os vai “levar a qualquer porto, já que esta é uma acção que tem sobretudo uma agenda política”.
“Não me revejo nesta greve”
Diz que, em teoria, se “sente injustiçada”, embora adiante que não lhe parece "razoável a insistência dos sindicatos na recuperação total do tempo de serviço”. “Devia estar em pé de igualdade com outras questões, como por exemplo a aposentação”, aponta.
Esta foi uma das propostas que os sindicatos apresentaram ao Governo. Mais concretamente, que o tempo de serviço congelado fosse abatido nos anos que faltam para a reforma se essa fosse a vontade dos professores. Não foi acolhida.
“Não me revejo nesta greve”, afirma Ricardo, professor de Educação Física. Quando questionado sobre as razões pelas quais está a trabalhar. E não se revê porquê? “Porque sou professor contratado, não tenho nada a ganhar e a questão da recuperação do tempo de serviço apenas se aplica aos docentes de carreira. E até só me iria prejudicar porque há apenas uma coisa onde podem cortar para suportarem mais despesa, que é nos contratados. Já me aconteceu antes."
No recreio, um grupo de alunos do 9.º ano já foi informado que, por causa da greve dos professores, só terão duas aulas nesta segunda-feira. Também não sabem as razões da greve. Os professores não vos explicaram? A resposta é unânime: “Não."
Este é o primeiro de quatro dias de greves regionais que culminarão na próxima sexta-feira numa manifestação nacional de professores, a terceira, desde Novembro de 2017, pela contabilização do tempo de serviço congelado.