Banca, segurança, economia - as reformas que João Lourenço tem que fazer
Alex Vines: o director do Programa para África do Chatham House faz o balanço do primeiro ano de mandato do Presidente angolano e alerta para o tanto que há a fazer. "Angola não pode confiar apenas no petróleo".
Alex Vines, especialista em Angola e que dirige o Programa para África do think- thank britânico Chatham House, vê melhorias no país com a presidência de João Lourenço, nomeadamente nas relações internacionais. Diz que a visita de António Costa a este país “representa uma normalização de uma relação que é importante para ambos os países”.
Porém, o analista tem ainda “algumas preocupações”, que são geradas por uma consolidação do poder de Lourenço. E garante que o Presidente angolano terá de se afastar da excessiva dependência em relação ao petróleo se pretende catapultar a economia.
Que efeitos tem a mudança de Presidente, que é quase uma mudança de regime, na economia angolana?
O primeiro ano de João Lourenço foi de transição política. Existiram algumas reformas mas existiam dois pólos de poder – um do anterior Presidente José Eduardo dos Santos, que era presidente do partido, e João Lourenço como chefe de Estado. Isso foi resolvido este mês no congresso do MPLA onde se fez uma reestruturação significativa do Bureau Político.
Creio que, nos próximos tempos, iremos assistir a um aumento das reformas sob a presidência de João Lourenço noutras partes da economia, não apenas na indústria do petróleo e da mineração.
João Lourenço está a redefinir as relações internacionais de Angola?
As relações internacionais de Angola melhoraram. Lourenço procurou retomar relações com antigos parceiros e procurar novos. As suas primeiras viagens foram muito bem-sucedidas. Por exemplo, na Europa, foi a França e vimos vários contratos-chave que as empresas francesas receberam e o papel da Total [petrolífera francesa] em alguns contratos relacionados com a importação e exportação de petróleo.
As antigas relações continuam importantes. Angola conseguiu recentemente garantir outro grande empréstimo da China. A China continua a ser muito estratégica para Angola, que recebeu empréstimos significativos ao longo da última década.
As relações com a Rússia e com o Brasil continuam importantes e esta visita do primeiro-ministro português, António Costa, significa uma melhoria nas relações com Portugal. Foi muito notório quando, no ano passado, no seu discurso de tomada de posse, o Presidente Lourenço não mencionou Portugal. Por isso, penso que esta viagem do primeiro-ministro representa uma normalização de uma relação que é importante para ambos os países.
A guerra à corrupção credibiliza Angola e pode servir para catapultar a sua economia?
João Lourenço, no seu discurso quando subiu à liderança do MPLA este mês, enfatizou outra vez a sua preocupação em relação à corrupção. E penso que a remodelação do Bureau Político, trazendo muitos membros jovens, representa um sinal significativo. Pessoas que eram relativamente próximas de José Eduardo dos Santos, tais como Manuel Vicente, já não fazem parte do bureau e isto é um sinal importante tendo em conta as alegações que rodearam Vicente na Justiça portuguesa e que foram agora postas sob jurisdição angolana.
É possível dizer que Angola é já um país diferente?
Está-se ainda na fase da política de transição. E tenho algumas preocupações. Ao longo do último ano vimos Lourenço a consolidar o seu poder. É ele agora quem controla o partido, o poder executivo, as Forças Armadas, os serviços de informação e é também o responsável por nomear os altos-cargos no sistema de Justiça. Isto pode ser preocupante. Por isso, a próxima questão é se as instituições serão autorizadas a gerir o que poderá vir a ser um poder imenso da presidência.
João Lourenço terá de se concentrar em quê no futuro?
Há duas coisas que Lourenço - que na próxima semana celebra o seu primeiro aniversário como chefe de Estado - conseguiu. Primeiro, ajudou a estabilizar a economia, particularmente a indústria do petróleo, ao convencer grupos internacionais que há um futuro no petróleo angolano, o que é muito estratégico tendo em conta o quão importante é ainda o petróleo para a economia angolana. Em segundo lugar, consolidou o poder e a sua ambição era ter controlo total sobre o MPLA e conseguiu-o. Mas no futuro, ele tem de avançar com outras reformas significativas. Tem de existir uma reforma bancária – há um relatório recente da Deloitte que se centrou no estado da banca angolana e concluiu que são necessárias reformas urgentes. E tem que fazer reformas no sector da segurança. Lourenço foi ministro da Defesa e Angola tem uma das maiores Forças Armadas em África, algo que Angola não pode sustentar no longo prazo. Por isso, a reforma militar tem de ser uma prioridade. Em terceiro lugar, tem que diversificar a economia angolana para além do petróleo. Agora que estabilizou a economia, ajudado um pouco pelo aumento dos preços do petróleo, penso que tem de olhar para formas de diversificar a economia e afastar-se da dependência do petróleo. Angola não pode confiar apenas no petróleo.