Governo revê em alta gastos com descongelamento das carreiras em 2019
Finanças vão gastar mais 152 milhões do que tinham previsto no Programa de Estabilidade enviado para Bruxelas . Sindicatos querem aumentos salariais, mas Governo responde que medidas em curso já pressupõem subida de 3,1%. Nova reunião marcada para 19 de Setembro.
O impacto do descongelamento das carreiras da função pública, em curso desde o início do ano, foi revisto pelo Governo e em 2019 a medida custará mais 152 milhões de euros do que estava previsto no Programa de Estabilidade (PE) enviado para Bruxelas. Ao todo, e de acordo com um comunicado do Ministério das Finanças, o descongelamento terá um impacto bruto de 542 milhões de euros nas despesas com pessoal no próximo ano, um número bem superior aos 389,8 milhões de euros estimados em Abril.
Os números foram apresentados nesta quarta-feira pelo Governo na primeira reunião com os sindicatos para iniciar a discussão do Orçamento do Estado (OE) para 2019. E vêm reforçar os argumentos do Ministério das Finanças, que considera que o descongelamento das carreiras e outras medidas sectoriais com efeito nos salários equivalem a um aumento do rendimento dos funcionários públicos.
Os dados trazem outra nuance: o custo das progressões e das promoções dos funcionários públicos em 2018 deverá ficar aquém do estimado no PE. Esta medida, em vez de implicar um acréscimo da despesa de 352,7 milhões, terá um impacto de 295 milhões (uma diferença de 57,7 milhões).
O PÚBLICO questionou o Ministério das Finanças sobre as razões que explicam a diferença entre os dados agora apresentados e os que foram incluídos no PE, mas não teve resposta em tempo útil.
É, contudo, possível antecipar algumas explicações. Relativamente a 2018, o impacto nas despesas com pessoal poderá ser menor devido aos atrasos no processo de descongelamento das carreiras. Os números de Junho davam conta de 344 mil trabalhadores da administração e das empresas públicas que viram o seu salário aumentar por causa do descongelamento, sem dizer quantos estão ainda à espera. Porém, o próprio ministro das Finanças assumiu, em entrevista ao PÚBLICO, atrasos.
Já em relação a 2019, o aumento da despesa poderá estar relacionada com o facto de os números apresentado aos sindicatos já incluir o ciclo de avaliação de desempenho dos trabalhadores de 2017/2018 e o impacto que isso terá nas progressões. As estimativas apresentadas anteriormente tinham por base um inquérito feito aos serviços sobre o número de trabalhadores em condições de progredir na carreira e é natural que com a avaliação mais recente o universo de trabalhadores abrangidos possa ser maior. Por outro lado, os atrasos verificados em 2018 poderão levar a que haja um arrastamento da despesa para o ano seguinte.
Embora as progressões e promoções estejam descongeladas desde Janeiro de 2018, o aumento salarial correspondente é pago em quatro vezes: 25% em Janeiro de 2018, 25% em Setembro, mais um quarto em Maio de 2019 e a última fracção chega em Dezembro.
Além do acréscimo da despesa de 542 milhões de euros com o descongelamento das progressões e das promoções, o Governo conta gastar mais 105 milhões de euros com outras medidas que têm impacto nos salários, em particular o pagamento de horas extras e de qualidade aos enfermeiros, a vinculação de professores, o reposicionamento na tabela salarial dos assistentes operacionais ou o aumento do salário mínimo. Tudo isso faz com que as despesas com pessoal cresçam um total de 647 milhões de euros face a 2018.
Os números apresentados pelas Finanças dão ainda conta de um acréscimo nas despesas com pessoal de 111 milhões de euros no próximo ano, decorrentes do reforço das contratações e da aplicação das 35 horas no sector da saúde, mas que não se reflectem nos salários de quem já trabalha para o Estado. Tudo somado (os 647 milhões de euros e os 111 milhões), os gastos com pessoal nas administrações públicas vão aumentar 758 milhões de euros em comparação com 2018.
De realçar que tanto os números do PE como os que agora foram apresentados correspondem a valores brutos e não têm em conta as receitas arrecadadas com o IRS e com os descontos para a Segurança Social.
Governo: medidas em curso pressupõem subida de 3,1%
Os sindicatos foram para as reuniões desta quarta-feira na expectativa de saberem se haverá aumentos salariais na função pública em 2019. O Governo não disse que sim nem que não e concentrou todos os argumentos no impacto das medidas em curso nos salários dos funcionários públicos.
No comunicado que divulgou nesta quarta-feira ao final do dia e onde destacava as despesas já assumidas com as medidas em curso, o ministério de Mário Centeno concluía que o aumento de 647 milhões de euros no próximo ano se traduzirá em aumentos salariais para a generalidade dos trabalhadores do Estado. “Este valor significa que, em média, os actuais trabalhadores da Administração Pública terão um aumento ao longo de 2019 de mais 3,1% face a 2018”, referiu
Esta posição deixou os sindicatos indignados, acusando o Governo de “malabarismos” e de querer “manipular a opinião pública”, alegando que nem todos os trabalhadores vão beneficiar do descongelamento ou das outras medidas em curso.
Sindicatos indignados ameaçam com greve
“Não abdicamos dos aumentos salariais e não vamos na conversa dos 647 milhões no OE para 2019, quando o Governo deu, em 2018, 728 milhões para o Fundo de Resolução [da banca]”, disse a coordenadora da Frente Comum, Ana Avoila, no final da reunião com o secretário de Estado do Orçamento, João Leão, e com a secretária de Estado da Administração Pública, Fátima Fonseca, onde pediu aumentos de 4%.
“Quiseram mostrar os custos do descongelamento das carreiras e os seus impactos para 2019, sem que sinalizassem ou excluíssem o envio de uma contraproposta no que respeita aos salários ou às outras reivindicações que entregámos”, afirmou por seu turno José Abraão, dirigente da Federação de Sindicatos de Administração Pública (Fesap).
Já depois de ter conhecimento do comunicado do Governo, Abraão considerou-o uma “tentativa de manipular a opinião pública” e de “virar trabalhadores contra trabalhadores”. “É um mau princípio para as negociações”, antecipou.
“Não aceitamos a manutenção do congelamento dos salários, mas estamos disponíveis para negociar a proposta que apresentámos”, desafiou, lembrando que, se não houver qualquer sinal positivo do lado do Governo face aos 3,5% que a Fesap pede, a greve é um cenário em cima da mesa.
Helena Rodrigues, presidente do Sindicato dos Quadros Técnicos do Estado, saiu da reunião com a ideia de que há margem para negociar, mas sem certezas quanto aos aumentos de 3% que pede.
No comunicado, o Ministério das Finanças abre a porta à negociação, sublinhando que o orçamento “está em fase de elaboração” e as opções serão “desenhadas e articuladas em sede de negociação ao longo das próximas semanas”. Está marcada uma nova reunião para 19 de Setembro, dia em que o executivo apresentará uma proposta com as medidas concretas a integrar no OE.