Administração da EDP exige um preço mais alto para a OPA chinesa

A administração liderada por António Mexia insiste que o preço de 3,26 euros é baixo, desaconselhando os accionistas de venderem na OPA a este valor. Vê “méritos” nas intenções da CTG, mas quer mais informação para poder decidir.

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Daniel Rocha

Não é um chumbo à Oferta Pública de Aquisição (OPA) da China Three Gorges (CTG), mas está longe de ser um muito bom. O conselho de administração executivo da EDP, liderado por António Mexia, reconhece alguns méritos ao projecto da CTG para a empresa, mas ainda tem dúvidas que quer ver esclarecidas. Daquilo que já tem a certeza absoluta é que o preço de 3,26 euros oferecido pelos chineses por cada título da eléctrica é baixo e deve ser revisto. “O conselho de administração executivo não pode recomendar que os accionistas vendam as suas acções ao preço actualmente oferecido”, lê-se no relatório aprovado unanimemente pela equipa de gestão da EDP sobre a OPA e divulgado na madrugada deste sábado.

A gestão da empresa “considera que o preço oferecido não reflecte adequadamente o valor da EDP e que o prémio implícito na oferta é baixo considerando a prática seguida pelas empresas europeias no sector das utilities [empresas de serviços básicos] onde existiu aquisição de controlo”, lê-se no relatório, divulgado através da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM).

“Em particular”, sublinha a administração, “a oferta subavalia a EDP tendo em conta os prémios pagos em ofertas públicas precedentes em dinheiro para aquisição de controlo; O prémio implícito no preço oferecido encontra-se significativamente abaixo do que é a prática em transacções em dinheiro no sector europeu das utilities, no mercado ibérico e mais genericamente no mercado europeu, em casos em que o oferente adquire controlo”.

Recuando a 2011, a EDP nota que a contrapartida oferecida “tem implícito um prémio inferior ao prémio oferecido pela CTG em 2011 para a aquisição de uma participação minoritária na EDP”, quando a empresa chinesa pagou 3,45 euros por acção, ou 2700 milhões de euros, por uma fatia de 21,35% da eléctrica (agora está disposta a desembolsar cerca de nove mil milhões para adquirir a totalidade do capital). “Isto apesar de a oferta ter como objectivo a aquisição de controlo e de ter havido uma melhoria significativa do contexto macroeconómico e de mercado”, refere o relatório.

Apesar de ver alguns méritos na proposta da CTG, a gestão da EDP também não está plenamente convencida quanto à forma como a CTG planeia concretizar alguns dos planos que expressou no projecto de prospecto que lhe foi entregue há uma semana para análise. Os accionistas, diz a EDP, precisam de mais informação para tomar uma decisão acertada.

“O conselho de administração executivo constata que há mérito nas intenções estratégicas do oferente”, lê-se no documento. No entanto, “dadas as incertezas em relação à implementação das intenções do oferente e do potencial impacto na EDP” a equipa de gestão “procurará obter mais informação junto da oferente para estar em condições de formar uma opinião mais fundamentada sobre a qualidade do projecto”. Na prática, a equipa de Mexia parece abrir uma porta ao diálogo, ou à negociação, com a CTG para fechar todos os pontos que diz ainda estarem em aberto.

E deixa o aviso: “Sem prejuízo dos méritos do plano que venha a ser estruturado pela oferente com base nas intenções apresentadas”, a administração da EDP “é da opinião de que os accionistas que tencionem vender as suas acções devem ser adequadamente compensados por permitirem a tomada do controlo da EDP e a implementação do referido plano”.

Este plano, “composto por cinco pilares principais relacionados com a identidade, eficiência e crescimento, perfil financeiro, contribuição de activos e a opção de entrada no mercado eólico offshore na China, dão um contexto relevante à oferta”, reconhece a administração da eléctrica.  Entre os “méritos” destaca a intenção de “preservar a identidade portuguesa da EDP e a natureza autónoma do centro de decisões”; de se comprometer a “manter a tendência de redução de alavancagem da EDP”; de “eventualmente contribuir com activos regidos por contratos de longo prazo do Grupo CTG em geografias onde se verifique uma sobreposição de mercado com a EDP”, como é o caso de centrais hídricas e parques eólicos no Brasil; de “criar opções de crescimento, facilitando a entrada da EDP no mercado eólico offshore chinês” e de “posicionar a EDP como líder das operações e do crescimento do Grupo CTG na Europa, na América, nos PALOP, bem como em determinados mercados asiáticos”.

Contudo, ressalva a equipa de António Mexia, “o mérito das intenções” da CTG “depende do seu modelo de implementação, o qual não é claro nesta fase”. Neste momento, a “visibilidade sobre as opções, a execução das intenções e o impacto potencial no perfil de risco e retorno da empresa são limitadas”. Em particular, a EDP nota que, relativamente às intenções de contribuição de activos brasileiros, “o limitado nível de detalhe da proposta” quanto ao “mecanismo de implementação, à estrutura de capital e ao calendário da contribuição de activos, suscita diversas questões, que não podem ser devidamente abordadas (…) com base na informação actualmente disponível”.

O relatório realça ainda que a “contribuição de activos de dimensões significativas no Brasil contemplada pela oferente levaria a um aumento relevante da contribuição relativa da América Latina para o portefólio global da EDP, o que, consequentemente, modificaria de modo relevante o seu perfil de risco e de retorno”.

“Considerando os riscos identificados”, a EDP diz que “de modo a poderem tomar uma decisão ponderada, os accionistas devem ter acesso a informação adequada de forma a estarem em condições de avaliar as intenções da oferente, o seu modelo de implementação e respectivo impacto financeiro”. O conselho de administração “acolhe a intenção da oferente de regular uma eventual contribuição de activos mediante um acordo quadro” e diz esperar que a CTG possa apresentar “garantias idênticas em relação às suas outras intenções, nomeadamente as relativas à identidade, corporate governance [governo da companhia], estratégia financeira, política de dividendos e novos mercados tais como o mercado eólico offshore chinês”.

Além de destacar a grande quantidade de autorizações regulatórias que são necessárias satisfazer de forma a ser possível lançar a OPA (as condições de lançamento definidas pela própria CTG) e do tempo que poderá demorar alcançar essas mesmas autorizações nos vários mercados em que a EDP está presente (como o Estados Unidos, por exemplo), a gestão da eléctrica frisa que há elementos da oferta “que necessitam de clarificação antes do período de tomada de decisão pelos accionistas de forma a suportar a mesma”.

Entre elas destaca “a condição de obter 50% + 1 direitos de voto da EDP” (o que implica a convocar uma assembleia-geral para desblindar os estatutos da empresa, que neste momento impedem que um accionista possa votar com mais de 25% do capital, mesmo tendo uma posição superior) e a obrigação de lançamento de uma oferta pública obrigatória sobre a EDP Brasil em caso de aquisição de controlo.
A CTG é a maior accionista da EDP, com 23, 27% do capital (embora o Estado chinês detenha, através da CNIC, outros 4,98%, num total de 28,25%) e em Abril reconduziu António Mexia para um quinto mandato à frente da empresa (até 2020). A CTG, que em 2011 pagou 3,45 euros por cada acção da eléctrica, oferece agora um valor que representa um prémio de 10,8% se for considerado o preço médio ponderado das acções nos seis meses anteriores à data do anúncio, que é uma referência habitualmente utilizada neste tipo de operações. Quanto à OPA obrigatória sobre a EDP Renováveis (a EDP já detém mais de 80% da empresa), o valor oferecido é de 7,33 euros (a contrapartida mínima a que estava sujeita).

Segundo o relatório, o Conselho Geral e de Supervisão (CGS) da empresa, órgão que é presidido por Luís Amado e onde estão representados os principais accionistas da empresa, num total de 21 membros, emitiu um “parecer favorável” à opinião expressa pelo conselho de administração executivo. “Numa análise preliminar baseada na informação limitada fornecida pelo Oferente” o CGS (onde a China Three Gorges tem cinco representantes, incluindo Eduardo Catroga, que foi o seu anterior presidente) diz que “os objectivos estratégicos” e a afirmação da oferente “de alcançar sustentabilidade estratégica, aprofundar e reforçar a agenda estratégica 2016- 2020 da EDP e reduzir o endividamento, controlando riscos e continuando a promover a eficiência, o crescimento e o retorno do investimento, estão em consonância com os pilares fundamentais do Plano Estratégico da EDP”, embora considere necessária a clarificação de vários aspectos.

O CGS, onde também está, como membro independente, António Vitorino, que é o presidente da mesa da assembleia geral da EDP, destaca ainda que “irá continuar a exercer as suas competências legais e estatutárias, decidindo, em cada momento, com base na avaliação de quais sejam os interesses da EDP, de todos os seus accionistas e dos seus demais stakeholders, nomeadamente quando estejam em causa operações que, de acordo com os estatutos da EDP, possam vir a estar sujeitas ao seu parecer prévio, ainda que a prossecução daqueles interesses afecte, ou possa afectar, pressupostos subjacentes à Oferta Pública EDP”.

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