Governo propõe alargar período experimental de 90 para 180 dias
Medida destina-se apenas aos contratos celebrados com trabalhadores à procura do primeiro emprego ou desempregados de longa duração. Governo propõe ainda um limite máximo de seis renovações para contratos temporários.
O Governo quer alargar de 90 para 180 dias o período de experiência exigido aos trabalhadores à procura de primeiro emprego ou desempregados de longa duração. Esta é uma das medidas que o executivo introduziu na “proposta de acordo” para a revisão da legislação laboral, que apresentou nesta quinta-feira aos parceiros sociais. A proposta em cima da mesa mantém alguns dos pontos que já constavam do documento apresentado pelo ministro do Trabalho, Vieira da Silva, na concertação social em Março e inclui alguns contributos enviados pelas confederações patronais e centrais sindicais, numa tentativa de chegar a um documento que permita fechar um acordo com a maioria dos parceiros.
A intenção de alargar de 90 para 180 dias o período experimental dos contratos sem termo celebrados com trabalhador à procura do primeiro emprego ou que esteve em situação de desemprego por mais de 12 meses, é uma inovação face ao documento de Março e vai ao encontro das propostas da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal.
O objectivo, precisa o Governo, é “promover a contratação sem termo” destes trabalhadores e “estimular a sua inserção no mercado de trabalho”. Mas por outro lado, também pode servir para compensar a eliminação da possibilidade de contratar a termo jovens e desempregados de longa duração para ocuparem postos de trabalho permanentes.
A medida comporta alguns riscos, nomeadamente constitucionais. Em 2008, quando o actual ministro Vieira da Silva também ocupava a pasta do Trabalho, o Tribunal Constitucional chumbou por unanimidade a norma do Código do Trabalho que alargava de 90 para 180 dias a duração do período experimental para a generalidade dos trabalhadores, dando razão às dúvidas suscitadas pelo então Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva.
Em relação a este assunto, o ministro do Trabalho, Vieira da Silva, lembrou que a proposta feita agora é diferente da que foi chumbada em 2008, porque respeita apenas a dois grupos de trabalhadores: os jovens à procura do primeiro emprego e os desempregados de longa duração, que estão afastados do mercado de trabalho há muito tempo.
“É razoável que ambas as partes tenham mais tempo para terem um período de aprendizagem”, defendeu, acrescentando que o objectivo é evitar que o contrato a termo seja usado como período experimental de três anos como acontece agora.
Durante o período experimental (que no Código do Trabalho actual varia entre os 90 dias para a generalidade dos trabalhadores, os 180 dias para os trabalhadores em cargos de complexidade técnica ou de responsabilidade e os 240 dias para os cargos de direcção ou quadros superiores), a empresa pode despedir o trabalhador sem motivo e sem lhe pagar compensação.
“Estamos a contrariar uma realidade que grande parte dos portugueses e grande parte dos jovens conhecem, a única possibilidade de entrarem no mercado de trabalho é através de um contrato a termo certo [que funciona] como período experimental. Queremos acabar com esse modelo”, disse Vieira Da Silva.
Esta justificação, lembrou o ministro, não foi usada pelo governo junto do Tribunal Constitucional em 2008, mas até já poderia ter sido.
O ministro do trabalho não quis antecipar como será a votação das propostas do governo quando chegarem ao Parlamento, mas lembrou que algumas das propostas foram negociadas com os parceiros políticos.
“O governo tem a responsabilidade de apresentar estas propostas no parlamento. Como os partidos votam, é um problema dos partidos. Eu espero que os partidos que têm apoiado o governo na área parlamentar apoiem estas propostas e estou certo que o farão pelo menos na sua maioria”, afirmou.
Banco de horas por acordo de 65% dos trabalhadores
O Governo mantém a intenção de eliminar o banco de horas por acordo individual, mas na proposta agora apresentada vai mais longe e diz que quer também eliminar o banco de horas grupal com origem em acordos individuais, reservando estas figuras “para a negociação colectiva ou para acordos de grupo a alcançar através de consulta aos trabalhadores”.
Nesse sentido, a ideia é que possa haver acordos de grupo (permitindo que o período normal de trabalho seja aumentado até duas horas diárias com um limite de 50 horas semanais e 150 horas por ano) que possam ser aplicados ao conjunto dos trabalhadores se, “após consulta por voto secreto dos trabalhadores a abranger, e com garantia de acompanhamento por comissão de trabalhadores, comissões intersindicais, comissões sindicais, delegados sindicais existentes ou comissão ad hoc, o mesmo for aprovado por 65% dos trabalhadores da equipa, secção ou unidade económica a quem for dirigida”. O banco de horas criado através desta modalidade terá a validade de quatro anos e pode ser revisto a meio do prazo, por solicitação de um terço dos trabalhadores.
Contratos temporários com máximo de seis renovações
A proposta apresentada nesta quinta-feira traz também novidades na área do trabalho temporário, introduzindo um limite máximo de seis renovações para este tipo de contratos, algo que agora não existe na lei e eliminando o prazo de aplicação das normas das convenções colectivas aos trabalhadores temporários, “de modo a reforçar as suas condições de equidade face aos demais trabalhadores da empresa onde exercem a sua actividade”. Além disso, a empresa será obrigada a informar o trabalhador temporário do motivo subjacente à celebração do contrato.
Mas a mudança mais significativa tem a ver com a criação de uma sanção para punir a violação da lei e que obrigará a empresa utilizadora a integrar o trabalhador no quadro de pessoal com contrato sem termo.
Contratos de muito curta duração passam de 15 para 35 dias
Na proposta de acordo, o executivo propõe alargar de 15 para 35 dias a duração máxima dos contratos de muito curta duração, mantendo-se a duração máxima anual de 70 dias de trabalho com o mesmo empregador. O objectivo da medida, segundo o Governo, é “desincentivar o recurso ao trabalho não declarado ou subdeclarado na actividade agrícola e em eventos turísticos”
Ao contrário do que o ministro do Trabalho já tinha deixado subentendido, não há, pelo menos para já, mudanças nos sectores onde estes contratos são permitidos além do turismo e da agricultura.
Parceiros querem mais
Do lado dos trabalhadores, a CGTP foi muito crítica da proposta do Governo e, embora se mostre disponível para negociar, deixou claro que nunca aceitará algumas das propostas do Governo. Em particular o aumento do período experimental ou a medida que prevê que um dos fundamentos da caducidade dos contratos colectivos possa ser a existência de outras convenções no sector. “O Governo está a indicar o caminho as associações patronais para porem em causa as convenções que prevêem mais direitos”, antecipa Arménio Carlos, líder da CGTP.
Sérgio Monte, dirigente da UGT, considera, por seu turno, que o documento apresentado vai ao encontro de várias propostas da central sindical, abrindo a porta a um acordo. “Genericamente é um documento que merecerá o nosso consenso e poderá consubstanciar um acordo caso os restantes parceiros o queiram”, afirmou.
Indústria e Comércio, as únicas confederações patronais que falaram no final da reunião, reconhecem que houve evoluções no documento apresentado nesta quinta-feira, que integrou algumas das suas propostas, mas entendem que ainda não é suficiente.
António Saraiva, presidente da CIP, destacou as mudanças na flexibilização do banco de horas grupal (bastará que 65% dos trabalhadores os aceitem para ele se estender a todos, em vez de 75%) como positivas, mas diz que a confederação irá insistir para a reduzir os “efeitos negativos “ de outras medidas propostas pelo Governo.
Quanto à possibilidade de um acordo, Saraiva reconhece que “há vontade expressa nesse sentido”.
Já João Vieira Lopes, dirigente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal, não escondeu a desilusão com a proposta. Os pontos mais preocupantes para a CCP são os limites aos contratos, a prazo que “são uma prática necessária para as empresas”.
Quanto a um acordo, “estamos numa posição de expectativa mas não estamos muito optimistas”.