Novo líder catalão promete “um país livre e republicano”, depois da mais estranha tomada de posse

Sem convidados e quase em segredo – a ideia era apropriá-la à excepcionalidade do momento, com dirigentes presos e em fuga –, a cerimónia na Generalitat demorou cinco minutos. Falta o resto do governo.

Quim Torra, Roger Torrent, Palau da Generalitat de Catalunya, Presidente da Generalitat da Catalunha, Generalitat de Catalunya
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O abraço entre Roger Torrent e Quim Torra depois da posse Alberto Estevez/Reuters
Palau de la Generalitat de Catalunya
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Algumas bandeiras independentistas diante do Palau da Generalitat Albert Gea/Reuters
Albert Rivera, Catalunha, Mariano Rajoy, Aplicació de l'article 155 de la Constitució espanyola a Catalunya
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Rivera no encontro em que não convenceu Rajoy a manter em vigor o artigo 155 Juan Carlos Hidalgo/EPA

Quim Torra é desde esta quinta-feira o 131º presidente catalão. Pelo menos no papel: o primeiro a felicitá-lo, por telefone, foi Carles Puigdemont, afastado com o conjunto do seu executivo por Madrid e que os independentistas consideram o “president legítimo”. A sublinhar esse facto, Torra não usou a medalha de líder da Generalitat e deixou-a sobre a mesa.

“Prometo cumprir lealmente as obrigações do cargo de presidente da Generalitat com fidelidade ao povo da Catalunha, representado no parlamento.” Assim tomou posse Torra, usando a mesma fórmula que Puigdemont inaugurara e deixando de fora a tradicional promessa de lealdade à Constituição, ao Estatuto da região autonómica e ao rei. Segundo o jornal catalão La Vanguardia, em Madrid estuda-se se a fórmula usada poderá chegar para tentar impugnar a tomada de posse.

Certo é que tanto PP, como PSOE e Cidadãos se vão pôr de acordo para votar “regras mais precisas” para obrigar os cargos públicos a jurar cumprir a Constituição. Os socialistas, aliás, mostraram-se mais activos nas críticas às palavras que Torra não pronunciou do que os populares, no poder. “Mais do que as palavras e fórmulas, o que importa é o fundo da questão, os factos, as actuações, e desejamos que o governo da Generalitat inicie a sua gestão, se comprometa com a lei e comece a trabalhar”, afirmou mesmo o ministro da Justiça, Rafael Catalá.

A Generalitat só anunciou a hora da cerimónia – 11h30 – duas horas antes e para além de Torra, do presidente do Parlamento, Roger Torrent, e do secretário de governo, a quem cabe ler o decreto de nomeação, só assistiu a família do novo líder. Todos os que estiveram no Salão da Virgem de Monserrate do Palau da Generalitat (e não no habitual Salão de San Jordi) ostentavam na lapela o laço amarelo símbolo dos ex-conselheiros e activistas presos desde Outubro por causa da organização do referendo sobre a independência.

Logo depois do telefonema de Puigdemont, Torra foi felicitado pelos trabalhadores do Palau, garantindo-lhes que vai manter “o mesmo compromisso e empenho” do anterior executivo para “construir um país novo”, “livre e republicano”. Os funcionários ofereceram-lhe um grande laço amarelo para que seja pendurado na sede do govern – Torra disse que o fará mal tenham tomado posse os novos conselheiros (ministros). Funcionários e presidente cantaram em seguida o hino catalão, Els Segadors, e El Cant de la Senyera (a bandeira catalã).

Conselheiros presos?

A escolha do executivo trará novos episódios de um braço-de-ferro sem fim à vista entre Madrid e Barcelona. Torra quer que todos os detidos (e eventualmente até alguns dirigentes que viajaram para o estrangeiro para fugir à cadeia) que o desejem possam voltar a assumir as pastas que tinham quando o Governo e o Senado aprovaram a aplicação inédita do artigo 155 da Constituição, cessando o governo e dissolvendo o Parlamento, no fim de Outubro.

Dos dois partidos grandes partidos independentistas, a coligação formada por Puigdemont para as eleições de Dezembro, a JxCAT (Juntos pela Catalunha), e a ERC (Esquerda Republicana da Catalunha), o primeiro defende que os ex-conselheiros possam voltar ao governo, enquanto o segundo prefere evitar mais polémicas.

Isto depois dos meses perdidos a tentar investir um presidente: os primeiros nomeados por Torrent, o próprio Puigdemont, e Jordi Sànchez, que foi seu “número dois” nas listas, fracassaram por ausência (o primeiro permaneceu em Bruxelas no dia marcado; o segundo não foi autorizado a sair da prisão para ir ao parlamento – as regras ditam que o discurso de investidura tem de ser presencial). O terceiro, Jordi Turull, ex-conselheiro da presidência, falhou na primeira votação e foi preso na véspera da segunda, quando basta uma maioria simples.

Oficialmente, e na prática, o 155 continua em vigor e quem manda na Catalunha ainda é Mariano Rajoy. É preciso um governo em funções para que a intervenção do governo central chegue ao fim. Sem esquecer os avisos dos últimos dias: o 155 voltará a qualquer momento, assim que seja posta em causa a legalidade. Isso garantem Rajoy e Sànchez – se dependesse do líder do Cidadãos, Albert Rivera, a autonomia não chegaria a ser devolvida.

“Ou o senhor Torra se compromete especificamente a respeitar o Estatuto e a Constituição ou temos de actuar desde já”, defendeu o político catalão anti-soberanista depois de um encontro com o primeiro-ministro. “Rajoy disse que estaria vigilante”, afirmou. Para Rivera, que defende um 155 mais alargado, para intervir nos meios de comunicação públicos, educação (ensino em catalão) e finanças (que continuarão parcialmente controladas por Madrid), é muito pouco.

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