O Grupo Bilderberg. Não é a primeira vez que dele decido falar porque acredito que nos falta exigir mais dos seus membros: mais transparência, mais diálogo, mais democracia. Contudo, hoje trago alguém com muito maior propriedade para debater o assunto. Não apenas porque Bilderberg faz parte do seu ambiente natural desde há uns anos a esta parte, mas por ter agora levado a cabo uma investigação esplendorosa e muito reveladora sobre o papel que Bilderberg teve (ou poderá ter tido) na política portuguesa.
Cruzei-me com o jornalista Frederico Duarte Carvalho na redacção da saudosa revista Focus, na qual encetei este arremedo de carreira. Pouco mais tarde, vim a saber que o Frederico era rapaz para vasculhar os meandros pouco convencionais no ecossistema mediático nacional e que, de quando em vez, isso não lhe era profissionalmente vantajoso perante os seus pares. Isso, para o caso, pouco importa. O que importa – a todos nós, cidadãos – é o monstro de investigação que o Frederico conseguiu no seu novíssimo O Governo Bilderberg. Falemos, pois então, com quem percebe verdadeiramente do tema.
“Na minha opinião”, explica, “o Grupo Bilderberg é talvez o mais poderoso e eficaz centro de decisões a nível mundial. E nem sou eu que o digo. Em 1962, Marcello Mathias, ex-ministro dos Negócios Estrangeiros de Salazar e então embaixador em Paris, após ter participado numa reunião, escreveu ao ministro Franco Nogueira a dizer-lhe que, face ao poder dos convidados e ambiente das reuniões, era o melhor local para contactos internacionais e muito mais eficaz do que outros encontros oficiais”. E esta foi só uma das primeiras interacções lusas com o estranho Grupo, que agora reúne uma vez por ano, à porta fechada, e que é composto pelos rostos políticos e económicos mais influentes do nosso planeta.
Portugal, segundo Frederico Duarte Carvalho, não tem estado à margem do olhar dos Bilderberg. Além da reunião decorrida em plena vila de Sintra, em 1999, “os sinais mais evidentes [da influência de Bilderberg no nosso país] são a promoção internacional de [António] Guterres e Durão Barroso”. Mas existem outros: “a saída de Portugal de África, o que acabou por abrir caminho à entrada do nosso país na Comunidade Europeia, juntamente com Espanha. Isso aconteceu em 1986 e permitiu, posteriormente, a concretização do principal objectivo de Bilderberg: a união da Alemanha e posterior unificação económica da Europa à volta do Euro. Já agora, outro sinal evidente é ainda o facto de haver um vice-presidente português no Banco Central Europeu, oriundo dos encontros Bilderberg: Vítor Constâncio”.
No livro mais recente de Frederico Duarte Carvalho, o trabalho de pesquisa foi de tal forma bem conduzido que nos deparamos com uma cascata de informação que tem tanto de impressionante quanto de cariz quase-romanceado. Para o jornalista, esta descoberta também foi uma surpresa: “fiquei deveras surpreendido com a quantidade de material depositado no Ministério dos Negócios Estrangeiros, como, por exemplo, o primeiro convite feito em 1956 e ainda os relatórios de trabalho debatidos no encontro de 1967 e que Franco Nogueira mandou arquivar. Posso ainda dizer que me surpreendeu mesmo ter descoberto que o governo de Salazar chegou a convidar o grupo para se reunir em Portugal em 1964 e a carta que o príncipe Bernardo da Holanda escreveu a explicar a recusa de a reunião ser no nosso País - evocando o facto de há 10 anos não haver um encontro na América”.
Estes são apenas pequenos, mas reveladores, exemplos do que encontramos neste trabalho. “Os portugueses que queiram conhecer como nos tiraram de África e nos deram a actual democracia e os políticos que temos, devem mesmo ler este livro”, apela o autor, “vão ter ali muitas respostas às suas dúvidas e, graças ao conhecimento que vão ter do passado recente - dos últimos 60 anos - vão ficar melhor preparados para enfrentarem o futuro. É um livro que nos devolve a esperança de ainda podermos ter o poder de volta”.
Frederico não teme represálias agora que deu à esfera pública tais revelações (“só se me despentearem!...”), e afirma também que nunca recebeu nenhuma espécie de ameaça, mas acreditei ser importante perceber qual o interesse por Bilderberg que tanto move este homem. “Não me intriga nem fascina Bilderberg. Apenas acho que políticos no activo não podem usar os contactos internacionais à porta fechada com magnatas para o seu poder próprio ou colocarem o destino de milhares de pessoas que votaram e confiaram neles nas mãos dos interesses económicos estrangeiros. Chama-se traição à Pátria e, como jornalista, apenas fiz o máximo que deveria fazer: tentei denunciar publicamente essa traição. Nada mais.” Faltam mais jornalistas assim, de sangue na guelra, digo eu.