Protecção Civil e gestora dos Kamov em ruptura: helicópteros não estarão prontos a tempo do Verão
Autoridade Nacional de Protecção Civil mandou fechar as instalações onde é feita a manutenção dos helicópteros pesados do Estado. Everjets tinha dado dois helicópteros ligeiros para substituição e decidiu retirá-los em retaliação.
A relação entre a Autoridade Nacional de Protecção Civil (ANPC) e a Everjets, a empresa que gere os helicópteros pesados do Estado, chegou a um ponto de ruptura. O divórcio ainda não foi oficializado, mas a entidade do Estado decidiu esta terça-feira impedir a empresa e a sua sub-contratada de fazerem a manutenção dos Kamov e expulsá-las do hangar de Ponte de Sor, onde estavam estacionados três helicópteros. Agora, a Everjets diz que não terá as aeronaves prontas a tempo do Verão, uma situação que dificilmente conseguiria, mesmo que isto não tivesse acontecido, porque a Autoridade Nacional de Aviação Civil (ANAC), também em litígio com a empresa, continua sem lhe dar as necessárias autorizações de voo.
A vida da Everjets não está fácil por estes dias. Apesar de o presidente da empresa, Ricardo Dias, negar ao PÚBLICO que a empresa esteja em "dificuldades", a verdade é que há com problemas com o Estado em duas vertentes: com a ANPC e com a ANAC. Esta semana, a Protecção Civil "encerrou e selou as instalações onde estão guardados os helicópteros Kamov, expulsando dos hangares equipas russas que procediam à manutenção das aeronaves", lê-se num comunicado enviado ao PÚBLICO pela Everjets. "Foi uma decisão caricata e extemporânea", diz o presidente da empresa, Ricardo Dias.
A "ANPC invoca como motivo que a empresa de manutenção russa Heliavionics da Kamov [a empresa sub-contratada da Everjets] estava a movimentar equipamento/peças sem autorização prévia, situação esta que no decorrer dos anos sempre foi normal", lê-se no comunicado. Uma informação confirmada mais tarde pela Protecção Civil que considerou que "o encerramento do hangar foi a única medida" que "permitiu acautelar os bens da ANPC e o interesse público subjacente". A ANPC acrescenta ainda no comunicado que pediu explicações à Everjets e, depois de as ter, admite reabrir o hangar para que sejam retomados os trabalhos.
A decisão da ANPC deu argumentos à Everjets para dizer que "vê-se assim impossibilitada de cumprir os objectivos e garantir a prontidão das aeronaves, que fica seriamente comprometida". Mas o problema da prontidão das aeronaves é antigo e seria difícil à empresa ter os Kamov prontos a tempo do Verão.
O Estado tem seis Kamov, apenas três estão em condições de voar, mas só depois de concluírem a manutenção dos dez anos, em Ponte de Sor. Dos três, a empresa tinha garantido que teria um Kamov pronto a 26 de Fevereiro e outro a 30 de Março - o terceiro só agora iria para trabalhos. Acontece que apesar de já ter dado por concluída a manutenção de um deles, a Everjets continua a esbarrar num problema: a ANAC obriga a que seja substituída uma peça em fim de vida e a empresa não a tem e diz que não a consegue no mercado. Como tal, a entidade reguladora não dá autorização de voo. Ao PÚBLICO, a ANAC confirmou de novo que a Everjets não substituiu a peça e como tal não tem as licenças de voo.
Nos últimos dias, têm chegado ao PÚBLICO várias informações sobre a situação da Everjets, nomeadamente a venda de helicópteros ligeiros para fazer face a dificuldades financeiras, bem como a saída de pilotos com habilitação para pilotar Kamov, o que faria com que a empresa deixasse de ter a equipa mínima necessária para assegurar a operação das aeronaves. Ricardo Dias desmente dificuldades na empresa, mas admite que saíram "quatro co-pilotos que foram substituídos por dois comandantes", garantindo que tem o número suficiente de profissionais.
A ANPC não deu mais informações sobre esta decisão, nem explicou se existe alguma alteração contratual. Ricardo Dias diz que não lhe foi "comunicada qualquer alteração ao contrato" de manutenção e operação dos Kamov, ou a sua denúncia, por parte da ANPC. Mas há problemas entre as duas entidades.
Desde o início do ano que um dos Kamov, que estava ao serviço do INEM, está impedido de voar. Para substituir esse aparelho, a empresa cedeu dois helicópteros ligeiros. Ambas as partes asseguram que esta substituição não viola o contrato, apesar de os dois ligeiros não fazerem, por exemplo, evacuação médica.
Em respostas ao PÚBLICO, a ANPC diz que a decisão foi tomada com base em "razões de natureza técnica e operacional" negando qualquer favorecimento à empresa. "A ANPC considerou, com base em critérios estritos de natureza operacional, assegurar prioritariamente a capacidade de realização de missões de combate a incêndios rurais em detrimento de outras. Essa a razão por que o operador procedeu às substituições, nos termos contratuais, nos moldes verificados", respondeu.
Ora, desde quarta-feira, esses dois helicópteros foram também eles retirados à ANPC. Ricardo Dias conta que retirou as duas aeronaves de Loulé, onde estavam à espera de combater os incêndios. "Estão no meu hangar no Porto", disse ao PÚBLICO.