Governo sem garantias de que taxa de rotatividade passa no Parlamento
PCP tem dúvidas quanto à taxa de rotatividade e diz que tem de analisar a proposta em concreto. BE aplaude mas alerta que eficácia da medida depende do valor da taxa e da base de incidência. Patrões dizem que propostas complicam vida às empresas.
O ministro do Trabalho, Vieira da Silva, apresentou nesta sexta-feira um pacote de 27 medidas para combater a precariedade, reduzir a segmentação laboral e promover a negociação colectiva (ver texto relacionado). Muitas delas vão ao encontro de propostas negociadas com o Bloco de Esquerda ou já apresentadas pelo PCP, mas outras ficam aquém das expectativas. E no caso da taxa para penalizar as empresas que contratam de forma sistemática trabalhadores a prazo, não há garantias de que terá o apoio do PCP para passar no Parlamento.
Esta foi a medida encontrada pelo Governo para evitar mexer na Taxa Social Única (TSU) e para agradar aos partidos que o apoiam, mas ela não é pacífica. As reticências vêm sobretudo do lado do PCP que diz que a nova taxa pode ter efeitos perversos e que nunca apresentariam tal proposta. Já do lado do BE chegaram aplausos e um aviso: é preciso que a base de incidência e o valor concreto da taxa sejam eficazes.
“Temos dúvidas quanto à eficácia da medida”, adiantou ao PÚBLICO a deputada do PCP, Rita Rato. “A precariedade tem de ser erradicada e não legalizada. Entendemos que esta é uma proposta que pode ser perversa, um contrato precário ilegal tem de ser transformado num contrato sem termo e a solução não é pôr as empresas a pagarem uma taxa e poderem continuar a rodar os trabalhadores”, acrescentou.
Questionada sobre se aprovariam uma medida desta natureza do Parlamento, Rita Rato não quis antecipar uma posição: “Temos de analisar em concreto”. Mas também acrescentou: “Nunca seríamos nós a apresentar esta proposta”.
Do lado do Bloco, o deputado José Soeiro aplaudiu a proposta e o facto de o Governo ter desistido da modulação da TSU. “O Bloco de Esquerda congratula-se que o Governo tenha, tal como era nossa exigência, concretizado a taxa de rotatividade por via de uma penalização da contribuição patronal para a Segurança Social”, afirmou em declarações à Lusa, no Parlamento.
Porém, num comunicado, o partido quer conhecer em detalhe o desenho que está a definido pelo Governo. “É preciso que a base de incidência e o valor concreto da taxa garantam o seu efeito dissuasor”, alerta.
De uma forma geral, tanto o Bloco como o PCP aplaudem as medidas relacionadas com o fim da contratação a prazo para os desempregados de longa duração, jovens à procura do primeiro emprego e empresas em início de actividade, assim como a redução da duração máxima da contratação a termo de três para dois anos.
Ainda assim, ambos os partidos defendem que é preciso ir mais longe. “Estamos em absoluto desacordo com a decisão do Governo de manter a caducidade da contratação colectiva, de não repor o princípio do tratamento mais favorável ao trabalhador e de manter a existência de bancos de horas e de adaptabilidades dos horários de trabalho”, frisou a deputada Rita Rato, garantindo que o partido vai continuar a apresentar propostas para “revogar as normas mais gravosas” da legislação laboral e acusando o Governo de se aliar ao PSD e ao CDS nestas matérias.
Embora sublinhe que as propostas apresentadas na concertação social concretizam os compromissos assumidos no âmbito do grupo de trabalho sobre o combate à precariedade, o Bloco de Esquerda considera que elas “estão muito aquém do que seria necessário” para reequilibrar a legislação laboral no âmbito da contratação colectiva.
No final da reunião da concertação social, o ministro do Trabalho defendeu as propostas que apresentou, mostrando abertura para ouvir as preocupações dos parceiros. "Procurámos construir um conjunto sólido de medidas para atacar dois problemas sérios da nossa economia. Um deles é o excessivo peso da precariedade, é do dia-a-dia das famílias portuguesas o conhecimento da percentagem enorme, particularmente de jovens que saltam de de empregos precários em empregos precários”, exemplificou.
À saída do encontro, o líder da confederação da indústria (CIP), António Saraiva, não escondia o seu desagrado e, de caminho, dava como certas as dificuldades do Governo no Parlamento.
O pacote laboral, afirmou, não agrada nem a gregos nem a troianos e "vem ao arrepio” do desenvolvimento económico e das empresas. “Temos outros desafios pela frente, estes não são prioritários. Se é para agradar à esquerda parlamentar que suporta o Governo não sei, sei é que a CGTP se manifestou contra o que está aqui contido, e pelo respeito que sei que o Partido Comunista tem pela opinião da CGTP, isto nem agradará certamente ao PCP”, acrescentou.
De uma forma geral, os patrões consideram a proposta laboral “extemporânea” num momento em que a economia está a crescer e em que a taxa de desemprego está em níveis mínimos, rementendo comentários sobre as medidas em conreto para mais tarde. Ainda assim, João Vieira Lopes, presidente da Confederação do Comércio (CCP), não tem dúvidas que as medidas “vão complicar a vida às empresas” e desafia o Governo a apresentar outras que a facilitem na área fiscal, formação e da energia. Só assim estão disponíveis para negociar um pacote laboral.
Do lado sindical o tom é de crítica, porque o Governo não resolve os problemas da contratação colectiva, um tema caro à CGTP e à UGT. As alterações são “pouca coisa”, disse Sérgio Monte, dirigente da UGT.
O líder da CGTP, Arménio Carlos, acusou o Governo de estar "condicionado quer com a pressão dos partidos da direita" e dos patrões, acrescentando que a taxa de rotatividade não resolve o problema da precariedade e que as empresas poderão fazer repercutir o seu efeito no salário oferecido ao trabalhador. “Quando eu era pequenino, ouvia dizer que no período da Páscoa não se podia comer carne, mas se pagássemos a bula já podíamos comer. Ou seja, as empresas podem continuar a contratar trabalhador com vínculos precários, mas se pagarem a taxa já não há problema”, ironizou.