Ex-secretário de Estado critica Comissão Técnica Independente e aponta dados "falsos"
Jorge Gomes, actual deputado, sustenta que a comissão não fez o contraditório e não ouviu o Governo.
O ex-secretário de Estado da Administração Interna Jorge Gomes criticou esta quinta-feira a Comissão Técnica Independente aos incêndios de Outubro por ausência de direito ao contraditório e apontou a existência de dados "falsos" sobre meios de combate disponíveis.
Jorge Gomes, actual deputado socialista e que se demitiu do Governo na sequência dos incêndios de 15 e 16 de Outubro, acusou, em conferência de imprensa, o ex-segundo comandante operacional (CONAC) da Autoridade Nacional de Protecção Civil (ANPC), o tenente coronel Albino Tavares, de ter transmitido aos elementos da Comissão Técnica Independente informações "falsas".
De acordo com Jorge Gomes, a Comissão Técnica Independente "não fez o contraditório" das posições assumidas pelo tenente coronel Albino Tavares, que na altura dos fogos de Outubro desempenhava as funções de primeiro CONAC em regime de substituição.
"O Estado e o Governo jamais retiraram meios quando são necessários. Nada do que aconteceu foi por falta de meios, tudo o que aconteceu foi porque não havia forma de conter a dimensão [dos fogos]. Arderem dez mil campos de futebol numa hora, era essa a progressão do incêndio e não há meios aéreos e humanos, não há recursos nenhuns que consigam suster incêndios desses", sustentou.
Interrogado sobre se estava a dar a conferência de imprensa a título pessoal, Jorge Gomes respondeu: "Não me estou a defender a mim, porque, para me defender, tenho os meios próprios".
"Mas, o Governo não foi ouvido neste contraditório. Esta foi uma decisão minha, porque fui eu quem fiz os despachos" em causa, justificou.
Na conferência de imprensa, o deputado do PS eleito pelo círculo de Bragança atacou as posições assumidas pelo então segundo CONAC em matéria de recursos humanos disponíveis na fase DELTA para o período entre 1 e 15 de Outubro, sobretudo na parte em que se refere que foram pedidas 105 equipas de combate, mas apenas foram disponibilizadas pela tutela 50.
"Numa primeira fase foram autorizadas 50 equipas de combate e na segunda fase mais 72 equipas. Na fase DELTA tivemos o previsto de 5518 operacionais, reforçados depois para 6626. No que respeita à Força Especial de Bombeiros (FEB), a proposta não era de recrutamento de 40 operacionais, mas a contratação de nove, ficando os outros numa bolsa de recrutamento", contrapôs.
Segundo o ex-secretário de Estado, como forma de compensação, o Governo solicitou a presença de mais 40 GIP's (Grupo de Intervenção de Protecção e Socorro) da GNR, "o que permitiu um maior equilíbrio num processo com maior transparência".
Jorge Gomes considerou ainda falsas as declarações do então segundo CONAC sobre contratação de mais horas de voo de aviões anfíbios médios, advogando antes que "essa parelha de aviões esteve plenamente operacional em 2017".
Em relação à versão de que chegou ao Ministério da Administração Interna um pedido formal para o reforço de quatro meios aéreos ligeiros, o ex-secretário de Estado classificou-a como "caricata", porque a ANPC pretendia que fosse submetida a Conselho de Ministros uma proposta que a própria autoridade considerava ilegal, razão pela qual foi devolvida.
Perante os jornalistas, o ex-secretário de Estado defendeu também que "todo o dispositivo de vigilância e combate, incluindo os 1108 operacionais de reforço, permaneceu empenhado na segunda quinzena de Outubro".
"Nós não fizemos desmobilização rigorosamente nenhuma", afirmou.
Em termos de meios aéreos, de acordo com a versão de Jorge Gomes, na realidade, não foi reforçado o dispositivo da fase DELTA, mas verificou-se um prolongamento dos contratos entre os dias 16 e 31 de Outubro: Dois aviões pesados, dois aviões anfíbios médios, oito helicópteros médios, aos quais acrescem seis meios próprios".
"Infelizmente, não choveu quando era desejável, no dia 14 de Outubro. Já não teria acontecido muita coisa no dia seguinte", disse, lamentando que o segundo CONAC tenha assumido posições "absurdas".
"Lamento que não tenha havido um contraditório", acrescentou, numa nova crítica à Comissão Técnica Independente.
A Comissão Técnica Independente que analisou os grandes incêndios rurais de 2017 entregou na terça-feira, no parlamento, o relatório dos fogos de Outubro, envolvendo oito distritos das regiões Centro e Norte.
O documento, que actualiza para 48 o número de mortos nesse mês, conclui que falhou a capacidade de "previsão e programação" para "minimizar a extensão" do fogo na região Centro (onde ocorreram as mortes), perante as previsões meteorológicas de temperaturas elevadas e vento.
A junção de vários factores meteorológicos, descreve, constituiu "o maior fenómeno piro-convectivo registado na Europa até ao momento e o maior do mundo em 2017, com uma média de 10 mil hectares ardidos por hora entre as 16:00 do dia 15 de Outubro e as 5h do dia 16".
Contudo, acrescenta, a Autoridade Nacional de Protecção Civil pediu um reforço de meios para combater estes incêndios devido às condições meteorológicas, mas não obteve "plena autorização a nível superior", e a actuação do Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM) foi "limitada" por falhas na rede de comunicações.