Ilegal é não distinguir o que é diferente

Um professor que é contratado só para dar aulas é diferente de um professor que é contratado para dar aulas e investigar.

A recente polémica em que universidades são acusadas de fazerem contratos ilegais com professores a tempo parcial resulta da falta de compreensão quanto à existência de vários perfis de docentes universitários.

Com efeito, a sociedade portuguesa sabe que os professores universitários não são só para dar aulas. Compete-lhes também fazer investigação científica, descobrindo e desenvolvendo novas ideias, conceitos e tecnologias. Compete-lhes ainda fazer extensão universitária, colaborando no desenvolvimento de instituições e empresas que tragam prosperidade e bem-estar ao país. Para além de trabalharem na gestão da própria universidade. Resulta daí que, embora tenham um horário semanal de 35 horas como todos os trabalhadores, apenas lhes sejam exigidas seis a nove horas de aulas por semana, porque o resto do tempo é utilizado em outras tarefas.

Mas há alguns professores universitários que são contratados só para dar aulas, num regime a tempo parcial que a lei prevê para este efeito. Eles não são verdadeiramente professores universitários, porque a sua profissão principal é outra, mas colaboram a tempo parcial com as universidades. São exemplo os milhares de médicos hospitalares que ajudam nos cursos de Medicina. São médicos a tempo inteiro nos hospitais mas colaboram com as universidades ao transmitir aos estudantes de Medicina, em algumas horas por semana, o seu saber e experiência na prestação dos cuidados de saúde. Naturalmente, só colaboram nessa atividade de ensino: não fazem, nem se lhes pode pedir que façam, investigação ou extensão na universidade, ou ainda menos que participem na gestão dessa universidade, porque a sua profissão é outra.

O mesmo se passa em praticamente todas as outras áreas do saber: é importante que haja engenheiros que levem aos estudantes a experiência do exercício diário da engenharia, gestores do exercício diário da gestão, psicólogos da psicologia, advogados e juízes da aplicação da justiça, etc., etc. Um curso superior que não permitisse aos estudantes contactar com aqueles que exercem diariamente a profissão seria um curso a que faltaria uma parte muito importante.

Esses profissionais são tipicamente contratados pelas universidades como professores a tempo parcial. Não fazendo investigação científica nem extensão universitária, a referência para determinar o número de horas que devem lecionar não pode ser as seis a nove horas semanais de aulas de quem tem essas outras tarefas, mas sim o número de horas de aulas semanais de quem apenas se dedica ao ensino. Os professores do ensino básico e secundário, por exemplo, lecionam 22 horas por semana.

Não se pode assim usar como referência, para professores a tempo parcial que estão na universidade só para dar aulas, as seis a nove horas de um professor a tempo integral, que dá aulas mas também investiga. Se as seis a nove horas de aulas por semana e respetiva preparação, avaliação e acompanhamento ocupassem as 35 horas de trabalho de um docente universitário, nada sobraria para a investigação e extensão. Estas atividades teriam de ser executadas fora do horário de trabalho e, portanto, não se poderia pedir a nenhum professor universitário que fizesse investigação, pois ninguém pode ser obrigado a trabalhar fora do seu horário de trabalho.

Tem de se tratar por igual o que é igual, e de forma diferente o que é diferente. Um professor que é contratado só para dar aulas é diferente de um professor que é contratado para dar aulas e investigar. Na Universidade de Coimbra temos regras diferentes para calcular o número de horas letivas para cada um desses casos, e ambas são inteiramente legais.

O autor escreve segundo o novo Acordo Ortográfico

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