Depois de dias de violência vai-se gritar em Roma "fascismo nunca mais"

Campanha eleitoral, “atravessada por uma série de actos de violência política como há muito não se via”, entra na recta final, com várias manifestações contra o racismo e a xenofobia previstas para a capital.

Imagens da noite de Turim, depois dos confrontos entre manifestantes antifascistas e a polícia
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Imagens da noite de Turim, depois dos confrontos entre manifestantes antifascistas e a polícia Alessandro Di Marco/EPA
As campas dos homens que protegiam Aldo Moro
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As campas dos homens que protegiam Aldo Moro Alessandro Di Meo/EPA

A uma semana das eleições de 4 de Março, Roma vai acordar este sábado com as ruas do centro cortadas e pelo menos 3500 polícias mobilizados e especialmente atentos a infiltrados. É dia de quatro manifestações contra o racismo e a xenofobia e chega no fim de uma semana marcada por violência entre grupos de extrema-direita e extrema-esquerda ou activistas de defesa dos imigrantes. A noite de quinta para sexta-feira foi de guerrilha em Turim, com polícias feridos e o Ministério do Interior a descrever “factos gravíssimos”.

No início do mês, o militante de extrema-direita Luca Traini abriu fogo contra seis imigrantes africanos de diferentes nacionalidades na cidade de Macerata, no Centro do país. Os líderes da direita, como Silvio Berlusconi (Força Itália), que não pode ser eleito mas conta influenciar a escolha do novo líder, ou Matteo Salvini (Liga), condenaram os disparos mas responsabilizaram os mais de 600 mil imigrantes chegados a Itália nos últimos cinco anos, que prometem deportar.

Há duas semanas, nenhum dirigente importante participou numa manifestação contra o racismo em Macerata e a cidade fechou as portas com medo de violência. Receios não infundados se olharmos para os últimos dias.

Em Turim, dezenas de manifestantes que se descrevem como antifascistas envolveram-se em confrontos com a polícia ao tentarem alcançar um comício do partido fascista CasaPound (nunca foram eleitos para o Parlamento nacional, mas tiveram 9% nas municipais de Novembro, na capital). Os manifestantes foram afastados do hotel do comício com canhões de água e gás lacrimogéneo mas alguns levavam cocktails Molotov e bombas artesanais com pregos, tendo deixado três polícias feridos.

Nos dias anteriores, os confrontos repetiram-se, de Perugia a Palermo, passando por Roma. Em Perugia, um voluntário do movimento comunista Poder ao Povo foi ferido com quatro cortes nas costas e no pescoço quando pendurava cartazes e acusa membros do CasaPound. “Nós é que somos as vítimas”, dizem os militantes de extrema-direita, que garantem ter sido eles os atacados quando colavam material de campanha.

Em Palermo, o líder de outro partido de extrema-direita, Força Nova, foi vítima de uma agressão, enquanto em Roma foram profanadas as campas (em renovação) dos polícias que faziam a escolta de Aldo Moro (ex-primeiro-ministro raptado e morto pelo grupo de extrema-esquerda Brigadas Vermelhas), mortos, como ele, em 1978. À frase "Morte aos polícias" foram acrescentadas duas suásticas.

De Nápoles chegam imagens de guerrilha como as de Turino, mas envolvendo a extrema-direita, de um lado, contra polícias e antifascistas, do outro. E também em Roma, 20 membros dos fascistas do Força Nova tentaram irromper no plateau da emissão do programa Dimartedí, do canal privado La7, para tomarem a palavra à força.

Mas o que se passa?

“Mas o que se passa?”, questiona-se o jornal de esquerda La Repubblica. “Nesta época de enorme desencantamento face aos partidos e às instituições públicas, a campanha eleitoral acaba por ser atravessada por uma série de actos de violência política, como há muito não se via”, escreve. Nas últimas semanas, a imprensa passou de se preocupar com o “regresso do fascismo” dos anos 1930 e evoca agora “os anos de chumbo”, com a violência de extrema-esquerda e direita entre o fim dos anos 1960 e 1980.

“Para quando um primeiro morto?”, pergunta em título o jornal Il Tempo, nostálgico de um passado que teima em ameaçar regressar, e de dedo acusador para a esquerda, que diz “soprar nas brasas do antifascismo para desencadear uma violência digna dos anos 1970”. Num tom bem diferente, o Corriere della Sera apela à calma recordando que “a Itália é um país onde a violência política fez imensos estragos”. “É evidente que fascismo e antifascismo não se podem colocar no mesmo plano. Mas a violência nunca é justificada. Em nome de nada”, escreve.

Os romanos esperam que os manifestantes convocados por associações de apoio a imigrantes, a ANP (Associazione Nazionale Partigiano, nascida da resistência durante a II Guerra Mundial) ou partidos como o Livres e Iguais, do antigo juiz Pietro Grasso, tenham em conta os apelos à calma. As autoridades esperam pelo menos 20 mil pessoas nas ruas para gritar “Fascismo nunca mais”, com milhares a virem de outras zonas de Itália.

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