Marcelo e os puxões de orelhas ao Governo: “Há momentos em que é preciso furar o balão”

Caixa Geral de Depósitos, incêndios trágicos e veto à lei do financiamento são os três momentos “cruciais” em que o Presidente da República assume ter tido de exercer a sua autoridade.

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LUSA/JOÃO RELVAS
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No dia em que faz dois anos que foi eleito, Marcelo Rebelo de Sousa não resistiu a comentar a sua actuação do Presidente da República, sobretudo nos “três ou quatro momentos cruciais” em que teve de exercer a sua “autoridade”. Esses momentos foram, segundo o próprio, o episódio das declarações de rendimentos dlos anteriores administradores da CGD, as tragédias dos incêndios e o veto à lei do financiamento dos partidos. “Há momentos em que é preciso furar o balão” do desconforto social, explicou aos jornalistas.

O balanço surgiu já no fim da “aula” que deu na Escola Secundária de Camarate (Loures), em resposta a uma das perguntas “selvagens” a que quis responder depois das pré-programadas. Uma aluna perguntou-se como se sentia sendo uma pessoa afectuosa, e Marcelo respondeu aludindo às críticas que alguns lhe fazem sobre esse aspecto: “Há quem diga que é artificial, não é, sou assim desde pequenino. […] E há quem diga que tira autoridade nos momentos cruciais. Não tira”, afirmou.

E passou aos exemplos dos “momentos cruciais”. Na questão da CGD, “tive de dizer em voz alta o que pensava”. Nas tragédias, as intervenções que fez “não eram contra nada nem ninguém, mas porque havia riscos de descolagem” com as populações. E no veto à lei do financiamento dos partidos? “Fui o mais comedido possível, nem expus a minha posição, que é ultraminoritária. Apenas pedi: não se importam de explicar o que se passou? E começou a ser explicado”.

À saída, aos jornalistas, explicou ainda mais: “Há momentos em que é preciso furar o balão, quando há na sociedade portuguesa uma sensação de desconforto, de incompreensão perante determinada realidade importante”. Mas salientou que são “situações extremas” que não aconteceram muitas vezes. “Têm sido dois anos muito estáveis, política, económica e financeiramente e mesmo em termos sociais. Isso não é mérito do Presidente da República, é largamente mérito dos portugueses, do Governo, do Parlamento, das forças económicas, sociais e políticas”, realçou.

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Marcelo quis ainda dizer que falou desses momentos para explicar que “o Presidente sabe quais são os seus poderes constitucionais, cinge-se a eles, como fizeram todos os seus antecessores”. “Eu como professor de Direito Constitucional e constituinte, por maioria de razão”, frisou.

Tancos não foi um dos momentos cruciais referidos, mas questionado pelo PÚBLICO sobre a sua posição face à tentativa de encerrar o assunto com quatro processos disciplinares, o chefe de Estado reiterou a sua posição: “As instituições competentes devem cumprir a sua missão, que é reportar aquilo que possam apurar sobre o que sucedeu e tentar, na medida do possível, verificar se há ou não matéria para procedimento judicial”.

Questionado sobre as relações com Angola e a reunião que o primeiro-ministro português teve com o Presidente daquela república popular, Marcelo Rebelo de Sousa voltou a esvaziar o balão. “Aquilo que eu sei, sabemos todos, é que correu muito bem essa reunião. Não há nenhum problema relativamente aos trabalhadores portugueses em Angola e angolanos em Portugal, não há nenhum problema nem haverá com empresas e empresários, cidadãos e instituições, quanto ao dia-a-dia do relacionamento entre os países, e isso é muito importante”.

E desvalorizou o congelamento das viagens de Estado, assumido por António Costa. “O que os portugueses e os angolanos querem saber é se as relações dos povos, se as relações económicas, sociais e empresariais melhoram, continuam como têm sido ou pioram. E a resposta está dada: não pode deixar de melhorar e é isso que é assumido pelos dois países. O que seria preocupante é se houvesse algum problema em termos de relacionamento económico, financeiro, social, cultural ou diplomático. Não há nem vai haver”, garantiu.

O Presidente começara a aula a fazer perguntas. Desafiou os alunos a dizer quais os maiores problemas do país e o que estavam dispostos a fazer para os resolver. Quando lhe perguntaram o que eles, jovens, podiam fazer para mudar o mundo, devolveu-lhes a questão: “Em democracia cada qual escolhe qual o caminho que quer seguir. Escolham o vosso caminho. O somatório dessas partículas de acção faz revoluções”.

Pelo caminho, comparou a vida política portuguesa no último ano a uma montanha russa, “de coisas boas e coisas menos boas”, e considerou que “Portugal está a mudar para melhor”, mas que “é preciso ir mais depressa” e “não tapar com o dedo o sol”.

Questionado sobre como gostaria de ser lembrado, respondeu: “Primeiro, ter sido um bom pai e um bom avô; em segundo lugar, por ter sido um bom professor e depois, sendo caso disso, ter cumprido a missão, nomeadamente, esta missão, o melhor que tinha podido. Se for estes três, já não é mau".

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