Espanha não tem assegurado os caudais acordados para o Douro, Tejo e Guadiana

Segundo a associação ambientalista Zero, a convenção ibérica para gestão de caudais deve ser revista.

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O Tejo é um dos rios afectados pela gestão espanhola dos caudais, dizem os ambientalistas da ZERO Nuno Ferreira Santos

A Zero – Associação Sistema Terrestre Sustentável defendeu nesta segunda-feira a revisão e melhoramento da Convenção de Albufeira entre Portugal e Espanha, alertando que o país vizinho não tem assegurado todos os caudais acordados para os rios Douro, Tejo e Guadiana.

A vice-presidente daquela associação ambientalista, Carla Graça, indicou que avaliaram os registos dos caudais destes rios em 2016 e 2017 e concluiu-se que houve períodos em que não foram assegurados os caudais.

Estes dados são anunciados no primeiro de dois dias da reunião plenária (que vai decorrer, no Porto), da Comissão para a Aplicação e o Desenvolvimento da Convenção sobre a Cooperação para a Protecção e o Aproveitamento Sustentável das Águas das Bacias Hidrográficas Luso-Espanholas – Convenção de Albufeira, na qual participam os ministros do Ambiente de Portugal e de Espanha.

“Verificámos que os caudais acordados não têm sido assegurados por Espanha, e também que, por vezes, ou a água é retida ou demasiado aberta, o que provoca flutuações que não são adequadas” para Portugal, disse à Lusa a mesma responsável da Zero, que tem a seu cargo a área dos recursos hídricos.

Na sexta-feira, a propósito do encontro com o seu homólogo espanhol, o ministro do Ambiente, João Pedro Matos Fernandes, afirmou que pretende começar a discutir com o país vizinho a “gestão comum das águas”, admitindo tratar-se de um “problema” que o preocupa.

A Zero analisou os caudais dos três rios e identificou que no rio Douro Espanha não assegurou o caudal integral anual de 3500 hectómetros cúbicos no último ano hidrológico, entre 1 de Outubro de 2016 e 30 de Setembro de 2017, ao contrári do previsto no regime de caudais convencionado. No entanto, “assegurou sempre os caudais integrais trimestrais e semanais, que, mesmo cumpridos, podem resultar num caudal integral anual muito mais reduzido”, indicou.

No rio Tejo, “houve uma semana, em Setembro de 2017, em que não foi respeitado o caudal semanal integral”, indicou ainda.

Quanto ao rio Guadiana, “no último ano hidrológico, entre 1 de Outubro de 2016 e 30 de Setembro de 2017, houve 38 dias em que não foi respeitado o caudal afluente médio diário de dois hectómetros cúbicos, tendo ocorrido mais seis dias sem se atingir esse valor desde 1 de Outubro de 2017”.

A Zero defende que o acordo entre Portugal e Espanha “deve ser revisto e melhorado, aplicado de forma transparente, e mais fiscalizado”, salientou Carla Graça.

Pela análise que a associação fez dos dados dos caudais integrais afluentes diários de cada um dos rios, concluiu ainda que “Espanha não faz uma gestão equilibrada à escala semanal, com dias quase sem água a passar para Portugal, compensados por dias com volumes muito maiores para atingir os mínimos acordados”.

A Zero também defende “o estabelecimento de volumes de água mínimos diários, que devem ser contextualizados com valores de caudais semanais que sejam pelo menos o dobro dos actualmente em vigor para os rios Douro e Tejo”. Na sexta-feira, no Porto, o ministro do Ambiente tinha afirmado que Espanha podia enviar água para Portugal de forma mais homogénea.

“Sei que nunca se aproveita um ano de seca para renegociar caudais, chama-se a isso ir à lã e sair de lá tosquiado”, referiu, salientando, contudo, que gostaria de começar a abordar a gestão comum das águas no encontro.

O ministro acrescentou, na altura, que também Portugal “cumpre com as suas obrigações” no rio Guadiana que, embora nasça em Espanha, “Portugal é mais o Estado montante do que jusante, porque a grande reserva de água está em Portugal e chama-se Alqueva”.

Matos Fernandes afirmou que o encontro programado para o Porto é uma “reunião corrente” da comissão dos dois países que têm por responsabilidade fazer o acompanhamento da Convenção de Albufeira, adiantando que vai também “associar a esse momento uma possibilidade de uma discussão pública, técnica e científica em torno daquilo que são as problemáticas dos recursos hídricos entre Portugal e Espanha”.

A convenção, assinada pelos dois países na Cimeira de Albufeira em 30 de Novembro de 1998 e em vigor desde Janeiro de 2000, define as normas para a protecção e o desenvolvimento sustentável das águas transfronteiriças e criou a Comissão para a Aplicação e o Desenvolvimento da Convenção (CADC), sede adequada à coordenação da gestão das águas dos rios comuns.