Retornados do Daesh levam a jihad para os seus países
O regresso a casa dos militantes que combateram por Al-Baghadi no Iraque e na Síria é um sério desafio à segurança e estabilidade do Egipto.
Os especialistas já tinham feito soar o sinal de alarme no início do ano: o regresso ao Egipto dos combatentes recrutados por grupos jihadistas e que se encontravam dispersos em frentes como a Líbia, a Síria e o Iraque, poderia agravar o risco de terrorismo e tornar-se um dos mais sérios desafios à segurança e estabilidade do país.
A multiplicação de incidentes em território egípcio justificava o alerta – bem como o facto de os peritos terem encontrado a “impressão digital” das brigadas que se juntaram ao Daesh em todos os ataques recentes. Nabil Naeem, um especialista em grupos jihadistas que já esteve do outro lado da barreira, na militância radical, não tem dúvida sobre a relação de causa e efeito entre as derrotas da organização terrorista liderada por Abu Bakr al-Baghadi, o retorno a casa de “jihadistas endurecidos por anos de combate em terrenos voláteis” e a sucessão de atentados.
À medida que o Daesh perde território na Síria e no Iraque, ou é obrigado a retirar da Líbia, “estes homens começam a voltar a casa e a trazer a jihad para o seu próprio país. O risco para a segurança do Egipto é muito tangível”, disse Nabil Naeem ao The Arab Weekly.
O Egipto não foi dos maiores países fornecedores dos cerca de 30 mil militantes estrangeiros que se juntaram ao Daesh, mas sabe-se que serviu como uma das plataformas de recrutamento do grupo, e como os seus vizinhos do Norte de África é um dos locais mais vulneráveis ao estabelecimento de redes ou células clandestinas – como escrevia a BBC há apenas um mês, fora do seu auto-proclamado “califado”, o Daesh tornou-se uma “organização amorfa e descentralizada, a operar de forma mais assimétrica” mas com a mesma “veemência”.
Além dos combatentes nacionais, vários militantes originários da Tunísia, Jordânia ou Arábia Saudita poderão aproveitar o facto de poder entrar no Egipto sem ser detectados pelas autoridades. “A maior parte não tem registo criminal no Egipto. Além disso, conseguem entrar em segredo”, notou Naeem àquele semanário árabe editado a partir de Londres.
Os combatentes retornados do Daesh beneficiam da estrutura já montada pelos grupos militantes na Península do Sinai que é, segundo as informações recolhidas pelos serviços secretos norte-americanos e britânicos, um dos destinos preferidos pela liderança do movimento radical sunita para o estabelecimento de “províncias”, ou wilayat (os outros pontos privilegiados são o Iémen, a região Norte do Cáucaso e as Filipinas).
É mais uma ameaça no radar das autoridades egípcias, que na área do Sinai já lidavam com grupos extremistas salafistas e facções formadas a partir da Al-Qaeda, a grande rival do Daesh: é o caso do Jund al-Islam, que é actualmente dirigido pela Al-Qaeda no Iémen; o Al-Murabitun, constituído por um antigo oficial do Exército egípcio ou o Ainad Mirs (os Soldados do Egipto), que tal como os restantes, ataca preferencialmente alvos militares.
Mas um desses grupos, inicialmente baptizado como Ansar Beit al-Maqdis (os Apoiantes de Jerusalém), trocou a sua aliança e mudou de nome em Novembro de 2014: é agora a Província do Sinai, com um número de combatentes que pode andar entre os mil e os 1500 e células no Cairo e em Gizé.
Depois de vários ataques no Suez, o grupo no Sinai disparou um rocket que fez explodir um navio de patrulha junto à costa do Mar Vermelho repleta de estâncias procuradas por turistas ocidentais. Em Novembro, reivindicou o abate do avião de passageiros russo que levantou de Sharm el-Sheikh com 224 pessoas a bordo – um “acto de guerra” para o Governo egípcio, que declarou o estado de emergência ainda em vigor naquela região (que faz fronteira com Israel e a Faixa de Gaza).
A estratégia mudou depois desses dois actos “espectaculares”, concentrando-se agora em pequenas acções localizadas e muito frequentes: o site Al-Araby al-Jadid, que monitoriza as actividades do grupo, reportou mais de 31 ataques realizados no Sinai no intervalo de apenas duas semanas em Março de 2016.
O grupo montou um departamento de propaganda muito activo nas redes sociais, onde são divulgados vídeos de recrutamento e aconselhamento da população – por exemplo a nunca cooperar com as autoridades, ou a revoltar-se contra o Governo do Presidente Abdul Fattah al-Sissi.