Liberais ameaçam candidatura de Centeno
Os governos socialistas são cada vez menos na União Europeia. Isso põe em causa a eleição de Centeno para liderar a zona euro.
O Governo português ainda não tomou a decisão sobre se candidata o ministro das Finanças, Mário Centeno, à presidência do Eurogrupo, cujas candidaturas têm de ser entregues até ao fim de Novembro. E a força dos liberais, aliados ao Partido Popular Europeu (PPE), partidos cujo ideário político-económico tem proximidades, poderá comprometer as pretensões portuguesas.
Com a eleição a 4 de Dezembro, por maioria simples, do ministro que irá substituir o holandês Jeroen Dijsselblöem, “os contactos prosseguem” para medir as possibilidades reais de eleição de Centeno, diz um responsável que tem acompanhado as negociações. Em causa está a correlação de forças entre famílias políticas no espaço da União Europeia, já que é desse jogo de equilíbrios políticos que depende a eleição do ministro que irá presidir aos destinos da zona euro.
Entre o grupo socialista a escolha do português parecia pacífica. Sobretudo quando entre os países que integram o Eurogrupo apenas dois governos socialistas tinham manifestado pretensões ao cargo: o português e o italiano. O facto de ser já um italiano, Mário Draghi, a presidir ao Banco Central Europeu – que participa nas reuniões do Eurogrupo por inerência – fazia com que as fichas socialistas no jogo da escolha da liderança do Eurogrupo recaíssem sobre o nome de Centeno.
Mas a partir do momento em que o eslovaco Peter Kazimír manifestou a intenção de se candidatar, o jogo mudou. Kazimír é visto como tendo um posicionamento político-económico mais ao centro do que Centeno e por isso é um candidato mais facilmente aceite pelos liberais e pelo PPE – e com vantagem de ser de Leste, para onde Jean-Claude Juncker quer alargar a zona euro. Um responsável do Governo desvaloriza: entre os socialistas, Kazimír não foi o escolhido, nota, admitindo que “a diplomacia é um jogo difícil de seguir”.
Mas se o problema em relação à escolha de Centeno é complicado no universo dos 19 países do Eurogrupo, a situação torna-se ainda mais complexa no âmbito do Conselho Europeu. O universo de países alarga-se aí para 27 e os primeiros-ministros socialistas são cada vez menos, depois de na Áustria e na República Checa terem perdido as eleições recentemente.
Isto, quando, também este ano, em França e na Holanda os socialistas foram desalojados do poder em eleições. É, aliás, a derrota eleitoral dos socialistas holandeses que leva à obrigatoriedade de substituição de Dijsselblöem, uma vez que o presidente do Eurogrupo tem que ser sempre um ministro das Finanças a cumprir o seu mandato nacional. Restam assim como potenciais apoiantes de Centeno os chefes de Governo de Estados-membros como Malta, Itália, Suécia e Grécia (com o ministro de Tsipras a ser apontado como “amigo” em Lisboa). O PPE, por seu lado, tem oito ministros no Eurogrupo. Os liberais dois. Os restantes quatro são independentes, mas dois de governos mais à direita (sobretudo a Letónia, que tem candidata ao cargo). Contas feitas, mesmo que Espanha apoie Centeno, a maioria parece difícil de assegurar.
Foi a gestão destes equilíbrios, primeiro dentro dos socialistas, depois em relação ao PPE e aos liberais, que levou o primeiro-ministro, António Costa, a fazer declarações muito prudentes, na sexta-feira, no final da Cimeira Social de chefes de Governo da União Europeia, em Gotemburgo, na Suécia. “Vamos ver. Neste momento, o prazo de candidaturas abriu hoje, temos até dia 30 para tomar uma decisão. Cada coisa no seu devido momento. Há várias possibilidades sobre o futuro do Eurogrupo, sobre o futuro da sua presidência, e portanto tomaremos a decisão no momento próprio”, afirmou Costa no final de uma reunião de líderes europeus em que a substituição do presidente do Eurogrupo não foi oficialmente tratada, mas terá integrado as conversas de bastidores.
Ainda a 15 de Setembro, em Tallin, Mário Centeno tinha assumido a sua disponibilidade para dizer presente na corrida pela liderança do Eurogrupo. O ministro das Finanças português disse então à RTP: “Precisamente porque estamos convictos de que a participação europeia tem que ser activa e é uma participação com ideias, com ideais, é evidente que estaremos presentes também nesse momento.” Era a manifestação de uma disponibilidade para uma candidatura que pode não chegar a ver a luz do sol.