Isabel dos Santos faz despedida pública e diz que salvou Sonangol
Filha do ex-Presidente diz que conseguiu “reequilibrar as contas” e “acabar com práticas nefastas do passado”. Jornal de Angola cita relatório e fala de “quase paralisia da indústria petrolífera” devido à Sonangol.
Os dias em Luanda são de chegadas e de despedidas do poder, moldadas pelas mudanças que o novo Presidente, João Lourenço, está a introduzir nas principais empresas públicas e que atingem os filhos do seu antecessor.
Esta quinta-feira, foi a vez de Carlos Saturnino chegar oficialmente ao topo da Sonangol, o maior grupo do país e, como lhe chamou João Lourenço, a “galinha dos ovos de ouro” de Angola.
No sentido oposto, Isabel dos Santos despediu-se da presidência do conselho de administração da petrolífera nacional, para a qual fora chamada pelo seu pai, José Eduardo dos Santos, no ano passado.
Usou primeiro as redes sociais para alargar o âmbito da despedida — neste caso o Instagram — e aproveitou para deixar um recado através de um vídeo. “Nestes últimos 17 meses houve mudanças tremendas”, afirmou, para logo dizer que “a memória é curta”. “Havia momentos em que nós sabíamos de coisas que tínhamos medo até de partilhar convosco porque não queríamos que percebesse o quão dramático era realmente a situação da nossa empresa”, referiu.
Acabou por explicar como está agora a petrolífera através de um comunicado enviado às redacções ao final da tarde. Segundo Isabel dos Santos, ela e a sua equipa conseguiram “reequilibrar as contas” e “acabar com práticas nefastas do passado”.
Em Dezembro de 2015, diz, “a Sonangol, pela primeira vez na sua história, não tinha conseguido cumprir com as suas obrigações junto da banca” e acabaria por estar em “situação de pré-falência”. De seguida, enunciou o trabalho que diz ter feito, como o cumprimento de pagamentos devidos, redução da dívida financeira e custos, e aumento de receitas. Ao seu sucessor, diz deixar pronta a assinar uma linha de financiamento de dois mil milhões de dólares.
Isabel dos Santos também falou directamente para João Lourenço: “Congratulo o novo executivo pelo desejo de progresso, transparência e eficácia na gestão do bem público. Os mesmos valores mantêm-se no centro da cultura empresarial que a administração cessante implementou na Sonangol, garantindo, assim, o futuro da nossa empresa”.
O conteúdo desta despedida contrastou com o que surgiu em Luanda associado ao relatório sobre o sector petrolífero pedido há um mês por João Lourenço, e que foi entregue esta semana por Saturnino, antes de ser anunciada a sua escolha para a Sonangol.
De acordo com a edição desta quinta-feira do Jornal de Angola, o órgão oficial do governo, a “principal constatação” do relatório é a de que há “uma quase paralisia da indústria petrolífera, em resultado de processos de gestão extremamente burocratizados e ineficientes”.
Este jornal diz ainda que o relatório menciona uma “concessionária nacional sem liderança e sem estratégia para desenvolver o papel de impulsionadora da indústria petrolífera”, com um “mau relacionamento” com as outras petrolíferas e “falta de sintonia” com a tutela.
Saturnino, que ficou encarregue do relatório na qualidade de secretário de Estado do Petróleo do novo executivo, é claramente antagónico a Isabel dos Santos, depois de esta o ter retirado de forma abrupta da presidência da Sonangol Pesquisa & Produção no final do ano passado.
O cargo deixado vago por Saturnino no Governo foi ocupado por Paulino Jerónimo que, até ser afastado há pouco tempo por Isabel dos Santos, era presidente da comissão executiva da Sonangol.
Esta quinta-feira, na tomada de posse de Saturnino e de Jerónimo, Lourenço nada disse sobre Isabel dos Santos. O Presidente destacou que a Sonangol continua a ser a “galinha dos ovos de ouro” da economia do país, e que a “sua administração vai exigir maior responsabilidade dos novos gestores”. “Devem cuidar bem dela”, afirmou Lourenço.
A ocasião serviu também para o Presidente angolano destacar que o país tem de avançar no curto prazo para mais uma refinaria de petróleo — projecto há muito pensado mas ainda mais adiado, seja com capital público ou privado.