Governo tentou parar greve dos professores, mas não teve êxito
Negociações com sindicatos sobre a contagem do tempo de serviço vão prosseguir na quinta-feira. Governo fala de "avanços no sentido de um potencial acordo negocial".
Esta tem de ser “uma greve histórica”, exortou o líder da Federação Nacional de Professores (Fenprof), Mário Nogueira, referindo-se à paralisação convocada para hoje por todos os sindicatos de docentes e cuja adesão considerou como “determinante” para que o Governo venha a aceitar que todo o tempo de serviço dos professores conte para efeitos de progressão.
O líder da Federação Nacional da Educação (FNE), João Dias da Silva, repetiu o apelo. Ambos falavam à saída das reuniões realizadas ontem, a partir das 15H30, com a Secretária de Estado Adjunta e da Educação, Alexandra Leitão, e a do Emprego Público, Maria de Fátima Fonseca, que foram convocadas sem aviso prévio de manhã, portanto a 24 horas da greve. “Estamos a pedir uma reunião desde 12 de Outubro”, lembrou a propósito Mário Nogueira.
À noite, os Ministérios da Educação e das Finanças divulgaram um comunicado a anunciar que as negociações com os sindicatos serão retomadas na quinta-feira, adiantando que nas reuniões de ontem foram registados “avanços no sentido de um potencial acordo negocial”.
O pomo da discórdia, na base desta greve, centra-se na proposta de Orçamento de Estado para 2018 que não assegura aos professores que todo o seu tempo de serviço realizado durante o período do congelamento das carreiras (2005-2007 e 2011-2017) seja contado para efeitos de progressão.
Esta questão estará no centro do debate na especialidade do Orçamento de Estado marcado para hoje no que respeita à educação e que será feito sem a presença do ministro da Educação. Tiago Brandão Rodrigues foi ontem internado por tempo indeterminado com síndrome vestibular agudo.
Este diagnóstico, que pode estar associado a “variadíssimas causas”, provoca tonturas, vertigens, náuseas e vómitos, explicou ao PÚBLICO o médico Artur Condé.
Seiscentos milhões de euros
De volta à proposta de Orçamento de Estado, refira-se que o Governo argumenta que a situação dos professores (e de outras carreiras cuja progressão assenta no tempo de serviço) é o resultado da forma com o Orçamento do Estado para 2011 congelou as progressões e salvaguardou os direitos adquiridos.
No final das reuniões de ontem, tanto a Fenprof como a FNE indicaram que “não ficou fechada a porta, por parte do Governo, para que todo o tempo de serviço venha a ser contado para efeitos de progressão”. O líder da FNE, João Dias da Silva, precisou que o executivo estaria disponível para contabilizar este tempo entre 2011 e 2017, mas que não tinha a mesma posição para o período entre 2005 e 2007, frisando que a FNE só aceitaria uma solução que contasse com todo este tempo.
Mário Nogueira disse o mesmo: “o tempo de serviço não se negoceia, conta-se”. Ambas as estruturas sindicais indicaram que uma nova proposta do Governo poderá passar pelo faseamento das progressões (ou seja, garantindo que esta existe para todos os docentes, mas que será feita de modo espaçado no tempo), uma solução que estão dispostos a negociar tendo em conta “o esforço orçamental” que representaria a promoção de todos os mais de 100 mil professores do quadro de uma só vez, indicou Mário Nogueira.
De acordo com as contas do Governo, considerar o tempo de serviço dos professores durante o período do último congelamento (2011-2017) e integrá-los nos escalões correspondentes logo a 1 de Janeiro (sem qualquer faseamento) custaria 600 milhões de euros, tanto quanto se prevê gastar com o descongelamento das progressões de toda a Administração Pública. Se a medida fosse alargada a outras carreiras que estão em situação semelhante, o custo disparava para um milhão de euros.
A estes valores não é alheio o facto de 60% dos 220 mil trabalhadores com modelos de valorização remuneratória assentes no tempo de serviço serem professores.
Segundo os sindicatos de professores, se a actual proposta de OE for por diante, um docente terá de ter 50 anos de serviço para chegar ao topo da carreira, o 10.º escalão onde actualmente ainda não se encontra colocado nenhum destes profissionais.
No debate na generalidade do OE no Parlamento, o primeiro-ministro, António Costa, explicou deste modo o que se passa com os professores: "Há uns casos em que conta simplesmente o tempo, noutros casos em que há uma valoração do mérito. Há um problema impossível de resolver que tem a ver com tempo que não foi contado naquelas carreiras cuja progressão assenta exclusivamente no tempo”.
Numa carta aberta que lhe foi dirigida depois, a FNE lembrou que os professores, durante o tempo em que a carreira esteve congelada, “cumpriram os deveres a que estão obrigados”, “frequentaram as acções de formação contínua que o seu estatuto de carreira determina”, “fizeram relatórios críticos da sua actividade” e “tiveram aulas observadas” para efeitos de avaliação.
A manter-se o que está previsto, a FNE considerou também que estará em causa “a aplicação do princípio da igualdade” previsto na Constituição.
Progressão já para 46 mil
O modelo desenhado pelo Governo – e que os sindicatos contestam – abrange 46 mil professores que mudam de posição remuneratória porque quando foi imposto o congelamento em 2011, já cumpriam os critérios (pelo menos quatro anos de serviço, nota “bom” na avaliação e um determinado número de horas de formação). A estes somam-se sete mil professores contratados, que entraram para os quadros durante o período de congelamento e que não foram colocados no escalão correspondente.
A progressão do primeiro grupo custa 90 milhões de euros em 2018 (um terço do valor destinado às progressões em todo o Estado), mais 83 milhões em 2019, a que se somam no ano seguinte 30 milhões e mais 60 milões em 2021. O impacto é diferido no tempo porque o pagamento do acréscimo remuneratório associado à progressão chegará em quatro momentos diferentes. Já o reposicionamento dos sete mil docentes terá um custo de 20 milhões de euros.
O Governo prevê ainda publicar a portaria que vai regulamentar o acesso ao 5.º e 7.º escalão da carreira docente, que depende da existência de vagas. De acordo com os dados executivo, há 14 mil professores no quarto escalão à espera de transitar para o quinto e oito mil parados no sexto escalão. O número de vagas ainda vai ser negociada com os sindicatos, mas o objectivo do executivo é ter a portaria em vigor a 1 de Janeiro do próximo ano.