Consumidores pagaram mais 510 milhões de euros com a introdução dos CMEC
Os CMEC introduziram “um quadro menos exigente” para os produtores e mais custos para os consumidores, diz a ERSE.
Com a substituição dos contratos de aquisição de energia (CAE) pelos novos contratos que entraram em vigor em Julho de 2007, os consumidores de electricidade pagaram a mais 510 milhões de euros. As contas são da ERSE e foram incluídas no estudo do ajustamento final dos custos para a manutenção do equilíbrio contratual (CMEC) que ontem foi entregue ao Governo.
O estudo calculou o valor dos pagamentos a fazer à EDP até 2027, mas não deixou de olhar para o que aconteceu nos dez anos em que o mecanismo de compensação esteve em vigor. Ainda assim, os custos adicionais que os CMEC introduziram nas tarifas da luz não foram uma grande surpresa para a entidade reguladora. Em 2004, antes do diploma dos CMEC ser aprovado, a ERSE já tinha alertado o Governo para o facto de o mecanismo não assegurar a neutralidade face aos CAE (contratos que tiveram de desaparecer no processo de liberalização do mercado de electricidade), traduzindo-se, na prática, em novos encargos. Os avisos caíram em saco roto, mas no ano seguinte a entidade reguladora (presidida então por Jorge Vasconcelos) voltou à carga, quantificando os custos extra dos CMEC em pelo menos 600 milhões de euros.
Agora, volta a pôr o dedo na ferida, afirmando que no estudo enviado ao Governo “são identificados aspectos que a ERSE já havia explicitado aquando do parecer ao projecto de diploma” dos CMEC. Por isso, a análise que agora está nas mãos do executivo de António Costa “evidencia que a introdução do regime dos CMEC possibilitou a passagem para um quadro menos exigente para os detentores dos centros electroprodutores do que o regime dos CAE”. E que isso se traduziu num “acréscimo de custo acumulado que se estima em cerca de 510 milhões de euros”.
Um exemplo desse “quadro menos exigente” para os produtores de electricidade, é o tema dos quoficientes de disponibilidade das centrais. É que apesar dos centros electroprodutores serem pagos para estarem em regime de permanente prontidão, na prática essa disponibilidade não era verificada, embora os pagamentos fossem certos. Essa é uma das medidas em que o regulador acha que o Governo tem margem para actuar. Se a disponibilidade passar a ser paga em função daquilo que efectivamente for verificado, a ERSE considera que a medida poderá “ter um efeito de 81 milhões de euros a reverter em benefício dos consumidores”. Outra situação que pode ser corrigida a favor dos consumidores, e que a ERSE também recomendou ao Governo, passa por eliminar os ganhos financeiros que a EDP obtém pelo facto de ter uma menor taxa de juro para actualizar o valor dos seus cash-flows e uma taxa de juro superior para aplicar ao valor da renda anual. Esta arbitragem financeira terá pesado cerca de 125 milhões de euros nos últimos dez anos nos encargos dos consumidores com os CMEC.
Não foi só a ERSE a alertar para os riscos dos CMEC. Em 2004, nos primórdios da Autoridade da Concorrência (AdC), Abel Mateus encomendou à CEPA um estudo sobre o sector da energia. A passagem dos CAE para os CMEC foi um dos pontos analisados. “A distorção da concorrência é extremamente séria”, diz o estudo, que foi apresentado ao Governo, a propósito da introdução do mecanismo. Em 2005, a AdC voltaria a criticar a arquitectura dos CMEC, em particular o modo de cálculo da revisibilidade por considerar que “não afasta a possibilidade de existirem comportamentos estratégicos” na utilização das centrais protegidas com contratos. Actualmente esse é precisamente o ponto central de uma investigação que a AdC tem em curso: a investigação ao comportamento das centrais da EDP no mercado de serviços de sistema, por considerar que a empresa subutilizou as centrais protegidas de modo a ampliar os ganhos das centrais que actuam em concorrência. É por causa disto também que o Governo quer que a EDP devolva 72 milhões de euros que terá recebido a mais nas tarifas.