Governo quer cortar 170 milhões às tarifas da luz do próximo ano

Secretário de Estado da Energia revoga despacho do anterior executivo que permitiu às eléctricas repercutirem custo da tarifa social e da CESE nas facturas dos consumidores.

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Preços da luz para 2018 serão conhecidos em meados de Outubro Enric Vives-Rubio

É a guerra aberta contra a EDP. O Governo publicou ontem em Diário da República um despacho que veio declarar a nulidade parcial de um diploma que o anterior executivo fez sair a 3 de Outubro de 2015, na véspera das eleições legislativas, autorizando os produtores de electricidade a recuperarem nas tarifas da luz os custos com a tarifa social e a contribuição extraordinária sobre o sector energético (CESE).

Segundo informações recolhidas pelo PÚBLICO, em causa está um valor global que ronda os 100 milhões de euros e que foi, na óptica do actual Governo, cobrado ilegalmente aos consumidores de electricidade em 2015 e 2016, em benefício essencialmente da EDP (que lidera o mercado de produção em Portugal), mas também da Endesa.

Este é um valor que se soma aos 73 milhões de euros que o Governo estima que a EDP recebeu a mais por distorções no mercado de serviços de sistemas e que levaram à sobrecompensação de algumas das suas centrais protegidas com contratos CMEC. Este valor foi avançado ontem no Parlamento pelo secretário de Estado da Energia, que adiantou à Lusa que a empresa já foi notificada para se pronunciar sobre a devolução deste valor ao sistema eléctrico.

Relativamente ao despacho de quarta-feira, fonte oficial da EDP confirmou ao PÚBLICO que também já chegou formalmente ao conhecimento da empresa. “Sem prejuízo de nos pronunciarmos nos termos previstos no despacho, a EDP sempre cumpriu a lei”, disse fonte da empresa liderada por António Mexia. Já “a Endesa foi notificada na terça-feira ao final do dia”, adiantou o presidente da empresa, Nuno Ribeiro da Silva, remetendo outros esclarecimentos para depois de uma análise mais aprofundada do despacho. As empresas têm dez úteis dias para se pronunciarem sobre a medida.

Com a tentativa de "recuperação" dos valores que considerou indevidamente reflectidos nas tarifas de electricidade em 2015 e 2016, e a devolução que espera que a EDP faça dos 73 milhões relativos às sobrecompensações, sobe para 173 milhões o montante que o Governo pretende usar em benefício dos consumidores, recomendando que a Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) o desconte na definição dos preços da luz do próximo ano, cuja proposta de actualização vai apresentar em meados de Outubro.

Neste momento a ERSE também tem em mãos os cálculos do acerto de contas final entre os consumidores e a EDP no âmbito dos polémicos contratos CMEC, que estão no centro de uma investigação judicial. O objectivo é que esta análise que ditará quanto pagarão os consumidores à eléctrica nos próximos dez anos esteja concluída no final deste mês.

No despacho de quarta-feira (em que lembra que os diplomas da tarifa social e da CESE proíbem os produtores de energia de repercutir, directa ou indirectamente, os custos nos consumidores), o secretário de Estado da Energia, Jorge Seguro Sanches, explica que revogou o despacho assinado pelo seu antecessor, Artur Trindade, e pediu sobre ele uma série de esclarecimentos à ERSE por ter dúvidas quanto à legalidade de alguns dos seus pontos.

Nomeadamente os pontos 11 e 12, aqueles em que Artur Trindade define quais são os termos em que os produtores de electricidade podem ser compensados via tarifa por custos incorridos com a tarifa social e a taxa extraordinária da energia.

Na base destes parâmetros fixados administrativamente pelo ex-secretário de Estado do Governo PSD/CDS, está o decreto-lei de 2013 que veio criar um mecanismo regulatório tendente a “assegurar o equilíbrio da concorrência no mercado grossista de electricidade em Portugal, com incidência na componente de custos de interesse económico geral (CIEG) da tarifa de Uso Global do Sistema”. É com base neste mecanismo (que nasceu de uma tentativa de harmonizar os custos dos produtores espanhóis e portugueses no âmbito do mercado ibérico de energia) que a ERSE analisa o que são os eventos considerados “extra-mercado”, como, por exemplo, as medidas de natureza política e fiscal (como a tarifa social e a CESE), e produz um estudo em que enquadra a forma como são repercutidos nas tarifas da electricidade (ou seja, em que são fixados como custos para os consumidores e proveitos para os produtores de energia). E foi com recurso a este mecanismo que as empresas se viram compensadas de encargos com as duas medidas.

“Ponderava-se que a justificação dos referidos números [pontos 11 e 12 do despacho] em apreço pudesse encontrar-se plasmada no estudo da ERSE que legalmente o precedeu”, refere Seguro Sanches no despacho. “Porém, analisado o estudo” verifica-se que este “é omisso no que se reporta à ponderação dos custos com a tarifa social e com a CESE”. Embora considere que esta falha bastaria para determinar “a nulidade parcial” do despacho de Trindade, Seguro Sanches escreve que “a ilegalidade não se fica por aqui”.

É que segundo o governante, “a determinação por acto administrativo da repercussão nas tarifas de electricidade dos custos suportados pelos produtores com a tarifa social e com a CESE constitui a criação de uma nova contribuição pecuniária para os consumidores”. Uma contribuição que não está legalmente prevista no leque de contribuições que podem ser encaixadas dentro da tarifa de uso global do sistema. Com Leonete Botelho

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