Inspecção não detectou problemas na transferência de trabalhadores da PT

Já sobre a utilização fraudulenta da figura da transmissão de estabelecimento, como acusam os sindicatos, a Autoridade para as Condições de Trabalho remete a questão para os tribunais.

Foto
Arménio Carlos, líder da CGTP, durante a manifestação dos trabalhadores da MEO que teve lugar esta semana no Porto RUI FARINHA/Lusa

A Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT) não detectou irregularidades no processo de transferência de trabalhadores da PT/Meo para outras empresas ao abrigo da figura da transmissão de estabelecimento. A conclusão consta do relatório que faz o ponto de situação das inspecções feitas à empresa detida pela Altice entre Janeiro e Julho, enviado esta semana à comissão de trabalhadores. No documento, a que o PÚBLICO teve acesso, a ACT garante que analisou a situação de todos os trabalhadores afectados e não reuniu “matéria de facto” que sustente que os seus direitos não estão assegurados. Já sobre a utilização fraudulenta deste mecanismo para fazer um despedimento encapotado – como acusam os sindicatos – a ACT não se pronuncia, alertando que se trata de competência judicial.

A única infracção detectada nesta área tem a ver com a consulta e informação aos representantes dos trabalhadores relativamente à data e motivos da transmissão, consequências jurídicas, económicas e sociais para os trabalhadores e medidas projectadas por parte da PT/Meo e das empresas adquirentes. A ACT constatou que as empresas adquirentes não cumpriram esta obrigação e foram objecto de procedimento contra-ordenacional, estando sujeitas a coimas entre os 4000 e os 6500 euros.  

A ACT lembra que o Código do Trabalho prevê que, em caso de transmissão de estabelecimento, constitui contra-ordenação a não transmissão para a empresa adquirente da posição do empregador nos contratos dos respectivos trabalhadores. Uma norma que, acrescenta, tem como objectivo assegurar que o trabalhador mantém intactos todos os direitos que detinha, em particular a antiguidade, a retribuição ou a categoria.

No relatório a ACT começa por verificar que a transmissão dos contratos de trabalho da PT/Meo para as diversas empresas adquirentes “materializou-se, expressamente, através de negócios jurídicos titulados por contrato de transmissão de unidade económica” e que, por efeito dessa transmissão, “tem de se transmitir para os adquirentes a posição do empregador nos contratos dos trabalhadores abrangidos”.

Neste contexto, os inspectores analisaram caso a caso a posição de todos os trabalhadores, “não tendo reunido matéria de facto, no período em referência, que permita sustentar, em termos contra-ordenacionais, a não transmissão da posição do empregador nos contratos dos trabalhadores abrangidos”. E lembram que a declaração de invalidade de transmissão de estabelecimento não pode ser iniciativa da ACT, mas das partes directamente interessadas.

A intervenção da ACT teve por base as denúncias dos sindicatos que acusam a empresa de recorrer à figura da transmissão de estabelecimento para, de forma encapotada, promover um despedimento colectivo. Com este mecanismo, ao qual o trabalhador não tem opção de opor-se, ao contrário do que sucede, por exemplo, na Alemanha ou Reino Unido, a Meo procura diminuir um número de trabalhadores que já reconheceu ser excessivo.

A  ACT analisa o assunto também desse ponto de vista e conclui que “a apreciação da questão de se saber se a transmissão de estabelecimento, com os circunstancialismos em que foi efectuada, ofende preceitos legais imperativos ou evidencia que tenha havido uma manobra de fraude à lei – e desde longo às regras que regulam o despedimento – é competência judicial”.

E caso os tribunais considerem que a figura da transmissão de estabelecimento não se deve aplicar neste caso, são eles que devem determinar as consequências jurídicas, em particular “na esfera profissional dos trabalhadores abrangidos”. Sendo que, acrescenta a ACT, cabe aos trabalhadores apresentarem queixa, uma matéria que deverá ser debatida na reunião marcada pelas estruturas sindicais da PT para a próxima terça-feira.

Em Julho, o Bloco de Esquerda apresentou no Parlamento um projecto de alteração ao Código do Trabalho, com vista a modificar o regime jurídico aplicável à transmissão de empresa ou estabelecimento. O BE quer que os trabalhadores passem a ter o direito de se oporem à transferência para outras empresas e quer considerar ilícito despedimento nos dois anos seguintes. com Sónia Sapage

Sugerir correcção
Ler 2 comentários