O segredo para os exames? Comer, dormir e… estudar
Em época de exames nacionais a vida de um estudante muda. Provavelmente deixar-se-á tomar pela ansiedade e pode comer demais ou dormir de menos. O PÚBLICO foi ouvir alguns especialistas e deixa as suas recomendações.
Daqui a uma semana (segunda-feira, 19), 161.306 alunos do 11.º e 12.º anos vão iniciar a época de exames. As provas servem para terminar o ensino secundário, mas também para ingressar no superior. Por estas duas razões, além de outras — como as expectativas da família ou mesmo da escola para que obtenham bons resultados —, a pressão é imensa.
Esta é uma altura em que o apetite pode aumentar ou diminuir, em que o sono se desregula e em que ansiedade é muita, sobretudo para aqueles que sabem, mas têm consciência de que deveriam saber mais, diz João Lopes, professor da Escola de Psicologia da Universidade do Minho.
O PÚBLICO falou com especialistas de várias áreas para responder às seguintes perguntas: o que comer; quanto tempo dormir ou, em caso de não dormir, o que fazer; e quais as estratégias para estudar?
Comer
Em tempo de estudo há quem se levante de cinco em cinco minutos para comer bolachas ou chocolates, ou para fazer um lanche mais elaborado. A fome serve de desculpa para várias interrupções ao dia, mas também para combater a ansiedade que se sente em véspera de exames.
A sugestão da nutricionista Cláudia Viegas, co-autora do livro Prazer sem Pecado, da editora Esfera dos Livros, é para que se coma várias vezes ao dia. Assim, em vez de bolachas porque não sementes? Nozes, avelãs e outras que são ricas em ómega 6, “importante para o nosso cérebro”, sugere.
Para a professora da Escola Superior de Hotelaria e Turismo do Estoril é “fundamental para esta etapa” fazer uma alimentação equilibrada, que contribua para a melhoria do sono e a manutenção de uma actividade física, assim como para uma “melhor oxigenação do cérebro”.
Além das sementes, o PÚBLICO quis saber quais são os nutrientes que o cérebro mais precisa. O peixe — salmão, atum, bacalhau — por causa do ómega 3. Os vegetais e as frutas que são ricos em micronutrientes e antioxidantes. A professora lembra ainda que a água é muito importante para “o correcto funcionamento das células”.
A nutricionista chama também a atenção para o consumo de “glícidos de boa qualidade” como os encontrados nas leguminosas — “investir nas leguminosas”, sublinha —, nas massas e arroz nas suas versões integrais. “Estes alimentos garantem também o fornecimento de alguns micronutrientes importantes como o ferro e o zinco e garantem o aporte em proteínas, que são importantes para a formação dos neurotransmissores.”
E quanto à carne? “Não gosto de dar muita relevância às proteínas, porque é algo que comemos em excesso. Aqui, o que é importante é o tipo de proteínas, peixe é melhor do que carne, não pelas proteínas em si, mas pelos outros nutrientes, nomeadamente o tipo de gordura”, responde.
O que devem os estudantes evitar? As gorduras trans e saturadas — “são péssimas em termos de processamento cerebral”, as bebidas açucaradas porque dão picos de glicémia e os alimentos processados. Portanto, evitar as bolachas. Em vez disso, Cláudia Viegas sugere “pipocas”, não as de milho com sal ou açúcar, mas as frutas da época: pegar numa tigela e encher de cerejas, morangos, amoras, mirtilos ou uvas e ir petiscando.
Quanto aos snacks, a sugestão passa “moderadamente” pelo chocolate, mas preto com elevado teor de cacau. Mais: “Fazer hummus para comere com palitos de cenoura, aipo ou até com pão ou tostas (de preferência integrais, centeio ou outro)”.
Cláudia Viegas não põe de parte o consumo de cafeína, com “moderação”. “É bom, porque pode aumentar a concentração, mas em excesso leva ao cansaço.”
Dormir
A altura dos exames é propícia para ficar com o sono desregulado ou porque os alunos decidem fazer directas, não dormir durante a noite, para recuperar o tempo de estudo perdido; ou porque quando se deitam não conseguem adormecer. Também há quem consiga adormecer, mas tenha o sono muito agitado. Ou quem decida acordar a meio da noite para continuar a estudar, enumera Teresa Paiva, médica especialista do sono.
Por isso, as suas recomendações são quatro: não fazer directas; não deitar tarde; dormir o que é preciso; e fazer pausas para que o jovem se alimente “razoavelmente” e “apanhe sol”.
“Estudar pela noite dentro é errado, porque o ser humano não foi feito para trabalhar de noite e o corpo fica sem regras”, começa por explicar a especialista. As hormonas que são produzidas durante a noite, precisamente porque o corpo está a descansar, vão ser “produzidas de forma errática”, logo, as directas “só têm consequências negativas”.
A médica recomenda que se durma oito a nove horas por noite e, em tempo de estudo, os jovens podem acordar às 8h e deitarem-se às 22h/23h, sugere. “Quanto mais tem de trabalhar, mais tem de descansar e o que eles fazem é exactamente o contrário, mas o sono é essencial para reequilibrar a memória, de maneira a conseguir consolidar as aprendizagens.” Por isso, a sua terceira recomendação é dormir o que precisa. “Se acordar bem, sem despertador, é porque dormiu o que precisou”. Não se pode andar cansado, diz a médica e dá um exemplo concreto, um “exemplo bom”, sublinha: “Se Cristiano Ronaldo estivesse sempre cansado, não fazia o que faz. Se preciso de responder com um alto desempenho, tenho de dormir. É uma regra.”
Teresa Paiva está preocupada com o excesso de trabalho que é pedido a crianças e adolescentes, que, diz, trabalham mais horas — entre a escola e as actividades extracurriculares — do que os adultos. “Não se pode esgotar as crianças e levá-las à exaustão”, elas andam durante todo o ano lectivo “ultracansadas” porque têm imensos trabalhos e não conseguem começar a preparar-se desde cedo para os exames.
E quando eles vão para a cama e não conseguem adormecer ou acordam durante a noite a pensar no exame? “Não sou a favor da medicação. Não se pode habituar uma criança a tomar remédios para resolver provas, até porque os sedativos diminuem o tempo de resposta”, começa por dizer a especialista, sublinhando: “Não queremos crianças viciadas em remédios”. Em vez disso, recomenda actividade física, de preferência relaxante, como ioga ou tai chi, ou fazer exercícios respiratórios. E divertir-se com os amigos, conclui.
Estudar
Não é agora que se começa a estudar, mas o estudo deve ser contínuo e feito ao longo de todo o ano, ou melhor, ao longo dos dois ou dos três anos, dependendo da disciplina para a qual se vai responder em exame, diz João Lopes, investigador da Escola de Psicologia da Universidade do Minho. “A melhor forma de reduzir a ansiedade é estudar bastante”, começa por dizer ao PÚBLICO.
A pedopsiquiatra Maria de Lurdes Candeias dá o exemplo dos atletas de alto rendimento: não se preparam para uma prova à última hora, mas têm regras, mentalizam-se, treinam, alimentam-se bem e repousam, enumera. “Se uma pessoa quiser ter o controlo da situação, o que tem de fazer é estudar o mais possível”, reforça João Lopes, que não recomenda “noitadas” porque o “esforço que isso representa não tem a compensação esperada”.
Por estes dias, o ideal é que se estude, se reveja a matéria, se façam exercícios, se responda a provas de exames de anos anteriores e se tirem dúvidas, mas com pausas. Teresa Paiva lembra que o cérebro “precisa de distracções” e um dos erros que se faz é estar muitas horas consecutivas a trabalhar.
Quer João Lopes quer Teresa Paiva recomendam que se faça um intervalo depois de uma a duas horas de estudo. Este deve ser um “momento de distração para sair, conversar, brincar”, diz a especialista do sono. Mas sem esquecer que o objectivo da pausa é parar para depois voltar à tarefa, alerta o investigador do Minho. “Não é para ficar o resto da tarde à frente da televisão.”
Na véspera do dia do exame, Maria de Lurdes Candeias recomenda que se descanse. No dia da prova é importante fazer uma refeição que dê energia e depois é “responder primeiro ao que sabe e guardar para o fim as perguntas sobre as quais tem dúvidas”, isto dá tranquilidade.
E quem não sabe responder? Em consulta, a pedopsiquiatra recomenda que se pare um ano, que se repitam as disciplinas com notas mais baixas ou aquelas que são fundamentais para prosseguir os estudos e fazer outras coisas, como um curso de informática ou tirar a carta de condução. “Vejo mais jovens em sofrimento por causa de um valor [para entrar no curso que querem]; do que entre os que têm perspectivas irrealistas”, diz a médica.
Para Teresa Paiva, não é admissível que se chumbe, mas “ninguém morre se tiver uma nota um bocadinho pior”. “Pôr na cabeça das crianças que se não tiverem aquela nota vão para o desemprego é ansiogénico”, induz ansiedade. “Portanto, as pessoas têm de compreender que a vida é complicada, graças a Deus! E que é possível ser feliz a fazer outras coisas”, conclui.