Sem documentos, comissão de inquérito à Caixa morre

PS, PCP e BE querem continuar trabalhos da comissão de inquérito, mesmo sem decisão judicial sobre documentos pedidos a diversas entidades. PSD e CDS acusam esquerda de “farsa da democracia”.

Foto
PAULO PIMENTA

Na prática, a comissão parlamentar de inquérito à gestão e recapitalização da Caixa Geral de Depósitos morreu nesta quinta-feira, mas ainda estará durante um mês ligada às máquinas.

Na reunião desta quinta-feira, PS, PCP e BE decidiram não suspender mais os trabalhos, o que significa que não ficarão à espera que o Supremo Tribunal de Justiça e o Tribunal Constitucional decidam se as diversas entidades têm ou não de entregar a documentação pedida pelos deputados. Este tiro fatal no inquérito levou a direita a falar em “boicote” e “farsa” e a esquerda a devolver acusações dizendo que assim terminaram as manobras da direita em relação ao banco público.

O PSD não tem dúvida de que se trata da morte anunciada da CPI. “Mataram a possibilidade de se saber o que aconteceu na Caixa Geral de Depósitos”, disse o deputado Hugo Soares em declarações aos jornalistas. Ao contrário do que tinham decidido a semana passada – e noticiado pelo PÚBLICO – os sociais-democratas desistiram de impor mais audições – tinham a possibilidade de pedir mais sete – porque considera Hugo Soares isso seria “estar a fazer de conta” que a comissão existe.

Com a recusa da esquerda, a comissão tem apenas mais um mês de trabalho, até 3 de Julho. Se durante esse mês os documentos em falta chegarem ao parlamento, haverá nova decisão; se não chegarem, a comissão termina sem a sua avaliação.

Aos jornalistas, o deputado do PSD considerou que esta decisão mostra que os três partidos “têm medo” que se descubra o que se passou na CGD desde o ano 2000. Além de que, lembrou, o Parlamento está a desistir de esperar pelos documentos quanto já houve decisões de tribunais superiores sobre este assunto. F

alta, segundo apurou o PÚBLICO o Supremo Tribunal de Justiça pronunciar-se sobre as reclamações que CGD, BdP e Comissão de Mercado de Valores Mobiliários que a semana passada ainda nem tinham chegado àquele tribunal saídas da Relação de Lisboa e a avaliação do Tribunal Constitucional de um recurso do banco público, que foi apresentado há duas semanas.

Quem também criticou a decisão foi o CDS que defendeu que se trata de um “boicote ao apuramento dos factos”, uma vez que a comissão tem informação que pode ser refutada por documentos em falta que estão, disse o deputado João Almeida, a ser “sonegados”.

O mesmo deputado diz que o CDS decidiu não fazer os pedidos de audições novos porque isso seria alimentar “a farsa” fazendo de conta que a comissão está a trabalhar quando não está.

O CDS recusa ainda alinhar na decisão de não esperar pelos documentos uma vez que com a decisão da esquerda é o Parlamento “que está a desistir de ter os documentos”, quando os tribunais deram razão à Assembleia da República.

A comissão de inquérito estava suspensa desde Março à espera dos documentos que as várias entidades têm de entregar aos deputados. Entretanto, já houve duas decisões do Tribunal da Relação que obrigavam à entrega dos documentos.

Esquerda pronta para as conclusões

À esquerda, há unanimidade: a comissão tem informações e audições suficientes para produzir conclusões. E essas conclusões vão concentrar-se sobretudo na “má recapitalização” de 2012. Foi assim classificada quer por Miguel Tiago, do PCP, quer por Moisés Ferreira, do BE, quer por João Paulo Correia, do PS.

“As grandes justificações centram-se em audições de pessoas insuspeitas como a de Nogueira Leite” que deu os argumentos da “insuficiente recapitalização de 2012”, disse o deputado do PS, João Paulo Correia. “Viram morrer a sua estratégia para esta comissão de inquérito”, diz o deputado socialista.

O deputado do PCP foi o primeiro a falar para defender que “a comissão tem elementos que permitem concluir o que esteve na base das suas necessidades de capital” de 2012. Miguel Tiago recusou as críticas de PSD e CDS dizendo tratar-se de “uma tentativa de instrumentalização daquela comissão de inquérito, para que PSD e CDS continuassem a criar incidentes e perturbar os trabalhos da comissão de inquérito”, disse.

O bloquista Moisés Ferreira vai no mesmo sentido dizendo que “aquilo que PSD e CDS querem é na verdade uma proposta para que os trabalhos e as conclusões não se tornem públicas”. O deputado defendeu que o Parlamento não deve ficar à espera da decisão dos tribunais. “O Parlamento tem um mandato e a comissão não pode ficar em suspenso ad eternum”, nem “ficar em banho-maria”.

Esta decisão poderá dificultar a vida de futuras comissões de inquérito, uma vez que a partir de agora, quando uma entidade se recusar a entregar documentos a uma comissão de inquérito esta terá de recorrer aos tribunais e ficar dependente dos tempos judiciais, uma vez que foi aberto o precedente.

Sugerir correcção
Ler 4 comentários