CGD ainda ameaça défice acima de 3% em 2017
António Costa afirmou recentemente que “saber a que anos vão ser imputados este esforço de capitalização é uma questão que, em primeiro lugar, terá de ser respondida pelo INE e pelo Eurostat.
Os procedimentos contabilísticos utilizados pelas autoridades estatísticas europeias, que apontam para a inclusão no défice de injecções de capital em empresas públicas destinados a compensar perdas acumuladas no passado, podem vir a significar que, por causa da capitalização da Caixa Geral de Depósitos (CGD), o défice público supere este ano a barreira dos 3%.
Seguindo os manuais em vigor na zona euro, na análise que irá ser feita da operação, primeiro pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) no final do próximo mês de Junho, e depois pelo Eurostat, a operação deverá ser analisada como um todo e levando em linha de conta o historial recente da CGD. Isto é, o montante da capitalização considerado irá incluir, não só os 2500 milhões de euros anunciados ontem, como também os 900 milhões de euros não devolvidos do empréstimo por capital contingente (CoCo’s) e os 499 milhões de euros referentes à transferência da Parcaixa. E esse valor total será avaliado tendo em conta as perdas acumuladas pela CGD, que desde 2011 ascendem a 3878 milhões de euros.
Para evitar que os Estados façam, sem qualquer efeito no défice, sucessivos aumentos de capital em empresas que registam prejuízos consecutivos, a autoridade estatística europeia passou a ter como prática o registo no défice das injecções de capital que sirvam para limpar as perdas acumuladas. Caso a capitalização seja superior às perdas, é possível, mediante uma análise do retorno esperado do investimento, que a diferença não seja contabilizada como défice.
Para o caso da CGD, o que isto significa é que existe um elevado risco de as autoridades estatísticas que vão analisar a operação forcem a contabilização no défice de um valor pelo menos equivalente às perdas acumuladas desde o anterior aumento de capital. Esse valor, próximo dos 3900 milhões de euros, colocaria o défice português próximo dos 3,5% em 2017, em vez dos 1,6% previstos pelo Governo.
Do lado do Governo, existe a clara noção de que está é uma possibilidade. António Costa afirmou recentemente que “saber a que anos vão ser imputados este esforço de capitalização é uma questão que, em primeiro lugar, terá de ser respondida pelo INE e pelo Eurostat” e assinalou que a “Comissão Europeia já o ano passado transmitiu que, para efeitos de apreciação do [Procedimento por Défice Excessivo] PDE, não consideraria as despesas com o reforço da situação do sistema financeiro nessa avaliação”.
A este nível, o facto de a operação ter passado de 2016 para 2017 pode facilitar a posição de Portugal face às autoridades europeias. As regras orçamentais impedem claramente que um país saia do PDE com um défice acima de 3%, seja qual for o tipo de operação por trás desse resultado. E, em 2016, sem a CGD, Portugal conseguiu um défice de 2,1%, que lhe pode abrir as portas à saída do PDE.
Agora, não se pode excluir a possibilidade de as autoridades europeias recusarem a saída do PDE por causa da iminência de um novo défice acima de 3% logo no ano seguinte, mas os regulamentos são muito menos rígidos nesta questão, abrindo a porta a que Bruxelas, como afirma o primeiro-ministro, aceitar excluir da análise as despesas relacionadas com a capitalização da banca.
Embora seja elevado o risco de o défice ficar acima daquilo que está inscrito no OE, tudo aponta para que não venha a ser necessário apresentar um orçamento rectificativo para concretizar a operação. Quando a 15 de Outubro, apresentou a proposta de Orçamento do Estado para 2017, o Governo não incluiu no documento a previsão das verbas necessárias para a colocar em prática, uma vez que estava a contar que tal ainda fosse feito no decorrer de 2016.
No entanto, à medida que se tornou evidente que a operação iria passar para 2017, o Executivo agiu e garantiu que se procedesse, ainda durante o período de discussão do OE no parlamento, a uma alteração da proposta de lei que viria a ser aprovada. Nessa altura, o OE passou a prever que, ao limite de endividamento que o Estado pode assumir em 2017 (9350 milhões de euros) se pode acrescentar “o montante necessário para o aumento do capital social da CGD, a realizar pelo Estado, no âmbito do processo de recapitalização desta instituição, até ao montante máximo de 2700 milhões de euros”. As tabelas do OE foram também alteradas para reforçar a despesas excepcionais previstas no Ministério das Finanças.
O facto de o défice poder vir a sair agravado não torna só por si um orçamento rectificativo necessário. Aquilo que é fundamental é que a despesa efectuada está prevista e que o Estado está autorizado a endividar-se nos montantes que necessita.